Capítulo 06_ Isso não é justo

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A tão assombrada segunda-feira chegou e ainda não decidi o que fazer. Acordei tão mal hoje que nem ao menos passei na Frisson Expresso, o que indica que o dia de hoje vai ser horrível. Estava entrando na agência quando percebi uma movimentação estranha. Tinha até me esquecido de que hoje teria a reunião com todos os gerentes da empresa e com o mais novo modelo masculino.

Ele deve ser bem bonito pra agência ter contratado ele, principalmente na época do Natal. Geralmente contratam algum famoso, o que aumenta nossas rendas cada vez mais, então ele deve ser bem especial. Se não for, tenho certeza de que todos ficarão decepcionados, já que as expectativas estão lá no alto.

Assim que entrei, vi Julian conversando com a recepcionista e, caramba, ela realmente tinha apanhado feio, pois tinha uma grande camada de maquiagem em volta dos olhos em uma tentativa de esconder os hematomas. 

 — Bom dia, flor do dia! — Julian se aproximou de mim com um sorriso, o que não me fez sorrir nem um pouco. Minha cabeça estava confusa demais, mas eu nunca contei sobre a minha família pra ele e não seria hoje que eu iria contar. Ninguém aqui sabe, pois sempre que me perguntam sobre minha mãe ou meu pai, ou se tenho irmãos, eu sempre mudo de assunto.

— Hoje não estou bem pra conversar. Mau humor. — Passei por ele, que apenas passou os dedos pelos seus cabelos loiros enquanto bufava. Eu tinha certeza de que ele me seguiria.

— Penso che sia giunto il momento per te di raccontarmi della tua vita, Olivia. Non puoi scappare dalla realtà e sai che sarò qui ogni volta che avrò bisogno di me. — Ele falou em italiano. Só conversávamos em italiano quando as pessoas ao nosso redor não podiam entender o que estávamos falando.

— Por favor, não. — Falei sem olhar para ele.

— Vamos, Olívia. Confie em mim. — Ele pegou minhas mãos e me guiou até algumas poltronas que tinham  perto do elevador. Tínhamos cerca de 10 minutos até o horário da reunião. Olívia, conte tudo! Você consegue!

— Non conosco mia madre. Sono stata abbandonata quando ero ancora una bambina e da allora ho vissuto da sola, senza famiglia e senza tanti amici. Sabato ho ricevuto una lettera da un certo Piper Davis. — Falei enquanto me lembrava da carta que tinha lido. Meu Deus! Eu sou completamente chata, mau humorada e ignorante. Por que estou desabafando sobre a minha vida? — Ha detto che è mia zia e che mia madre è morta in un incidente d'auto. Mi ha anche lasciato il suo numero e la sua e-mail, dicendo che ci sono molte altre cose su mia madre che mi piacerebbe sapere.

— Caramba, Oli. — Ele falou meu apelido de sempre, coisa que eu odiava. Meu nome é Olívia, não Oli. O-L-Í-V-I-A! — Sei que você deve estar muito confusa agora, e entendo isso, mas você tem que entender que ela nunca te procurou antes. Não é justo, principalmente agora que você tem muito dinheiro.

— Aí que está o problema. — Fiz uma pausa e ele ergueu uma das sobrancelhas. — Ela não sabia da minha existência. Ela descobriu faz uma semana.

— Meu Deus! Nunca imaginaria isso. Como você nunca tinha me falado sobre isso antes, estou em choque. 

— Pois é. Também estou. — Olhei em volta e vi que mais funcionários estavam chegando. 

— Sabe, acho que você tinha que dar uma chance pra sua tia. Além de não ser sua mãe, ela não sabia da sua existência. — Franzi o cenho. Pensei que ele diria pra mim rasgar a carta em mil pedaços e esquecer que eu tenho uma tia que não conheço. — Nem comece. Você não pode passar a vida inteira remoendo o que sua mãe fez com você no passado! Você tem que dar uma chance de tirar esse peso das suas costas e se permitir ser feliz sem pensar muito nisso.

— Eu sei, mas não é fácil. — Falei com a cabeça baixa. Por mais que ele tentasse me ajudar, ele não passou por tudo o que eu passei na infância, na adolescência, quando falavam que eu não teria um futuro, que nunca seria alguém na vida. Isso me machucava muito, mas foi o que me deu garras para enfrentar a vida e nunca permitir que me subestimem. 

— Oli, eu sei que é você quem decide o que fazer, mas, quer um conselho? — Assenti com a cabeça, um pouco relutante. — Procure sua tia e sua avó. Quer sentir o rancor da sua mãe pelo resto da sua vida? Sinta. Mas não deixe esse rancor se espalhar pelo restante da sua família, que nem te conheciam, nem sabiam que você existe.

— Você tem razão. Mas não quero mais pensar nisso agora, durante a noite eu vejo o que faço. — Me levantei e passei as mãos pelo meu rosto. — Tudo o que eu mais quero pensar no momento é no trabalho que vamos ter pra fazer.

— Bem-vinda à mais uma época de Natal!

— Infelizmente... — Fiz uma expressão de tédio. A única parte boa do Natal é que nosso trabalho aumenta e recebemos um bônus por isso.

Fomos até a sala onde seria a reunião, que no momento estava quase vazia, exceto por mim, Julian e mais algumas poucas pessoas que estavam conversando sobre o novo modelo. Como eu seria a fotógrafa, estava começando a ficar ansiosa pra saber quem seria esse tal modelo que havia conquistado o assunto aqui na agência. 

Faltavam poucos minutos pra reunião começar e a sala começou a encher. Gerente disso, gerente daquilo, e eu ali, só esperando que a reunião começasse logo para que eu pudesse ir para a minha sala. Não era sempre que eu participava das reuniões, pois sempre tinham reuniões sobre diversos assuntos e departamentos diferentes. Geralmente eu só participava de reuniões sobre projetos maiores, como será hoje. Eu não costumo gostar muito porque cada um quer fazer do seu jeito e eu sou uma delas, o que acaba trazendo uma grande discórdia. 

Haley entrou na sala, mas estava sozinha. Não havia visto nenhum rosto diferente vindo com ela. Ou seja, o modelo não vem. Ótimo! Se não consegue vir na reunião, que é muito importante, imagina nos ensaios fotográficos.

— Bom dia, pessoal! — Ela disse ao se sentar na cadeira dela, que ficava de frente para todos os outros participantes. — Antes de tudo, quero deixar bem claro que iniciei essa reunião agora, sem o nosso mais novo modelo, pois primeiramente eu quero resolver algo com vocês. Sei que muitos ainda não o conheceram e devem estar muito ansiosos, mas realmente é necessário.

Ela fez uma pausa enquanto todo mundo se olhava sem entender nada. Olhei para Julian, que me perguntou sem emitir som o que estava acontecendo. "Eu não faço a mínima ideia", respondi. Por mais que Haley confie muito em mim, ela não havia me contado nada sobre a reunião, exceto pela mensagem em que ela tinha dito que eu e o restante da equipe conheceríamos o tão falado modelo.

— Então... — Ela pareceu um pouco receosa de dizer algo, mas suspirou e continuou. — Sei que todos aqui trabalham do jeito de vocês, porém, esse nosso mais novo "investimento" gosta de fazer tudo do seu próprio jeito. Também sei que vai ser difícil para vocês, mas quero que façam do modo em que ele desejar. Caso achem que ele está sendo muito exagerado, venham falar comigo que eu vou resolver.

— O que? — Fui a primeira a me pronunciar. — Mas isso não é justo! Ele está sendo pago para trabalhar com a gente. Ele deve seguir o nosso jeito! — Era verdade. Sempre foi assim e não pode ser agora que vai mudar simplesmente por causa de um mísero modelo que nem sequer é famoso! — Se até mesmo Eminem, Snoop Dogg e Justin Bieber haviam colaborado com as nossas manias, quem é ele pra querer fazer do seu jeito?

— Concordo. — Uma das gerentes, a qual eu nem o nome sabia, falou. Sinceramente, é muito chato isso de ter que saber o nome de cada pessoa que trabalha comigo.

— Eu sei que é muito chato isso, mas não podemos perder o contrato com ele. — Haley falou um pouco desesperada. Não podíamos negar que ela fazia de tudo pela agência, que é a maior paixão da vida dela.

— Não dá pra simplesmente contratar outro modelo? — Julian falou. 

— Não, ele é muito próximo de um dos nosso maior colaboradores da agência. — Ela falou com as duas mãos no rosto, certamente estava aflita. — Se perdermos esse colaborador, temos o grande risco de falir.

— É não vai ter jeito, mesmo. — Clay, um dos gerentes, falou.

Continua...

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