Jogo do Coração

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kika pov

A noite estava a cair lentamente, e, enquanto nos sentávamos no sofá com Lia e Matias a fazerem perguntas sobre futebol, eu não podia deixar de pensar em tudo o que tinha acontecido nas últimas 24 horas. A situação com as crianças ainda estava a mexer comigo. Como é que algo assim podia acontecer? Como é que aquelas duas crianças podiam ter sido deixadas ali sem mais explicações? Mas, ao mesmo tempo, a visão delas a interagir connosco de forma tão natural, começando a confiar, a fazer perguntas sobre o futebol e a ver como a Aitana se dava com elas... aquilo estava a me dar forças para seguir em frente.

Olhei para a Aitana, que estava a conversar com Lia sobre mais detalhes do treino, e sorri para mim mesma. A nossa vida, as nossas prioridades, tinham mudado. Eu sentia que tudo o que estava a acontecer ali ia moldar o nosso futuro de alguma maneira. Não apenas o meu, mas o dela também.

Aitana e eu sempre tivemos o futebol em comum, mas agora parecia que o que estávamos a viver era muito mais do que isso. Era a nossa forma de apoiar uma à outra, de estarmos presentes, de tentarmos entender o que aquelas crianças estavam a passar e de tentarmos oferecer um pouco de segurança. Quando olhei para Lia e Matias a sorrirem, mesmo que com alguma cautela, senti que, por mais difícil que fosse, estávamos a fazer a coisa certa. Estávamos a ajudar de alguma forma.

A noite avançava, e a ideia de ficarmos ali todos juntos parecia, de alguma maneira, reconfortante. Mas a minha mente ainda estava em constante movimento, pensando no que fazer a seguir. Precisávamos de saber mais sobre o passado deles, entender como tinha sido a vida deles antes de estarem aqui. Mas isso iria levar tempo.

Aitana levantou-se, indo até à janela, e eu aproveitei para a observar por um momento. Ela tinha esse olhar distante, como se estivesse a tentar perceber todos os caminhos que tínhamos de percorrer. Era assim que eu a via sempre, uma jogadora que nunca desiste, uma líder que, apesar da pressão, se mantém firme. Só que agora a pressão era diferente. Não era só sobre futebol, era sobre nós, sobre tudo o que envolvia o nosso futuro e o futuro daquelas crianças.

Apenas me levantei e caminhei até ela, colocando a mão no seu ombro de forma suave.

— Está tudo bem, Aitana? — perguntei, com um sorriso tranquilo.

Ela olhou para mim, e pela primeira vez naquela noite, vi um brilho de determinação nos seus olhos.

— Sim, está tudo bem. Só estou a tentar perceber o que fazer a seguir. — Ela suspirou, olhando para fora. — Não sei se estou a ser a melhor pessoa para ajudar, mas... sei que preciso estar forte para elas.

Eu sorri, sentindo a sinceridade nas palavras dela. A Aitana sempre foi forte, mas a sua humanidade e vulnerabilidade eram o que a tornavam ainda mais especial.

— E tu estás a ser a melhor pessoa, Aitana. Estamos juntas nisso. Vamos dar-lhes o apoio que precisam, e vamos descobrir o que aconteceu. Não estamos sozinhas nisso.

Ela me olhou com um sorriso genuíno, e eu sabia que, apesar de todas as dúvidas e incertezas, estávamos na mesma página. Não havia mais espaço para hesitações. Estávamos todas juntas nesta história.

De volta à sala, Lia e Matias estavam mais relaxados. Lia estava a brincar com um dos brinquedos que encontrara enquanto Matias observava a tela da televisão com atenção. Eles estavam a começar a se sentir mais à vontade, e eu sabia que aquele era o momento certo para darmos mais passos juntos.

Sentei-me novamente ao lado de Aitana, e, enquanto olhava para as crianças, uma ideia surgiu na minha mente.

— Quando as coisas estiverem mais calmas, talvez pudéssemos fazer algo especial para eles. Um tipo de atividade para que eles se sintam parte da nossa família, sabe? Algo que mostre que, independentemente do que aconteceu, estamos aqui para cuidar deles.