Capítulo 2 ∞ Luar

12 2 0
                                    

Depois de dar uma ajeitada geral e deixar a casa com o mínimo de organização para suportar uma noite lá dentro, eu decidi que era hora de descansar. Coloquei lençóis novos na cama do antigo quarto de minha mãe, e depois abri a janela para tentar me livrar daquele cheiro de casa fechada e, com sorte, permitir que um pouco do frescor da noite renovasse o ambiente.

Deitei na cama e, ao erguer o rosto para a janela, fui surpreendida pela visão da lua cheia. Era brilhante, maior e mais imponente do que eu estava acostumada a ver em Chicago. O céu estava limpo, salpicado de estrelas e pontuado por algumas nuvens que passavam, ora cobrindo, ora revelando a lua em todo seu esplendor. Sempre tive essa atração silenciosa pela lua, um fascínio quase infantil, como se ela fosse algo mais que um corpo celeste. Às vezes, sentia que a lua tinha vida própria, e que, de algum jeito, ela se comunicava comigo em seu silêncio prateado.

Fechei os olhos, respirando fundo, tentando me entregar àquela paz que a noite parecia oferecer, mas logo ouvi um ruído distante, vindo da floresta. O som era baixo, quase imperceptível, mas naquela quietude, soava alto o suficiente para me deixar tensa. Sentei na cama, assustada, e me virei para a janela, fechando-a com pressa, como se o vidro pudesse me proteger de fosse lá o que fosse.

Levantei-me e chequei a porta, certificando-me de que estava trancada. Tentei me convencer de que provavelmente era algum animal silvestre, talvez um veado ou um esquilo, mas minha imaginação já estava criando todas as possibilidades, nenhuma delas reconfortante. A floresta parecia respirar ali ao lado, e tudo o que eu queria era que aquela noite acabasse rápido, para que eu pudesse voltar ao meu apartamento seguro em Chicago e deixar esse lugar com suas memórias sombrias para trás.

Voltei para a cama, encolhida sob os lençóis, o coração ainda batia rápido. Fechei os olhos e desejei, quase em voz alta, que o que quer que fosse, fosse embora. Só queria uma noite tranquila, uma chance de dormir em paz. Então, aos poucos, o ruído pareceu desaparecer. Esperei alguns segundos para garantir que tudo estava, de fato, em silêncio, e respirei fundo, aliviada.

Mas no instante em que estava prestes a relaxar, ouvi outro som — um uivo distante, longo e melancólico. Meus olhos se abriram no escuro, o coração batendo outra vez, acelerado. Parecia um uivo de cão... ou de lobo. Seriam lobos? Nunca tinha visto um de perto, mas lembro vagamente da minha mãe falando sobre eles como se fossem criaturas comuns para ela. Claro, cresci ouvindo histórias sobre como ela vira muitos desses animais quando era jovem, mas nunca acreditei muito em todas as suas histórias. 

Deitada ali, concluí que talvez fosse mesmo possível que houvesse lobos na floresta. Fechei os olhos novamente, dizendo a mim mesma que não havia motivo para pânico. Afinal, eles não teriam interesse em invadir uma casa; ainda assim, a tensão ainda estava ali, aninhada sob a pele, mesmo quando me forcei a ignorá-la.

Finalmente, o cansaço venceu o medo. Depois de me revirar na cama e pular a cada ruído, acabei cedendo ao sono. Parecia que a tensão acumulada da viagem e da chegada naquela casa tinham me drenado até o limite, e tudo o que eu conseguia fazer era deixar as preocupações de lado e deixar que o sono me carregasse.

Quando acordei na manhã seguinte, o quarto estava mergulhado em uma luz suave. O canto dos pássaros vinha de fora, algo tão diferente do som dos carros e do burburinho que eu estava acostumada em Chicago. O alívio de acordar com algo tão simples e natural fez meu corpo relaxar. Me espreguicei e me levantei, sentindo o piso de madeira frio sob meus pés, e segui até a cozinha.

Enquanto esperava o café ficar pronto, tentei acessar o celular. Desde que cheguei, o sinal tinha desaparecido, me isolando ainda mais da minha vida normal. Precisava falar com meus amigos, e com Frank, meu chefe na cafeteria. Não podia simplesmente desaparecer do trabalho por vários dias, sem ao menos manter contato. Também queria falar com o meu professor, Roth; ele esperava o esboço da minha tese sobre "As camadas do trauma emocional e sua relação com a formação da identidade". Era o tema que me consumia há meses e, ironicamente, agora, parecia mais pessoal do que nunca. Estava completamente sozinha aqui e sem notícias do mundo. De um jeito estranho, esse isolamento era quase aterrorizante.

Eclipse de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora