23. O fim do arco-irís

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Recebi uma chamada que me pôs nervosa. O pai do Gilinsky ligou e disse que o pai do Shawn quer ter uma espécie de reunião connosco depois das aulas. Não só comigo. Com a Lydia, Nash e Gilinsky.

-Vais querer companhia para essa tal reunião com o pai do outro diabo? - perguntou a minha mãe dando uma pequena gargalhada, "outro diabo".

-Não te preocupes mãe, vai correr tudo bem mas vai estar lá o pai do Gilinsky para nos orientar. Quando chegar a casa conto todas as novidades. - disse despedindo-me dela com um beijo rápido porque já estou atrasada.

O pequeno-almoço nem me está a saber bem. Não sei se é de já estar a atrasada ou se é de estar nervosa e ansiosa para a reunião.

Sinto que toda esta situação se pode resolver agora ou então vai piorar. Esperemos que seja a primeira opção por favor.

[...]

-Não acham este súbito interesse em nós muito estranho? - perguntei sobre a reunião.

-Eu também acho que é estranho, e não estou nada tranquila com isto. - respondeu Lydia.

-Segundo o que consegui tirar do meu pai isto pode ser bom para nós. Podemos chegar a um tipo de acordo. - contou Gilinsky.

-Eu não quero nenhum acordo com ele. - disse eu com frieza.

Lydia deu-me cinco como forma de pensarmos o mesmo.

-Calma meninas, ao contrário de vocês, eu acredito que se vai resolver tudo. - disse Nash.

-E se não se resolver? E se tudo voltar ao que era antes? - perguntou Lydia.

Queria gritar para todo o mundo o mesmo. E se não se resolver? Como é que vamos viver? Vamos continuar a viver com medo? Por muito que me custe eu tenho medo do Shawn, e sei que eles os três também têm. Apesar de pensar o mesmo que Lydia não concordei. Fingi ser a mais forte por mais uma vez e disse algumas palavras reconfortantes.

-Se não se resolver vamos continuar a viver a nossa vida. Chega de pensarmos no Shawn ou no que ele nos possa fazer. Daqui a dois anos tudo isto vai acabar, depois vamos para a faculdade e aí é como um recomeço. Não vamos deixá-lo estragar os últimos anos daquela que pode ser a nossa melhor experiencia. - disse ficando nostálgica por antecipação.

-Melhor experiência? Estás a referir-te à escola? - perguntou Gilinsky surpreendido recebendo gargalhadas de Nash e Lydia.

-Sim estou a referir-me à escola. Podes me chamar de nerd mas não é sobre ser isso ou não. Vocês são as melhores pessoas que tenho comigo e perder-vos seria como perder uma parte de mim também mas nunca vos tinha conhecido se não fosse a escola. Nós, alunos, passamos 12 anos a queixar-nos da escola mas só quando saímos de vez é que percebemos o quanto a escola nos fez crescer. Aprendemos de tudo na escola e conhecemos pessoas fantásticas que nos fazem ser pessoas melhores e conhecemos também pessoas horrorosas que nos ensinam as melhores lições. Tomamos certas coisas como garantidas sem pensar que podem deixar de ser assim tão garantidas. A escola é uma dessas coisas. Eu só quero levar boas recordações. - finalizei o meu longo discurso com im suspiro.

-É por estas coisas que nós gostamos tanto de ti. Vês o mundo de outra forma que mais ninguém vê. - disse Lydia quebrando o silêncio gelado que se fez sentir quando acabei de falar.

Apenas sorri. Sorri como se tivesse gasto todas as minhas palavras mas sei que eles perceberam tudo o que queria dizer.

[...]

Finalmente chegou a hora da reunião. Estou nervosa, Nash percebe isso e dá-me a mão.

-Obrigada por terem vindo. É muito importante termos esta conversa. - disse o pai do Shawn parecendo fragilizado.

-Como deve calcular é um pouco desconfortável para os miúdos estarem aqui, será que podíamos acelerar a conversa? - perguntou o pai do Gilinsky, não podíamos ter pedido um advogado melhor. Tal pai, tal filho.

-Eu não sei como vos irei dizer isto mas eu quero mesmo pedir-vos desculpa por tudo o que o meu filho vos fez passar. - disse deixando-nos a todos surpresos.

Foi uma verdadeira surpresa este pedido de desculpas, ninguém estava à espera.

-Eu nunca pensei que o meu filho, o meu único filho, fosse capaz de ser tão má pessoa. Custa-me dizer isto do meu próprio filho mas deve ter-vos custado muito mais a vocês aquilo que ele vos fez passar. Podia estar 24 horas a pedir-vos desculpas e sei que não seria suficiente. Só queria saber onde é que errei. - disse Mr. Mendes deixando escorrer um lágrima.

-Mr. Mendes, você errou em muitas coisas na forma como o criou mas todos os nossos pais já erraram em alguma coisa também. Toda a gente erra, errar é o que faz os humanos serem humanos. É o que nos faz querer melhorar após analisarmos as nossas falhas. O senhor ainda vai a tempo, veja as suas falhas e melhore. - disse-lhe tentando tranquilizá-lo.

-Por ainda ir a tempo de melhorar é que decidi que o Shawn vai para um colégio interno. - contou deixando-nos, mais uma vez, surpresos. - Lá, o meu filho vai aprender que não é o centro do Universo.

-Pois não é, o centro do Universo é o sol. - disse Gilinsky recebendo um olhar furioso do seu pai por começar a brincar.

-Tens razão. - gargalhou um pouco para aliviar a tensão. - Era só isto que vos queria contar. Queria que soubessem que peço imensa desculpa pelo transtorno que tudo isto vos causou e que agora vão poder ter as vossas vidas de volta ao normal.

Sentimentos mistos começaram a percorrer aquela pequena sala. Por um lado todos nos sentíamos mal por termos visto o pai do Shawn a lamentar-se e a morrer por dentro ao falar da porcaria de pessoa que o filho é, mas por outro lado tudo isto foi um grande alívio.

Finalmente ! Finalmente conseguimos com que não houvesse mais hipóteses de sofrermos. Parece que renascemos das cinzas, parece que nos foi devolvido tudo o que nos haviam tirado. Devolveram-nos uma certa segurança para seguirmos a nossa vida.

-Ashley? - disse Mr. Mendes quando todos nos despediamos dele.

-Sim, diga. - respondi contente.

-Pelo que ouvi dizer tu foste a verdadeira heroína.

-Heroína porquê? - perguntei confusa.

-Porque mesmo sem teres ido parar ao hospital como os teus amigos sei que foste a maior vitima do Shawn. Sofreste mais feridas que eles, pelo menos interiores, e muitas delas ainda não devem ter sarado, mas mesmo assim nunca baixaste os braços por justiça e sempre defendeste os teus amigos.

-Heróis são médicos, bombeiros e pessoas que salvam outras. Eu não salvei ninguém.

-Salvaste sim, salvaste os teus amigos de caírem no abismo. Fizeste-o de uma forma que não te apercebeste mas fizeste-o, e bem. A segurança que lhes mostraste salvou-vos.

-Nem sempre me senti assim. Mas obrigada. - agradeci com um sorriso. Um sorriso de dever cumprido como se tivéssemos encontrado o fim do arco-irís.

Flashlight || MAGCON || TerminadaOnde histórias criam vida. Descubra agora