Capítulo VII - Portas

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Não tiveram problemas durante a noite.

Amanda ainda estava cabisbaixa quando Roger voltou para a caverna. Ele tinha ido lavar o rosto e urinar.

Quando Roger tinha acordado, ela já estava remexendo na fogueira.

Revezaram na noite de guarda. Roger começou, e depois do que achou ser em torno de duas horas, acordou Amanda. Ela não reclamou, e fez o próximo turno. Roger foi acordado, fez mais um turno e chamou Amanda novamente, que estava até então acordada.

Foi uma noite muito cansativa, e Roger não se sentia nada disposto. Mas logo pela manhã, os pensamentos já tomavam conta de sua cabeça. O homem sendo mutilado era o que mais o atormentava. Um homem mutilado! Isso era o que empurrava Roger para fazer o que estava pensando.

Ainda estava assustado pelo que passaram na véspera, imagine aquelas pessoas? Estavam passando por coisas horríveis. E a morte até parecia uma coisa boa comparado com a mutilação. Aquele homem já devia estar morto, e isso deixou Roger um tanto atônito.

Isso sem contar as outras pessoas. No mínimo mais três. E um deles sabia que Roger estivera lá. Sabia que tinha humanos livres naquele planeta. O que será que se passou na cabeça daquele homem no momento em que viu Roger? Provavelmente deve ter pensado que o tormento havia acabado. Que voltaria para casa. Mal sabia ele que Roger não tinha a mínima idéia de como ir para Terra.

Coçou a barba, que a essa altura já estava farta e desgrenhada. Merda. Precisava de um banho decente. Só água não era o bastante. Precisava comer bem, os peixes, apesar de não deixar com que passassem fome, já estavam enjoativos. Precisava escovar os dentes e fazer um bochecho com algum anti-séptico. Roger estava até pensando em ir ao dentista quando chegasse à Terra, para averiguar se não havia acontecido nada de permanente em sua boca, que a tanto tempo estava longe da escova.

Esse pensamento o deixou com um misto de tristeza e raiva. Quando chegasse a Terra... Toda vez que pensava nisso achava que cada vez mais essa idéia estava se tornando um conto de fadas.

Antes tinha esperança; esperança não, tinha certeza de que conseguiria voltar para casa, mas as coisas já não eram assim. Principalmente depois do dia anterior. Ali soube que não conseguiria fazer um alienígena de refém. E esse, era o seu único plano.

Agora também havia um novo fato. Aquelas pessoas. Roger nunca se achou altruísta, mas agora viu que era. Céus! O ponto não era esse! Não era uma questão de ser ou não altruísta, a questão era ser ou não cruel. Se ele não pensasse naquelas pessoas, estaria sendo cruel, e se por acaso entrasse naquela base e milagrosamente conseguisse sair daquele planeta, nunca se perdoaria por tê-los abandonado. Não conseguiria mais viver em paz, aquilo seria um fardo que nunca conseguiria remover.

Passou a noite toda pensando nisso. Colocando as coisas na balança, vendo os prós e contras; analisando os riscos. E mais uma vez, como sempre que tentava pensar em alguma coisa de útil naquele planeta, não chegou a nenhuma conclusão. Voltar lá seria um risco enorme. Um risco que talvez eles não devessem correr. Mas se não fossem, aquelas pessoas morreriam, tão certo como dois e dois são quatro. E o pior era que tinham que agir rápido. Um homem havia morrido no dia anterior, quantos poderiam morrer hoje?

No entanto, se entrassem, poderiam acabar como eles, prisioneiros e condenados.

A cabeça de Roger fervia.

De um lado sentia medo, do outro sentia compaixão e dever.

Se conseguisse salvar aquelas pessoas, o quadro mudaria completamente. Elas poderiam saber de muitas coisas que Roger desconhecia, poderiam saber algo de útil. E se decidissem levar o absurdo plano de Roger em frente, teriam muito mais chance com mais gente.

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