Capitulo 17

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Fiquei ali, parado, até que senti alguém cutucando a minha costa. Me virei e olhei para o zelador. Ainda estava atordoado demais quando eu falou.

- O garoto - A voz dele era anasalada, sinal de anos de fumo - Eu vou limpar a sala. Então, cai fora.

Assenti e peguei a minha mochila que estava sobre a cadeira. No corredor não encontrei ninguém, e nem queria mesmo. Pensei por um milésimo de segundo de ir para a outra aula, mas desistir. Não estava com humor ou disposição para ouvir mais falatório de professor. Nunca tinha faltado uma aula sequer - a não ser naquela vez com Li -, mas agora eu estava fazendo por livre e espontânea vontade. Até meu andar estava diferente, eu tropeçava nos meus próprios pés. Por que Li fez isso? Por que ele me deixou? E, como eu posso viver sem ele? Eu sabia que era muito drama para uma pessoa só, mas não tinha como eu parar de pensar nisso. Com três semanas de namoro e ele viaja, quase sem despedidas.

O sol da manhã faz contato com a minha pele gelada e eu estremeci. Desço os degraus lentamente, tentando adiar o momento infinitamente. Talvez Li aparecesse no seu carro prateado e me dissesse que era apenas brincadeira. Mas não aconteceu nada disso, cheguei no ultimo degrau e não vi nem um brilho prateado. Meus olhos começaram a ficar enevoados, impossibilitando a minha ida até a parada de ônibus mais próxima. Me apoiei em um carro perto de mim e deixei o choro vim, forte e incontrolável.

Minha vida não tinha rumo, e isso é patético. Parei de viver para meus irmãos e me enganei pensando que eu estava vivendo para mim mesmo quando eu começei a namorar com Li, engano meu. Eu apenas adquiri uma nova fonte de sobrevivência, eu era um parasita, se alimentando da felicidade e do bem estar dos outros. Eu não vivia para mim, alias, eu nem vivia, eu apenas sobrevivia. O peso desse pensamento apenas fez com que eu chorasse com mais vontade, isso não era nada do que a mais pura verdade.

Não sei por que eu ainda procurava ser feliz, devia ter me contentado com a felicidade dos meus irmãos. Não mereci ser feliz nem no dia do meu aniversario, nem no primeiro show da minha banda, nem mereci a felicidade da adolescência. A dor e o peso da morte dos meus pais foram o que me sustentaram por todos esses anos. Por fora eu podia aparentar apenas um semblante frágil, mas sempre confiante. Mas por dentro era o contrario, eu estava completamente destruído, sem nenhum reparo por vários anos.

Me levantei, todo aquele choro me deixou esgotado. Mas mesmo cansado eu conseguir ficar com raiva de Li. O meu problema era que eu nunca sentia uma emoção e a outra ficava num canto, não. Quando eu ficava triste, era cem por cento triste. E era a mesma coisa quando eu estava com raiva, aquele sentimento ruim estava correndo pelo meu corpo quebrado me dando forças para pegar o telefone e digitar uma mensagem furiosamente para Li.

" SE VOCE REALMENTE GOSTASSE DE MIM, VOCE VIRIA ATÉ AQUI E SE DESPEDIRIA NORMALMENTE, NÃO ATRAVES DE UMA MENSAGEM. LI, QUANDO VOCE VOLTAR DAI SÓ ME PROCURE QUANDO EU QUIZER QUE VOCE FAÇA ISSO."

Apertei em enviar e li a nota que dizia que minha mensagem tinha sido enviada. Minha raiva foi rapidamente engolida por culpa, desejei nunca ter enviado esse mensagem quando a raiva estava me dominando. Mas não mandei outra mensagem, eu não tinha felicidade, mas eu tinha dignidade. Sai da faculdade e peguei o primeiro ônibus que eu vi, não estava lotado, me sentei duas cadeiras perto da porta e apoiei a minha cabeça no vidro da janela.

Vi uma garotinha com um balão vermelho em um parque próximo ao sinal onde o ônibus estava parado. A garotinha se virou um estante quando escutou a voz da mãe e afrouxou a aperto no barbante que segurava o balão. Ela ainda tentou alcançar a bola ovalada que subia rapidamente no céu. O ônibus arrancou no exato momento em que um homem que estava na mesma praça que ela esticou o braço e pegou o balão. Olhei para frente, pelo mesmo ela tinha alguém para ajuda-la nesse problema. Pior era eu, a minha felicidade era igual aquele balão, eu já tinha desistido a muito tempo de tentar alcança-lo e não tinha ninguém para me ajudar.

****

Meus irmãos chegaram em casa eu estava olhando fixamente para o meu celular, já eram 13:21 da tarde e nada de Li responder a minha mensagem. Provavelmente ele estava dentro do avião, e o celular estava desligado. Era isso que eu estava dizendo para mim mesmo. Larissa se jogou no sofá da sala e começou a tirar os tênis, Caio já estava com a camisa do uniforme amarada na cintura, Pedro estava dentro do banheiro, escutávamos o barulho da agua.

- Chris, você fez o que para o almoço? - Caio perguntou.

- Vem olhar nas panelas - Disse, mas ainda olhando para o celular. Escutei quando ele veio e olhou cada uma das panelas, tinha ocupado meu tempo depois que cheguei da faculdade apenas com afazeres domésticos, mas mesmo assim eu ainda me sentia vazio.

- O que foi que aconteceu, Chris? - Ouvi a preocupação na voz da minha irmã e levantei a cabeça. Ela me olhava com aqueles imensos olhos azuis, ela parecia verdadeiramente preocupada comigo.

- Nada

- Chris, fala o que esta te perturbando - Ela modelou a voz, transformando-a em uma voz doce e convidativa e quando eu vi já estava falando.

- Li - Falei - Li foi embora para o Japão e nem se despediu de mim, ele me mandou uma mensagem. Isso é coisa que se faça com o namorado?

- Namorado? - Ela praticamente gritou, veio saltitando de onde estava até se sentar na minha frente, em seu rosto tinha um sorriso enorme - Então o senhor Christian fisgou o japonesinho?

- Não foi exatamente assim - Tentei me defender, mas Larissa já tinha a informação principal: Eu + Li= Namoro - Ele foi quem me fisgou.

- Melhor ainda - Ela estava radiante de felicidade - Chris, me deixa perguntar uma coisa?

- Claro.

- Vocês já transaram alguma vez?

Me engasguei com a minha própria saliva, senti meu rosto em brasas. Descrição nunca foi o forte de Larissa, ela deu um risinho quando viu a minha reação.

- E então? - Ela é um poço de curiosidade - Já ou não já?

- Larissa! Isso é lá coisa que se pergunte para o irmão mais velho?

- Eu não sei - Respondeu - O irmão mais velho aqui é você. Me diz Chris. Por favor! Por favor!

- Não - Respondi e olhei para ela. Grande erro, Larissa estava com os grandes olhos azuis arregalados e molhados, fazendo beicinho. Eles sempre faziam isso quando eram menores, nem sabia que eles ainda conseguiam fazer essa artimanha - Tudo bem! Eu respondo, transamos sim. Satisfeita?

- Sim - Falou - A quanto tempo vocês estão namorando?

- Três semanas.

- E ele foi para o Japão? - Arqueou uma sobrancelha perfeita.

- Sim, ele foi.

- Isso não é nada bom - Ela disse e depois se levantou - Nunca é bom sinal quando o namorado viaja com menos de um mês de namoro.

- O que você quer disser com isso?

Mas ela não me respondeu, vi seus cabelos loiros sumirem quando ela entrou dentro do quarto. Só tinha uma coisa mais estranha do que o fato de que ela não me disse o significado de sua fala enigmática.

Era mais estranho receber concelhos de sua irmã mais nova.

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