CAPÍTULO IV

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A chuva caía incessantemente, desenhando linhas líquidas que se confundiam com as lágrimas invisíveis daqueles que estavam reunidos à margem do Rio do Cabo. A noite, pesada e opressiva, parecia engolir a paisagem, deixando apenas o som das gotas batendo contra o solo lamacento e as botas dos presentes, que afundavam na terra molhada.

No centro da cena, um filete de luz trêmula da lanterna revelava a verdade sombria. Mais um corpo. Este, diferente de todos os outros, estava dilacerado. Carnes expostas, membros retorcidos, como se uma fera selvagem tivesse se banqueteado ali. Mas, no Éden, não existiam criaturas capazes de tamanha brutalidade. Ou assim acreditavam.

A dúvida pairava no ar como a névoa que se formava ao redor. A proximidade do predador invisível era sufocante.

— Senhor, há mais um corpo... Dessa vez, no Rio do Cabo — comunicou um dos homens pelo rádio, mas sua voz mal completava a frase quando gritos ecoaram da floresta, seguidos por um chiado estático no dispositivo.

— Senhor... algo está vindo! — A voz tremeu, antes que o rádio escorregasse de suas mãos e caísse na lama.

Seus olhos se arregalaram de pavor ao encarar o que surgia à sua frente. Uma silhueta monstruosa, maior do que qualquer coisa que sua mente pudesse conceber, emergia da escuridão. O horror o paralisou. Ele não conseguiu gritar, mover-se ou reagir. Apenas ficou ali, enquanto a criatura o atacava com ferocidade.

Era dor. Era o caos. Um inferno vivo. Mas o grito que desejava soltar ficava preso, afogado no vazio de seu peito. Sua mente girava em um frenesi de imagens: sua vida passando diante dos olhos, sonhos não realizados, planos agora irremediavelmente despedaçados.

Naquele momento, ele não pediu salvação. Ele implorou pelo fim. Que sua existência fosse rapidamente consumida e a dor cessasse.

Mas, então, algo o trouxe de volta.

— Ei! Para, cara! O que está acontecendo com você?!

Uma voz familiar irrompeu na névoa de sua consciência. Ele piscou, confuso, e a realidade voltou a golpeá-lo com força. Ele não estava sendo atacado. Ele era o atacante.

Seus olhos desceram para suas mãos. Garras afiadas, cobertas de sangue, seguravam o corpo de um colega, que se debatia fracamente, balbuciando palavras incompreensíveis. O sangue jorrava, misturando-se à lama e à grama ao redor.

— Não... — murmurou, sua voz quebrada pela incredulidade e o horror.

Era tarde demais. O homem sob ele sufocava, à beira da morte.

Antes que pudesse reagir ou compreender, um som cortante ecoou pela noite. Um disparo. Ele sentiu o impacto atravessá-lo, como uma marreta de aço atravessando sua carne e ossos.

Seu corpo tombou para o lado. Tudo ao seu redor começou a escurecer. O som da chuva, o murmúrio do rio, os gritos... Tudo se apagou, deixando apenas o vazio.

— Não faça isso, Inácio! — A voz de Renan ecoou pelos corredores extensos da Casa Astraeus, enquanto ele e Lúcia corriam atrás do amigo.

O ambiente ali era diferente de tudo que haviam visto no Éden. As paredes eram adornadas com detalhes intricados, evocando mistério e conhecimento. Acima deles, um teto projetava um céu estrelado que parecia infinito, conferindo uma aura quase divina ao local.

O alarme soava, sua luz vermelha pulsava como um coração frenético. Dois guardas postavam-se firmes diante da porta imponente.

— Afastem-se. Apenas solicitados podem entrar — declarou um dos guardas, sua voz cortante. Ao lado dele, uma mulher de tranças castanhas ajustava o rádio que chiava suavemente.

ANOMALIA - ÉDEN (VOL. 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora