4 :Entre Olhares e Dúvidas

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O burburinho típico do primeiro dia do último ano nos envolve assim que cruzamos a porta. Conversas animadas ecoam pelas paredes, e risadas entrecortam as promessas exageradas de “dessa vez eu vou levar os estudos a sério”. Ninguém, claro, parece realmente interessado em ouvir o que o professor tem a dizer.

No fundo da sala, onde eu e Duda sempre sentamos, o som parece mais abafado, quase distante. É o lugar perfeito para quem gosta de observar sem ser notada. Duda já está acomodada, com aquele sorriso bobo de quem ainda pensa no Rick, enquanto os gêmeos, lá no fundo, preparam os celulares. É só uma questão de tempo até que gravem alguma cena embaraçosa ou criem a próxima fofoca que vai rodar o IDE.

Estou organizando meus cadernos quando noto a movimentação na porta. Valentina. Ela entra como quem não precisa pedir permissão para existir, acompanhada pela inseparável Fabrícia. Há algo magnético na forma como caminham, como se o chão sob seus pés fosse um tapete vermelho. O uniforme de Valentina parece feito sob medida, acentuando a postura impecável, enquanto Fabrícia equilibra um coque perfeito com acessórios que brilham discretamente. Juntas, elas têm uma presença que engole o espaço, fazendo com que até as conversas mais altas diminuam por um instante.

Quando passam pela nossa fileira, Valentina me olha. Um gesto rápido, quase imperceptível, mas que parece arrastar o tempo para longe. Meu estômago revira como se algo tivesse despencado dentro de mim. Tento manter o rosto neutro, mas sinto o calor subindo pelas orelhas.

— E aí, Lu, viu quem acabou de entrar? — cochicha Duda, com um sorrisinho malicioso.

— Sim, Duda. Não estou cega, eu percebi — respondo, tentando parecer indiferente. Mas minhas mãos estão inquietas no caderno, e meu coração bate tão forte que me pergunto se ela consegue ouvir. A troca de olhares foi breve, mas deixou um rastro.

Valentina e Fabrícia se sentam em um canto perto da janela, conversando entre si. Valentina  ri de algo que Fabrícia diz, e o som ecoa pela sala como uma risada leve, quase musical. Tento desviar o olhar, mas meus olhos parecem ter vontade própria.

Duda percebe, é claro. Ela conhece todos os meus segredos, e a situação com Valentina não é exceção.

— Talvez seja um bom ano para finalmente conversar com ela, hein?
— Duda sugere, com aquele tom provocativo que só ela sabe usar.

— Ou talvez seja um bom ano para você parar de me encher — retruco, tentando parecer casual, mas meu tom sai mais defensivo do que eu queria.

Antes que eu possa mergulhar de vez nos meus pensamentos, o professor entra, carregando o mesmo ar de entusiasmo de todo início de ano. Ele ajusta os óculos no nariz, observa a sala cheia de jovens inquietos e solta um.
— Bom dia, turma — ele começa, em um tom animado. — Espero que estejam prontos para o último ano, porque este será... desafiador.

Diego é o tipo de professor que não precisa levantar a voz para ser ouvido. Ele é um homem de altura mediana, com uma presença tranquila, mas firme. Todo mundo gosta dele, então, a aula tende a ser tranquila. Sua inteligência é inegável, mas não é só isso. Ele tem uma maneira única de conduzir as aulas, que prende a atenção da galera sem esforço.

Ele  começa a organizar os materiais sobre a mesa e começa.

— Bem-vindos de volta! Espero que as
férias tenham sido boas. Nããããooooo!
— ele interrompe a si mesmo, com um sorriso,  pois já sabe que a turma vai começar a falar sem parar — Eu não quero ouvir, eu quero ler.

— A gente não está mais no fundamental, professor! — diz um dos gêmeos, arrancando mais risadas da turma.
Diego dá um sorriso torto e responde de forma seca, mas com um toque de humor.

Atrávez na minha janela (Em Revisão, sujeito a Mudanças)Onde histórias criam vida. Descubra agora