Capítulo 1: Insensatez

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|Clarke

A sala principal da longa construção na encosta da enorme montanha de gelo é pouco mais sofisticada - se posso usar este nome para defini-la - do que a da casa onde encontrei-me pela primeira vez com Lexa, a comandante do povo das árvores, um dos doze clãs dos terra-firmes. É cercada, assim como a aldeia, por um extenso muro montado a partir de troncos de árvores entrelaçados transformado o local em um forte.
Aprumo-me na cadeira de madeira talhada e ornamentada com ursos da neve e tento não recordar-me de Lexa, pois não há como não vir a lembrança amarga da traição no dia em que juntas iríamos vencer a guerra contra Mount Whater. Parece-me que estou fadada a traições.
Fui capaz de vencê-la sem ela, mas eu havia confiado nela em primeiro lugar. Pedi que ela confiasse em mim e no fundo eu sabia que talvez não fosse longe com isso. Não para alguém que vê o amor como fraqueza. Saber que ela não tinha qualquer ligação com meu povo não diminui a raiva que me abate. Pude jurar que ela estar do meu lado naquela situação... Mas agora isso é passado.
Desde que o irmão de Nia, a mulher conhecida entre os terras-firmes como a rainha da Nação do Gelo, me encontrou na floresta e trouxe-me para cá tenho esperado por uma semana para falar com ela. No entanto, estou sempre sendo vigiada por seus guardas, homens robustos usando trajes felpudos e grosseiros de peles variadas, e que não se importam de me machucar caso eu tenha um dos meus acessos de impaciência.
O dia finalmente chegou e estou cheia de perguntas para fazer a Nia, mas preciso me concentrar nas mais importantes. O que ela quer comigo? Por que tem me tratado relativamente bem para uma prisioneira? Lexa havia me contado rapidamente que Nia havia matado sua mulher depois de confrontá-la, prendê-la e torturá-la. Isso me faz crer que Nia não é uma pessoa de muita clemência. A algo de muito errado aqui se ela ainda não fez o mesmo comigo.
Antes que eu conclua a linha dos meus pensamentos, alguém adentra o recinto. Quando viro meu rosto para a origem dos passos deparo-me com uma mulher que deve ter por volta da idade de minha mãe, usando um vestido branco longo em um tecido fluido. Ela tem os cabelos presos em tranças que se juntam formando um coque e a expressão em seu rosto é muito diferente do que eu esperava. É como se ela estivesse o mais próximo de feliz que alguém como ela poderia estar ao me ver.
Nia sentasse a cabeceira da longa mesa em que fui acomodada. A cadeira é imponente com um encosto alto que termina em duas colunas em forma de ursos em pé rosnando um para o outro. Ela parece-me como eles, feroz por baixo de toda a suavidade que tenta demonstrar.
- Então, você é a tão comentada garota dos que vieram do céu. - ela meio pergunta e meio afirma enquanto averigua-me com olhos de caçador. Sua voz é alta, clara, aguda e objetiva. - Clarke, não é?
- E você seria a rainha do gelo. Isso daria uma boa piada entre as pessoas que conheço. - eu sei que ela não vai entender o que eu digo, mas faça-o só para tentar desistabiliza-la. - Vamos direto ao ponto, Nia. O que eu faço aqui?
Nia recostasse mais na cadeira e puxa uma faca que eu não havia percebido do braço da cadeira. Ela alisa-a entre os dedos com um olhar pensativo como se estivesse relembrando todo o prazer que a peça já tinha lhe proporcionado em combate. É quando eu lembro do Camp Jaha. Será que meu povo está a salvo? Eles não sabem sobre estes terra-firmes.
- Eu ouvi falar de você, Clarke. Sei que é a comandante do seu povo. - ela larga a faca sobre a mesa e fixa-se em mim. Olhos afiados em guarda.
- Você está enganada. Não sou comandante deles. - afirmo.
De onde ela tirou isso? Eu nunca os liderei verdadeiramente, apenas fiz o que devia ser feito e para o qual tinha capacidade. Não sou como Lexa ou o Chanceler Jaha. Ou ainda minha mãe.
- Eles te respeitam ou estou errada nisto também? Isso muitas vezes é o cruzar da linha. Mas o que está em debate aqui é que eu conheço sua história com Lexa. Ela lhe traiu, não é mesmo? - ela tenta parecer se importar, mas só parece-me despeito. O modo como ela diz o nome de Lexa expele ódio. - Preferindo manter um acordo com os homens da montanha... Mas você foi capaz de libertar o seu povo sem ajuda. Isso é algo a se considerar, Clarke.
- Onde você quer chegar? - ela pega a faca na mão direita e aponta-a para mim.
- Eu tenho um acordo para você, Clarke. Um que eu lhe asseguro que não será rompido. - diz ela séria e o olhar coberto por escuridão. - Nós temos um inimigo comum agora.
Então, é isso. Toda essa ladainha para chegar em Lexa. É dela que ela está falando. O que ela pode querer de mim? Que eu me junte a ela e traga meu povo para seu lado? Isso é algo estúpido para se pensar. Não tenho intenções de fazer qualquer acordo com terra-firmes. Não posso confiar em nenhum deles.
- Se você conhece toda a história, como pode pensar que vou manter qualquer acordo com vocês? - indago furiosa.
Penso em me levantar e fazer meu caminho para fora, mas Nia rapidamente interfere na ideia quando profere as próximas palavras.
- Clarke, nós duas sabemos do que você é capaz para manter os que ama em segurança. - ela cruza os braços no colo e não olha-me. Sabe que conseguiu minha atenção. - Espero que eu não tenha que recorrer a algum artifício para ter sua colaboração. Embora, eu não tenha receio nenhum de fazer o que for preciso. Nós somos parecidas nisso.
Engulo em seco. Não dá para ser mais claro do que isso. Não consigo pensar em nada para retaliar, então tento jogar para ganhar tempo.
- Explique-se melhor. - peço.
Nia encara-me bem no fundo dos olhos para que eu veja dentro deles o quão sério ela está falando.
- Desejo que você mate Lexa.
- E se eu recusar? - vejo-me dizer antes de sequer pensar.
O que é isto? Por que estou preocupada com a pessoa que me traiu e a toda as pessoas que me importam? Eu deveria estar feliz por ser isso o que ela quer, mas não encontro conforto nisso.
- Você está prestando atenção no que digo? Acabei de lhe dizer isso. - ela sorri.
- Eu acho que quero ouvir você dizer a sua ameaça com todas as palavras.
Seus lábios se crispam e vejo ódio transbordando em seu rosto. Lexa deve ter feito algo muito sério contra ela.
- Eu os pegarei um por um, Clarke dos que vieram do céu. Os que ficarem na espera estarão em terror absoluto e os que estiverem aqui vivos desejarão ter morrido quando caíram do céu. - ela cospe as palavras como veneno. Um arrepio sobe-me a espinha. Eu vi algumas das pessoas que vivem aqui e são tão numerosos quanto o exército de Lexa. - Prolongarei os sofrimentos deles enquanto você assiste. Será a última, menina. E será terrível.
Algo ocorre-me nesse instante acima do medo.
- Porque você mesmo não mata Lexa? Não é como se você não fosse pário para ela.
- Eu prefiro que isso seja o mais limpo possível. Meus olheiros disseram-me que você e ela eram próximas. Será muito mais fácil e simples para você entrar na Pólis e matá-la em segredo. Para nenhum de nós é seguro. Isso geraria uma guerra sem precedentes.
É mais do que ela diz. Está claro que ela não se importa com mortes. Isso é necessário em uma guerra. E também não está preocupada em perder uma batalha. É outra coisa, mas o quê?
- Lexa também me prometeu uma trégua e veja o que houve no fim. Quem me assegura que o acordo será cumprido?
- Não creio que você tenha opção. Se não queria isto deveria ter permanecido com os seus ao invés de sair desprevenida. Porém, eu ainda lhe dou chance de acordo. - impõe ela voltando a girar a faca.
E eu tenho outra escolha? Não poderia fugir daqui sem ajuda, os meus amigos não sabem onde estou, não tenho como contatá-los. Não agora. Talvez eu possa arranjar um jeito na Pólis, a capital. Preciso pensar. Preciso de mais tempo.
- Só me deixe pensar um p...
- Não. - ela grita e se recompõe em seguida. - Eu quero a resposta agora. Não vou dar tempo para que me faça armadilhas. Decida-se pelo meio fácil ou pelo difícil.
- Aceito o seu acordo. - engulo e me aprumo. - Vou matar Lexa em troca de você deixar o meu povo em paz.
Nia pega uma taça e leva a boca parecendo saborear o conteúdo. Termina com um sorriso amplo.
- Nós temos um acordo então, Clarke. Você será bem recompensada pelo seu ato.
- Posso pelo menos saber o motivo pelo qual você quer ver Lexa morta? - vou direto ao assunto.
O rosto dela obscurece e ela deixa a taça sobre a mesa com uma batida.
- Não é algo que você deve esperar que entre em discussão. As coisas são assim e ponto. Vamos lidar com os fatos e não com as histórias por trás deles. - ela parece irritada com a pergunta e isso deixa-me curiosa. Devo descobrir o que houve entre elas. - Guardas, levem-na para a sela no subsolo.
Os guardas se precipitam para o meu lado. Fico pasma. Eu estava em um quarto, presa, mas em um quarto. Um dos homens segura meu braço e puxo-me para longe.
- O que é isso? - indago.
- Um tratamento que condiz com a situação. Só quero que fique claro o que está em jogo, Clarke. Eu não sou como nenhum desses com quem você já lidou até agora. Não quero surpresas mais tarde. Guardas, amarrem-na nos grilhões e deixem-na um tempo sem comida.
O guarda mais próximo agarra meu braço direito com brutalidade e meus instintos ligam-se de imediato. Dou-lhe uma cotovelada no tórax e enquanto ele cambaleia acerto-lhe um soco no rosto. No entanto, antes que eu esteja sobre ele descarregando toda a minha raiva, um outro homem acerta-me o lado da cabeça com o punho de sua espada e caio. Quero dizer a Nia que ela se arrependerá disso, mas a minha visão turva-se e a escuridão me reinvindica.

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