Capítulo 12

1.5K 174 10
                                    

— Me perdoa, Marian, eu não tinha outra opção. — diz a menina aos prantos.

— Todos temos outra opção, Ashley, pelo menos quando se trata de prejudicar gravemente outras pessoas. — Repreendo. Quando ela começou a chorar senti um pouco de pena, mas fazer uma denúncia falsa tão horrível ao ponto de fazer com que Lara seja descartada é algo que não é digno de pena ou compaixão. Teria que ser dura com ela se quisesse descobrir o que tinha acontecido — Me diz o que a Lara te fez pra chegar a esse ponto?

— Eu já te disse, fui obrigada.

— Quem te obrigou?

— Não posso dizer. — fala logo depois de ter outra crise de gemidos e soluços — Não posso dizer. — repete num sussurro.

— Então prepare-se, porque eu vou dar um jeito de você se arrepender.

Saio do quarto da menina batendo a porta. "O que pode levar alguém a fazer algo assim?", me pergunto. Se ela acha que um rostinho choroso vai me fazer ser condescendente, está muito enganada. Sempre me disseram que eu era muito dura com os outros, desde pequena tentava impor minha opinião e às vezes parecia mais grosseira do que realmente gostaria de ser, mas naquele momento agradeci por ser assim. Não posso — e nem preciso — me sentir culpada por prejudicar alguém que está me prejudicando.

Me dirijo ao saguão e permaneço lá por quase duas horas até que o ônibus venha buscar todo mundo para a primeira sessão de treinamento. Todos os jovens já estavam reunidos, mas não via Lara nem Ashley em lugar algum. Por um momento me sinto preocupada, mas logo o sentimento passa quando noto Stephanie me encarando com uma expressão distante. Um dos governantes entra na sala, fazendo com que se crie o mais absoluto silêncio. Em uma voz alta e clara ele chama todos por ordem alfabética para entrarem no ônibus. No primeiro dos automóveis cabem apenas os jovens até a letra C, mas logo chegam mais transportes e todos são acomodados e levados diretamente ao prédio de treinamento.

Eu não sabia o que esperar: mais injeções, algum interrogatório, talvez uma ou outra sessão de tortura belamente mascarada com o nome de "Preparação Física de Alto Desempenho"... Quando chegamos lá, porém, encontramos um longo corredor muito similar ao dos nossos dormitórios, mas com pelo menos o triplo de portas. Fomos organizados em fila indiana, alinhada exatamente no meio do corredor, e levados um a um para cada uma das portas.

Por causa da grande quantidade de portas, mesmo que meu nome não esteja lá muito no início do alfabeto, sou uma das participantes da primeira leva, então passo pelo treinamento antes dos que tem o nome iniciado pela letra P, por exemplo. Me levaram para uma das últimas portas lá no final do corredor. Ao entrar, percebo que as paredes e a porta são muito mais grossas que o normal, além de que a luz é ligada e desligada pelo lado de fora. "Seria muito mais útil e prático um interruptor do lado de dentro", penso, isso não tem nenhuma lógica. Logo mais descubro o porquê disso.

O guarda que me trouxe até dentro da pequena sala sai e me deixa sozinha. Espero pacientemente que alguém venha até aqui aplicar algum tipo de treinamento, mas ninguém aparece. A luz se apaga e meu coração acelera. Não consigo enxergar, estou perdida, meu senso de direção está confuso, "O que devo fazer?" O pânico invade meu corpo como uma faca gelada e afiada. Corro pela sala de um lado para o outro. Meu corpo se choca contra as paredes, minha garganta arde com os gritos. Odeio o escuro, sempre tive medo dele. Me pergunto se teria feito algo de errado, se apenas eu estava confinada em uma sala escura e silenciosa ou se os outros estariam passando por isso também. Isso é o treinamento de hoje? Nos enlouquecer?

Bato com os punhos fechados na porta, mas ninguém parece me ouvir, ou então só não me dão atenção. Conforme o tempo passa, desisto de todas essas inúteis tentativas de pedir socorro e caminho lentamente com as mãos tateando a parede até encontrar um canto em que eu possa me sentar e aguardar. O que mais eu poderia fazer? Melhor desistir, uma hora me tirarão daqui, não me deixarão morrer de fome, não me abandonarão. Alguém vai sentir a minha falta, tem que sentir. Finalmente encontro o canto tão desejado. Escorrego pela parede até bater contra o chão duro e frio. Minha respiração está acelerada, estou quase sem fôlego. Me concentrando na minha respiração, percebo o quão realmente silenciosa a sala é, quase como se houvesse abafadores poderosíssimos tampando meus ouvidos. Tudo o que eu conseguia ouvir era eu mesma.

Ao me acalmar percebo que aquela sensação não é tão ruim. Apenas eu, sozinha, sem ninguém me perturbando, falando, invejando, boicotando. Apenas eu.

Com o passar do tempo — que, aliás, eu nem consigo mais definir como minutos ou horas —, a sensação não é mais tão maravilhosa quanto quando inicialmente foi sentida. Os meus pensamentos parecem ganhar vida na escuridão, se espalhando pela sala como se fossem seres autônomos e vivos, ganhando força. O desespero volta e se transforma em lágrimas brotando dos meus olhos e escorrendo pelo rosto. Mas não como as de Ashley, barulhentas: as gotas descem rolando tão silenciosas quanto o resto da sala.

Quando perco as esperanças de que algum dia possa sair daquele lugar, a porta se abre, revelando uma luz tão clara que tenho que fechar os olhos e tropeçar para fora. Me acostumo novamente com a claridade, mas ela ainda é um pouco incômoda, assim como todos aqueles jovens barulhentos, que se comparados ao silêncio da sala anterior, são quase como um furacão passando ao meu lado.

Éramos mais ou menos duzentas pessoas, acredito eu, então levou um tempo até que todos pudessem passar pelo treinamento. Toda vez que alguém saia, parecia levemente mais perturbado e quieto do que quando entrou.

Sinto agonia ao imaginá-los passando por tudo aquilo. Essa era a ideia do governo de bom treinamento?

Nos torturar?  

A Teoria do CaosOnde histórias criam vida. Descubra agora