Mesmo Depois de Tudo

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Ela dormia no sofá agora, algo que me incomodou; eu deveria estar lá, mas desta vez a minha menina que dormia lá..
Era sempre assim quando discutiamos; ela batia a porta de nosso quarto forte, e se trancava lá dentro, mas isso não bastava pra ela; eu sabia que ela iria pro banheiro de nosso quarto e se trancava lá dentro também; não por medo de mim, ela só queria chorar sem o risco de que eu a ouvisse. Descobri há dois meses atrás, quando achei a chave reserva de nosso quarto. Nesta noite, já havia se passado mais de duas horas que ela havia se trancado lá dentro.
Lembro-me que abri a porta do quarto com cuidado, ainda temia ela estar com raiva e jogar-me algum de nossos porta-retrato; mas ela não estava no quarto como eu achava. Ela estava no banheiro, ela não havia trancado à porta do banheiro, porque achava que não teria risco de eu abrir a porta de nosso quarto e a encontrar lá. Mas lembro-me dela, deitada ao chão frio do banheiro, seu rosto rosado e seus olhos um pouco inchados de tanto chorar; exatamente como estava agora.
Me odeiei pelo fato de à fazer chorar tanto. Fechei as mãos em punho de raiva, e segurei-me para não quebrar nada.
Lembro-me que naquele dia me sente mal por ela; a peguei o mais cuidadosamente no colo, à levantando do chão, e a levei para nossa cama, a deitando em seguida.
Lembro-me que fiquei à observa-la, e deitei-me a teu lado.
A minha menina era linda, tinha cabelos castanho-chocolate, olhos claros, da cor do mel, olhos curiosos. A minha menina era uma garota curiosa.
Olhos que agora estavam inchados de tanto chorar.
- Culpa sua! - Gritou meu subconsciente.
Mas, o que eu podia fazer, eu era grosso, e ela sabia; eu não tinha os sonhos que ela tinha, e ela sabia; eu não à merecia, e isto, minha menina não sabia.
Começava a me levantar da cama, eu não à merecia, mas não conseguia mudar. Ela era doce e eu um carrasco.
Minha presença perto dela só à faria mais mal.
- Rodrigo? - Chamou-me ela. Sua voz acalmou meu coração. A olhei por cima do ombro; ela havia levantado-se um pouco da cama, estava se apoiando sobre seus cotovelos; estava com cara de sono, seu rosto ainda inchado, e os olhos cor de mel agora consumidos por um vermelho à sua volta, de tanto chorar, seu cabelos estavam um pouco bagunçados.
- O que quer ? - Perguntei ríspido. Ela engoliu em seco, mordeu o lábio inferior, e voltou seu olhar para a cama, se sentindo culpada; mas ela não tinha culpa alguma; pobre garota, foi se apaixonar logo por alguém como eu.
Me sentei na cama, para levantar e sair, eu iria pra farra, arrumaria uma morena demasiada linda, iria para qualquer balada, beber, beber muito, só para esquecer-me do fato dela estar me ganhando. Porém, sua mão alcançou meu ombro. A olhei de novo por cima do mesmo. Ela voltou a engolir em seco, e tirou a mão de meu ombro.
- Fica comigo hoje ? - Pediu com os olhos marejados. - Me ... me desc... desculpa Rodrigo. - Gaguejou ela, fungando o nariz. Eu sabia que ela segurava para não chorar e aquilo me irritou, se era pra ficar que ela não chorasse, ela sabia que aquilo me irritava. Ela fungou mais uma vez. Decide que não iria ficar, não queria à ouvir chorar.
Mas, antes que eu me levantasse, ainda estava de costas para ela, mas ela abraçou-me; envolveu seu braços pelo meu corpo, apertando um pouco; puxou-me mais para perto dela, e eu facilitei. Ela colocou sua cabeça em meu ombro, apertou-me ainda mais em seu abraço.
Eu sentia o movimento de seu corpo, que sofria os efeitos de sua respiração ofegante. Ela segurava-se para não chorar.
- Eu ... eu lhe tenho tanto amor Rodrigo. - Confessou em um pequeno sussurro.
Virei para encará-la; não era a primeira vez que ele dizia que me amava, eu nunca à respondia.
Seus olhos continuavam os mesmos, o mel com aquele vermelho ao seu redor.
Ela me olhava atentamente; havia esperança naqueles olhos. Ela queria que eu dissesse que não saíria naquela noite, que eu não iria pegar qualquer mulher e deixa-la em casa sozinha; havia esperança naqueles olhos, essa era sua esperanca; de que eu ficasse com ela.
Seu rosto delicado estava rosado; e sua boca, voltei minha atenção para ela, e ela seguiu meus olhos, as maçãs de seu rosto ficaram vermelhas; não era o que ela queria; ela queria o meu amor.
Aproximei-me dela, e a olhei nos olhos, naqueles lindos olhos; juntei nossos lábios, à puxei para mim, subi minha mão por suas costas, até chegar em sua nuca e entrelacei meus dedos em seu cabelos; já não havia mais espaço entre nós.
Aprofundei o beijo, e ela ofegou. Me afastei abruptamente dela, que me olhava espantada sem entender.
Dei as costas à ela, passei as mãos pelo cabelo exasperado; e logo saí de casa.
Lembro-me que voltei no dia seguinte, bêbado, e machucado; havia arrumado alguma briga e ela havia cuidado de mim assim que cheguei.
Era de madrugada, saí de todos os meus devaneios, de dois meses que me lembrava.
Agora passava-se das duas horas; e ela conseguira dormir naquele sofá. A minha menina havia dormido de cansaço de tanto chorar.
Desta vez foi nossa pior briga, ela havia chorado, gritado, e jogado na minha cara que eu nunca à havia dado valor, que ela queria ter uma família, que ela queria que seu pai ainda falasse com ela, porque ela havia os abandonado tudo para ficar comigo quado à chamei para morar comigo. Ela queria se casar, seu pai também queria, porém seu pai me odiava, e ela morria de amores por mim.
Mas agora ela estava farta, farta de todas as minhas traições, do jeito que eu à tratava, da vida que tinha comigo. Eu havia descobrido isto, quando achei todas as suas malas, com todas as suas coisas prontas. Ela iria me deixar.
Brigamos, brigamos por tudo.
Eu coloquei meu dedo em sua cara.
- Você é minha! E não vai à lugar nenhum! - Gritei para ela que sorriu, deu uma gargalhada sem humor e aquilo me enfureceu. Ela não me enfrentava, muito menos caçoava de mim de tal forma.
Arranquei as chaves do carro e da casa de suas mãos.
- Não vais à lugar algum! - Eu disse com um sorriso vitorioso no rosto.
- Estou farta Rodrigo! Farta! - Ela chorou; e foi em direção ao nosso quarto, entrei em sua frente, e tranquei à porta, para que ela não entrasse.
Ela me lançou um olhar que irradiava ódio, algo que nunca vi nela.
Lhe dei as costas e saí de casa, à deixando trancada.
Agora ela estava ali, deitada, dormindo naquele sofá; eu havia saído e passado algumas horas fora, me sente mal, como nunca havia sentido antes por ninguém.
Parecia que havia um buraco em meu peito, por saber que ela não me queria mais, pelo seu olhar de ódio; ela que sempre me olhava com tanto amor.
Mas eh havia decidido.
Trouxe todas as suas malas para a sala, coloquei um cheque com um bom valor dentel se uma de suas malas, e deixei as chaves da casa e do carro em cima do raquér.
Ajoelhei-me à sua frente, e fiz um carinho em seus cabelos; ainda dormindo ela virou-se de lado; depositei um beijo em seu rosto, outro em sua testa, e por último um em seus lábios.
- Ah, minha menina. Eu ... eu sinto tanto. - Sussurrei para ela.
Levantei-me e apanhei as chaves da moto, não queria estar ali, quando ela partisse. Já havia feito mal o suficiente à ela.
Abri a porta que dava para a rua, e dei-lhe um último olhar. Eu me lembraria dela para sempre assim: deitada no sofá, com os cabelos emaranhados, seus belos olhos cor de mel, e o amor que ela tanto me deu, ao qual eu nunca pude, nem ao menos soube como retribuir.
Engoli em seco.
Saí e bate a porta, desce os degraus da pequena escada; veste a jaqueta de couro preta que tinha em uma de minhas mãos.
Então montei na moto, liguei a mesma para dar a partida.
- Rodrigo! - Gritou ela, à porta, quase na escada.
Eu olhei em seus olhos e sorri.
Ela não desistiu de mim.

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