Capítulo XXX

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Eu podia sentir Simon ainda em meus braços. E pior ainda, podia sentir seu corpo esfriar aos poucos e seu sangue escorrer.
_ Não... Não... NÃO! SIMON ACORDE!
Eu dava tapinhas em suas bochechas, mas seus olhos abertos e vidrados não davam sinal de que ele estivesse me ouvindo.
A cada lágrima, sentia um pouco de minha força me largar. Um enorme vazio tomava conta do meu peito, quando eu fechei seus olhos, e lhe dei um beijo na testa.
De repente, eu viajei... Para o passado. Um passado distante.
Era o meu primeiro dia no Colégio, e eu não sabia pra qual sala ir, e por puro azar e distração, eu parei em frente ao banheiro masculino para olhar um papel amassado em meu bolso com o número da sala.
_ 47 _ Murmurei, e ao levantar a cabeça, algo sólido e firme esbarrou em mim.
A porta do banheiro.
De lá, saiu um garoto magrelo, com óculos pretos, redondos, e as lentes grossas.
_ Ah... Me... Me desculpe _ Ele disse ao perceber que havia batido a porta em mim.
_ Sem problemas.
Ele abaixou a cabeça e saiu andando pelo corredor cheio de pessoas. Quando eu estava prestes a sair andando, ouvi murmúrios e risadas abafadas vindas de por onde o garoto havia ido.
Eu ainda podia vê-lo, de longe, então me abaixei e o que vi me fez correr em sua direção.
_ Er... oi... olha... _ Era simples mas eu estava com vergonha de dizer pro garoto _ Tem... tem um... _ Apontei para o seu pé, e ele olhou na hora.
_ Ai, merda.
Ele tirou com o outro pé, o pedaço de papel higiênico que o havia acompanhado desde o banheiro masculino, e depois deu uma risadinha.
_ O que foi? _ Perguntei.
_ É so que... _ Ele riu mais uma vez e ajeitou o óculos com o indicador _ Eu ia ser o palhaço do Colégio hoje, se você não tivesse me avisado.
Eu imaginei aquele garoto andando por toda a extensão do Colégio com aquele papel higiênico no pé, e fui obrigada a rir também. Mas meu sorriso foi cortado por um olhar fitante dele em mim, e um silêncio que parecia eterno.
_ Ahn... Anna _ Eu lhe estendi a mão.
_ Me chame de Simon, moça bonita.
_ Ok, Simon Moça Bonita.
Ele ignorou minha mão estendida e me abraçou com o braço direito.
_ Tá perdida aqui, certo?
_ É.
_ Qual sua primeira aula?
_ História.
_ Ah História! A melhor matéria. Que por sinal também é a minha...
_ Me leva lá, Simon Moça Bonita?
_ Claro _ Ele riu mais uma vez.

Novamente tudo mudou, e agora eu estava no meu quarto.
Ronald estava dormindo na parte de cima da beliche, e o quarto estava decorado apenas com as coisas dele: Um pôster de uma atriz famosa, a Angelina Jolie, e mais diversos simbolos de bandas, Nirvana, Arctic Monkeys, e mais umas dez que não me lembro o nome.
Eu estava vendo tudo do canto do quarto, a minha 'eu' estava se debatendo na cama: mais um pesadelo.
E quando eu acordei, gritando, Simon logo estava em meu quarto me abraçando enquanto Ronald estava em pé, de frente para nós, observando enrolado no lençol.
_ Ah, Anna... Vamos lá. Conte-me o sonho. Talvez eu consiga te fazer esquecê-lo.
_ Eu... Eu... Eu sonhei... Com você... _ Minha voz estava embargada enquanto eu olhava para Ronald.
_ Comigo? _ Ele perguntou, arregalando os olhos enquanto eu fazia que sim.
_ Ahh, Anna! _ Disse Simon _ Está chorando por quê então? _ Ele me soltou e fez com que Ronald girasse _ Qualquer um ficaria feliz de sonhar com esse gato. Olha! Olha isso!
_ Case-se com ele, Simon _ Eu tinha cedido e sorrido, mas logo a cara triste retornou _ Rony, promete que não vai morrer?
_ Mas que tipo de perg... _ Ele começou a falar, porém Simon lhe cutucou com o cotovelo _ Ah, claro. Eu prometo.
_ Anna, eu também não quero morrer, e obrigada por se preocupar.
Eu sorri, e os dois me abraçaram.
No dia seguinte, Ronald se matou, e deixou um pedido de desculpas por não cumprir a promessa. Simon ficou três dias direto, comigo, me consolando.

De repente, tudo muda novamente e eu estou saindo do banheiro, havia acabado de tomar banho, quando ouço alguém bater a porta. Troco-me rapidamente, e quando abro, Simon está do lado de fora.

_Oi _ Ele diz.

_ Oi. O que foi?

_ Nada, eu só... _ Ele olhou para os pés _ Queria te ver.

_ Entre _ Digo com um sorriso.

_ Ah, não. Obrigado. Eu... estava pensado de você vir comigo para um lugar muito bonito, que ninguém vai... meu esconderijo, podemos dizer assim.
_ Vamos, claro _ Saio e fecho a porta _ Onde é?
_ Só vem.
Pelos corredores adormecidos do prédio, nós passamos em silêncio.
Controlamos nossos passos, para que não ecoem enquanto subimos uma longa e íngreme escada.
_ Simon... Chega... Não aguento mais subir... _ Digo ofegante depois da subida.
_ Relaxa, praticamente já chegamos.
Ele abriu uma porta de madeira que estava a seu lado, e um vento forte veio do outro lado.
Quando entrei, depois de Simon, vi uma enorme estrutura de vidro, a cada centímetro.
_ Meu deus! Simon... Como isso aqui existe? Lá em baixo não dá pra ver esse vidro todo.
_ O teto do último andar foi feito em baixo. As escadas ficam trancadas pra ninguém vir aqui, mas eu roubei uma vez, uma cópia da chave.
_ Eu não vou entrar.
_ Porque não?
_ Esse vidro vai quebrar, Simon!
_ Nunca quebrou comigo e com o Ronald. Venha.
Ele me estendeu a mão e resolvi aceitar e entrar.
Nos deitamos próximo à borda do prédio, e olhamos as estrelas.
_ Você acha que ele está lá?
_ Onde? _ Pergunto.
_ Nas estrelas. Tem uma lenda que diz que nos chamamos assim pois vamos para lá depois de morrer.
_ Não sei. Talvez sim.
_ Um dia eu vou descobrir.
_ Ei _ Digo me virando para ele e o abraçando _ Não fala isso. Não quero que você descubra. Promete pra mim que não vai morrer.
_ O quê? _ ele sorri.
_ Promete.
_ O.k.. Eu prometo.
Ficamos observando em silêncio por alguns minutos, até que Simon me olha.
_ Anna... Eu te amo.
Na época eu não respondi, por que não sentia o mesmo que ele.
Mas hoje sei que eu sempre o amei, como amigo. Meu melhor amigo.
Devia ter rido mais com ele, saido mais, vivido mais. Daria para ele o resto da minha vida para que ele aproveitasse mais. Daria tudo para vê-lo uma última vez e poder me despedir.
Mas não posso. Ele se foi. Não há volta.
A saudade, parece uma adaga afiada, com a ponta em meu peito, rodando aos poucos, me torturando e causando dor.
Eu te amo Simon. Te amo...

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