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Michel.
A noite estava escura, mas o sono não vinha. Me virei na cama, inquieto, com a sensação de que algo estava fora do lugar. Tentei afastar os pensamentos, mas foi inútil. Depois de algum tempo, finalmente apaguei, e foi aí que tudo começou.
De repente, me vi em um lugar que eu não conhecia. Era uma vastidão de luz, intensa e suave ao mesmo tempo. Eu estava sozinho ali, mas ao mesmo tempo, sentia uma presença tão forte que tudo em mim estremecia. Então, ouvi uma voz.
"Venha até mim, meu filho..."
Aquelas palavras ecoaram no meu ser. Não era uma voz comum; era profunda e carregava uma doçura que me desarmou por completo. Ela parecia chamar por mim, de uma maneira que eu nunca tinha sentido antes. Era como se cada palavra penetrasse até as partes mais escondidas do meu coração, lugares que eu mesmo evitava encarar.
"Venha até mim, Michel..." repetiu a voz, com uma paciência e uma ternura quase impossíveis de ignorar. Aquelas palavras mexiam comigo, como se uma parte de mim estivesse desesperada para responder, mas eu me sentia incapaz de falar.
Tentei me mover, me aproximar, mas era como se meus pés estivessem presos ao chão. Senti um misto de paz e angústia, uma necessidade desesperada de ir em direção àquela presença. Mas, antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, tudo desapareceu, e eu acordei num sobressalto, o coração disparado e o corpo coberto de suor.
Sentei-me na cama, tentando processar o que tinha acontecido. O que era aquilo? Nunca tinha sentido algo assim, tão real e ao mesmo tempo tão distante. Passei as mãos pelo rosto, respirando fundo, e senti uma inquietação que não sabia explicar. Por que aquela voz me chamava de "filho"? E por que eu tinha sentido uma paz tão profunda, algo que há muito tempo eu não experimentava?
Eu precisava sair, espairecer. Peguei as chaves do carro e saí sem saber exatamente para onde ir. O sonho ainda pulsava na minha mente, mas a cada esquina, eu tentava afastar a lembrança. Dirigi por um tempo, perdido nos meus próprios pensamentos, até que percebi que estava em uma parte da cidade pela qual nunca tinha passado.
Quando me dei conta, estava parado em frente a uma cafeteria pequena e acolhedora. As luzes de dentro pareciam calorosas, e o lugar tinha um ar convidativo, como se me chamasse para entrar. Era estranho, mas algo me puxava para aquele lugar, uma sensação que eu não conseguia ignorar. Saí do carro, ainda incerto sobre o que estava fazendo ali, e entrei na cafeteria.
O cheiro de café recém-preparado me envolveu, e por um segundo, eu senti como se o mundo tivesse ficado mais silencioso. As poucas pessoas ali estavam conversando baixinho, e o ambiente era tranquilo, diferente do ritmo caótico que eu estava acostumado.
E então, a vi.
Era ela - a garota do folheto. A mesma que eu tinha encontrado na rua dias atrás. Ela estava atrás do balcão, os cabelos castanhos e longos caindo sobre os ombros. Mas o que me prendeu foram os olhos: verdes, brilhantes, carregando aquela mesma tranquilidade inexplicável. Um olhar tão sereno que era desconcertante. Parecia que ela tinha uma paz que eu não entendia, mas que, de algum jeito, queria ter.
Ela me viu e deu um sorriso pequeno, quase como se já esperasse por mim. Ela se aproximou com um bloco de anotações, o olhar gentil, mas curioso, como se tentasse entender o que me trazia ali.
"Você de novo," ela disse, num tom amigável, quebrando o silêncio.
Eu hesitei, sem saber ao certo o que dizer. A verdade é que nem eu sabia o que estava fazendo ali. Eu só senti uma força me puxando para aquele lugar, um desejo inexplicável de estar ali.
"É... eu... só acabei parando aqui," respondi, meio sem jeito. "Não sei o porquê."
Ela me observou por um segundo, como se tentasse ler o que eu não dizia. "Às vezes, Deus nos guia para onde precisamos estar, mesmo que a gente não entenda no começo."
As palavras dela me pegaram de surpresa. Elas me lembraram da voz no sonho, daquelas palavras que me chamavam com tanto amor. "Venha até mim, meu filho." Eu balancei a cabeça, tentando afastar a lembrança, mas a voz dela parecia ecoar exatamente o que eu sentia.
"Você realmente acredita nessas coisas?" perguntei, num tom que soava mais desafiador do que eu pretendia. Mas eu queria saber. Algo em mim queria acreditar, mas o ceticismo ainda me impedia.
Ela sorriu, sem se ofender. "Acredito. Acredito que Deus nos ama e quer nos chamar para perto d'Ele. Às vezes, a gente só precisa parar e ouvir."
Essas palavras ressoaram fundo, como se ela estivesse falando direto para o vazio que eu sentia. Era desconcertante, mas ao mesmo tempo, eu me sentia estranhamente... acolhido. Como se alguém realmente pudesse entender o peso que eu carregava.
"Só um café, então," pedi, tentando desviar do assunto.
Ela assentiu, mas antes de se afastar, me lançou um olhar que parecia ver mais do que eu estava disposto a mostrar. Era como se ela realmente se importasse, como se entendesse o que eu sentia. E aquilo me deixava sem jeito.
Enquanto ela preparava o café, fiquei ali, sentado, ainda atordoado com o sonho e com aquelas palavras. Eu queria fugir daquele sentimento, da sensação de que algo estava me chamando, mas, ao mesmo tempo, não conseguia ignorar a paz que aquela voz tinha trazido. Quando ela voltou com a xícara, colocou-a diante de mim, e nossos olhares se cruzaram novamente.
Ela sorriu, e era um sorriso simples, mas carregado de uma compaixão que eu não entendia. "Espero que você encontre o que está procurando, Michel."
Agradeci com um aceno de cabeça, e ela se afastou, deixando-me sozinho com o café e meus pensamentos. Segurei a xícara quente, olhando para o líquido escuro, perdido em reflexões. Aquela voz no sonho, o jeito como ela me olhou, o que eu sentia... tudo parecia estar conectado de alguma forma.
E pela primeira vez em muito tempo, comecei a considerar a possibilidade de que, talvez, houvesse algo mais, algo que estivesse tentando me alcançar, me puxar de volta.