Rasgue-me

Caput I - Dum suspiro spero

O carro preto estacionou entrando nos limites da floresta. Por o caminho ser demasiado estreito, era claro que teriam que sair do automóvel e seguir alguma trilha ou caminho já preparado. Procurando qualquer informação sobre o que fariam no futuro, a ruiva ferrugem olhou para o condutor, questionando-o sobre o que fariam.

O sorriso curto que lhe deu mal mostrava os dentes direito, sendo concentrado na lateral esquerda e quase mostrando uma parte da sombra de seu canino. Seu olhar azul-esverdeado pela luz do sol das cinco da tarde era sugestivo e a analisava sem qualquer pudor. Suas intenções estavam estampadas para qualquer um que quisesse ousar tentar entender e desvendar os reais desejos que tudo aquilo representava.

Hillary suspirou dolorosamente, admirando o homem tão atraente que fazia seus pulmões arderem e seu estômago embrulhar. E quando ele a olhava assim... Era quase como se estivesse cometendo um pecado deliciosíssimo. A conexão durou por alguns segundos, quando ele finalmente pareceu acordar de seu transe carnal e olhar ao redor através dos vidros limpos e fechados do carro, despertando também a garota.

- Querido? – chamou, mas sua atenção foi apenas auditiva. O homem de perfil ainda continuava atraente, senão ainda mais. – O que estamos fazendo numa floresta?

Ele parecia guardar grandes planos para aquela tarde que finalmente havia dado uma trégua pela chuva e decidido aliviar a tensão do clima, como um intervalo para um arco-íris e, em poucos minutos, um grande e estupendo pôr-do-sol. As árvores estavam feridas, mas fortes; folhas mortas por todo lado anunciando o outono; pedras espelhadas e o cheiro tentador da natureza em seu momento íntimo invadindo-a de sensações boas. O barulho do rio Posseidon acusava sua existência há alguns metros de distância.

E, para finalizar, atrás do casal a estrada era vazia, longe do centro da cidade, indicando o percurso que fizeram depois do piquenique. Aos poucos, o sol se deitava no horizonte, escurecendo a cena tão linda.

Ele parecia sentir o mesmo que ela. Quando se voltou para a garota, o homem já estava com sua expressão relaxa e seus olhos ansiosos. Poderia assemelha-los aos de um fã pela primeira vez no show de uma banda que gostava bastante, esperando incansavelmente desde as três da tarde para o que aconteceria apenas às sete da noite.

- Vamos? – Sorriu de leve. – Tenho uma surpresa para você.

Seu peito se aqueceu e ambos saíram do carro. Hillary dificilmente conseguia acreditar que estava com o cara mais sensacional do mundo ao seu lado neste momento tão bonito, em um dos poucos cenários sensacionais da pequena e humilde cidade. Era ainda mais difícil acreditar que ele havia feito uma surpresa para ela. Sinal que ele se importava o suficiente para gastar uma parte do seu dia planejando algo e, se o fazia, era lógico que também vinha pensando na garota.

O coração bateu acelerado de ansiedade, procurando antecipar o momento quanto antes possível. O braço do outro a envolveu de lado quando adentraram a floresta gelada. Apesar de alguns galhos irritantes que arranhavam as peles vez ou outras, molhados e pontudos, seguiram sem reclamar. Ela, ocupada demais pensando em sua sorte. Ele, na mesma linha de raciocínio.

Quando Hillary sentiu que não iria mais aguentar de curiosidade, sua boca já estava aberta e as palavras pularam expressando sua agonia.

- Me conta logo, vai... – Olhou dengosa para o cara misterioso por quem estava terrivelmente apaixonada, desejando que ele acabasse logo com o suspense. – O que você preparou?

- Acha mesmo que eu vou estragar a surpresa nesta altura do campeonato? – Ele soltou um breve riso pelo nariz. Consequentemente Hillary mordeu o lábio e suspirou frustrada, quase dando por vencida. – Quero que seja o momento mais importante da sua vida.