Em um dia cinzento, uma carruagem de belos cavalos trilhava uma estrada de pedra, já molhada pelas chuvas indecisas do dia. Ora chovia, ora deixava de chover, mas o céu continuava coberto por um escuro lençol quase tão negro quanto a carruagem que prosseguia a caminhar, mesmo após duas horas de viagem.
— Você sabe, Rico... Eu não quero ir.
— Como não? Em minha época nós nos matávamos para possuir uma dama que nos achasse no mínimo agradável. Deveria pensar direito, garoto.
— Você é mais velho que eu, sabe como a paixão de um homem pode desaparecer tão rápido quanto surgiu.
— Bobagem.
— Seja sincero consigo mesmo.
Na carruagem, dois homens conversavam. Um era o Frederico. Homem baixo e corcundo, que falava grosso e fumava cachimbo. O outro era o jovem Victor. Menino loiro, com um sotaque holandês meio grosseiro.
— Lembro-me de quando veio falar comigo. Não era o que dizia.
— O quê? — questionou-o o jovem curioso.
— Você sabe. Você viu a garota no baile. Ficou apaixonado feito um cabritinho, pronto para virar canja.
— Já faz um ano. Nem me lembro da cor do cabelo dela.
— Mentiroso.
— Como se atreve?
— Não pode mentir para um homem sobre isso. Lembro-me de todas por quem me apaixonei. Lembro da cor de seus cabelos, de seus cheiros, e de seus mal cheiros... Mas com a última parte você não precisará se preocupar.
Victor estava perturbado. Enquanto isso Frederico, seu aio, apenas fumava seu longo cachimbo, com uma serenidade invejável. Aquilo o irritava. Queria que notasse como estava embaraçado perante aquela situação, mas sua postura era irritantemente tranquila. Bem que Rico poderia ser mais empático.
— Aquilo durou dois meses no máximo.
Frederico deu de ombros e olhou pela janela. Alguns segundos de silêncio se seguiram.
— Ao menos, faça pelo seu pai. — disse enquanto observava o exterior, indiferente. — Este lugar tem colinas de mais. Diabos...
O jovem ficou cabisbaixo. Seus pensamentos choveram como tempestade. Inspirou, tirou o chapéu que havia em sua cabeça observando-o com cuidado. Cada costura, cada linha, perfeito. Aspirou pesadamente, com o olhos distantes.
— Você sabe por que ele fez isso. — o jovem quebrou o silêncio.
— Sei. Não deixa de ser bom para você. — ainda observava a paisagem.
— Eu não estou doente, Rico. Meu pai está!
Frederico não lhe respondeu. Ergueu as sobrancelhas momentâneamente, cético.
— Duvida de mim? Pareço pouco são para você?! — questionou-o Victor.
— Soube que têm tido pesadelos. Não dorme uma noite inteira. Está tão sombrio e solitário que o sono não se apega mais a você.
Victor murchou ainda mais. Embora não o quisesse admitir, ele estava certo.
— Se eu realmente acabar me casando com ela, ele vai ficar sozinho naquele lugar. — disse-lhe o jovem.
Frederico soltou algumas risadas.
— Acha engraçado? — encarou-o.
— Não, Victor. Você apenas não sabe o que é ser velho. — soltou uma baforada de fumaça, contemplou-a no ar e voltou o charuto à boca. — Quando um homem está velho sabe que está de cara com a morte. Ele quer que os filhos estejam bem encaminhados, casados, felizes... Apenas isso.
— Mas em casa eu poderia fazer companhia a ele e...
Frederico interrompeu-o.
— A única companhia que poderia fazê-lo feliz seria sua mãe, e sabemos que isso não é possível... — Victor ficou cabisbaixo. — Mas algo pode fazê-lo satisfeito, e está ao nosso alcance. Isto é: um Victor casado, com uma moça bonita, com filhos bonitos, em uma bela casa.
Conversaram até o cocheiro frear os cavalos e Victor avistar o belo casarão da família Reis. Era realmente imenso, e até extraordinário para aqueles mais humildes que não costumavam visitar tais propriedades. Este não era o caso de Victor Van Beek.
Um homem veio e acompanhou-o por todo o jardim até as portas do casarão. Assim o jovem holandês foi apresentado às pinturas, estátuas, monumentos, e todo tipo de coisas que os ricos têm apenas para mostrar uns aos outros, e quando já haviam percorrido metade do salão, o camareiro que o conduzia recebeu uma mensagem do mordomo, que tomou a liderança levou-o até outra sala, onde Victor conheceu o Sr. Reis.
Este era um homem muito formal e de um olhar severo. Não do tipo assustador, apenas do tipo mesquinho. Porém, mesmo após muitas dilações, Victor ainda não havia sido apresentado a nenhuma dama.
O Sr. Reis demorava-se em conversas fúteis, que nada interessavam a Victor. Mostrava-lhe os quadros de seus antepassados, suas famílias, e as famílias de suas famílias. Gabava-se incessantemente da mui nobre herança que possuía, e não perdia quaisquer oportunidades de exaltar a tal proeminência que marcava o nome da família Reis. Foi entre estas exibições que chegaram os quadros de seus herdeiros, e então Victor viu um quadro de sua bela e única filha, Daiana Reis, junto a seus três irmãos.
— E esta, que logo conhecerás melhor, é minha querida filha. — disse com orgulho.
E de fato era linda. Tinha cabelos castanhos, olhos claros, e uma tez alva, e se para você isso não significa formosura, mudaria de ideia se a visse. Embora lutasse para ignorar os pensamentos que lhe vieram, era impossível negar que sua memória havia sido cruel quanto à real beleza da jovem. Era inegavelmente bela.
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O Casamento do Vampiro - Conto
Short StorySeu pai deseja que ele se case e tenha uma vida feliz. No entanto, o jovem Victor se vê enfrentando obstáculos muito maiores do que jamais imaginou para atender a essa expectativa. Mistérios e perigos o cercam, e ele busca entender como tudo se inte...