Capítulo 25

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Aquela cena, com Tyler ali, jogado no chão, me faz parar e pensar em tudo o que estava acontecendo. Ele está ferido. A culpa é minha. Preciso fazer algo, mas o quê? A porta não está trancada, o mais óbvio seria arrastá-lo dali. Mas e se o ferimento for maior do que eu imagino? E, ainda, como faço para tirá-lo com todas aquelas pessoas lutando? Não consigo achar uma resposta para isso, mas sei que se demorar mais um minuto pode ser tarde demais, podemos ser esfaqueados a qualquer momento. Então apenas arrasto-o do jeito que posso pelo chão até a porta. Mesmo com todo o barulho, seus gemidos angustiados são audíveis. Olho para o seu rosto que se contorce com a dor. Mexo na maçaneta até conseguir abrir a porta. A equipe já havia percebido o que estava acontecendo, porque seu esforço se torna perceptivelmente maior. A luz invade o local com força, fazendo com que os selvagens recuem um pouco pelo susto. Com isso, os outros saem correndo porta afora, quase atropelando a mim e Tyler.

Levanto e com a ajuda de Christopher empurramos e seguramos a porta. Em alguns segundos os empurrões de dentro cessam, com as pessoas selvagens retornando à escuridão da casa. Corro até Tyler e o apoio na parede, observando melhor o ferimento. O corte era profundo, mas por ser no braço, não me preocupo tanto, já que não põe sua vida em risco. Agora que estamos fora, supostamente seguros, é mais fácil pensar no que fazer. O primeiro passo é usar a água. Despejo todo o conteúdo sobre o seu ferimento sem hesitar.

— Alguém traga algo pra estancar o sangramento, por favor! — grito desesperada, tentando parar o sangue com minhas próprias mãos. O líquido quente me enojava, grudando na minha pele. Harmony se agacha ao meu lado e revira sua mochila à procura de algo que possa servir.

— Aqui, Marian. — estica um rolo de atadura.

Agradeço com um sinal de cabeça enquanto já começo a envolver seu braço. O tecido avermelha rapidamente, mas consegue impedir que o sangue escorra.

— Como você está se sentindo, Tyler? — pergunto preocupada, olhando seu rosto pálido coberto por pequenas gostas de suor.

— Não muito bem, pra ser sincero, mas acho que posso me recuperar. — responde com um sorriso de canto, fazendo com que eu suspire aliviada.

— Vamos te tirar daqui, prometo.

Hey, Mare? — Camila me chama enquanto se aproxima de nós dois — O que vamos fazer agora? Pra onde vamos se não podemos mais contar com a Arya?

— Vamos seguir adiante, para a floresta. Montamos acampamento e lá poderemos pensar melhor sobre a situação.

Okay, eu vou avisar os outros. É melhor que seja rápido, não sei se podemos ficar nessa cidade por muito tempo depois do que aconteceu. Não sei como ninguém ouviu o barulho, a agitação, mas alguém surgirá em breve, aposto.

— Claro. Só me dê dois minutos para ajeitar Tyler da melhor forma para a caminhada. — termino antes que ela vá embora.

— Marian, eu só estou com o braço ferido, ainda posso caminhar. — diz Tyler já se levantando do chão, rindo da minha cara de preocupação.

— Certo. Você está certo, estou exagerando. Vamos embora antes que eu fique paranoica.

Juntos recolhemos as coisas do chão e caminhamos com a equipe para atrás da casa, em direção às árvores. Obviamente não podíamos sair caminhando calmamente pelas ruas da cidade sob os olhares dos guardas de Arya se quiséssemos fugir. As intenções da mulher tinham se tornado muito claras e não eram nada amigáveis.

Caminhamos a passos rápidos pela mata por o que eu julgo serem dez minutos, antes de pararmos definitivamente. Por causa do ritmo, o sangramento de Tyler aumentara um pouco, mas já havíamos nos embrenhado o suficiente para que pudéssemos montar acampamento e, assim, renovar seu curativo.

Nos sentamos em frente a uma árvore enquanto o resto da equipe se prepara para descansar. Tyler apoia as costas no caule e eu tiro a bandagem que sobrou da mochila. Vagarosamente desato o tecido que cobre seu braço, desenrolando cada centímetro com paciência, tentando não tocar demais o seu ferimento. Mesmo com todo o cuidado, seu rosto se contorce de dor algumas vezes, mas ele é um rapaz forte, não, geme, não grita e nem me xinga quando meu dedo escorrega e acaba apertando seu braço justamente no local do corte.

— Me desculpe. — peço.

— Tudo bem, só tome cuidado.

Finalmente consigo desgrudar o último fiapo remanescente da sua pele. A última garrafa de água que eu usara para limpar seu ferimento tinha acabado, então preciso recorrer a uma nova, uma das destinadas para beber. Despejo apenas metade do conteúdo dessa vez, esfregando um pedaço limpo da bandagem usada para ajudar na limpeza. Depois de razoavelmente higienizado deixo o corte respirar um pouco enquanto vou falar com os demais do grupo.

— Eu precisei usar um pouco da nossa água para limpar o braço de Tyler. Queria saber se algum de vocês poderia procurar por uma fonte, um riacho, algum lugar para encher as garrafas.

— Tem certeza que podemos beber água de um riacho? — indaga Harmony, preocupada.

— Não teremos outra opção quando a água acabar. — responde Christopher enquanto se levanta — Eu procuro. — ele completa, já indo embora. Agradeço e volto a me sentar com Tyler, agora enrolando seu braço numa bandagem limpa.

— Eu sei que não foi proposital, Marian. — começa. Afirmo com a cabeça, mas a culpa ainda me consome — É sério. Podia ter acontecido com qualquer um de nós. Era um pandemônio, não estávamos mais distinguindo quem era quem.

— Eu sei, mas eu podia ter tido mais cuidado. E se tivesse sido mais grave? Se tivesse acertado seu estômago, seu peito ou sua cabeça?

— São muitos se isso, se aquilo... não foi e é isso o que importa. — diz enquanto termino de prender o tecido. Assim que largo seu braço, ele segura minha mão e olha em meus olhos — Me promete que vai parar de pensar nisso.

— Prometo que vou tentar. — respondo mais para consolá-lo, do que por ser verdade — Agora descanse. — largo o braço dele e me afasto, indo me sentar com Camila.

— Posso ficar de guarda primeiro? — pergunto.

— Eu ficaria, mas se você quiser é claro que pode ficar.

— Certo. Obrigada.

Me levanto e procuro por uma árvore que me pareça confortável para me apoiar. De lá posso observar todos: pessoas sem nenhum treinamento, mas muito boas em combate. Cada um com suas memórias, seus rancores, suas personalidades e desejos... É tão estranho pensar assim. Tento me colocar na mente de Tyler e quase posso sentir aquele braço latejando, ligeiramente com raiva de mim por tê-lo ferido, mas sabendo que não deve me culpar. Depois, na mente de Christopher que eu nem posso ver, nem sei onde está, mas com certeza procura por uma fonte limpa de água, buscando a sobrevivência de todos nós. Camila, olhando para as folhas de árvores iluminadas pelos raios de sol e contrastantes com o belo céu azul, imaginando o que acontecerá nos próximos dias. Harmony, brincando com os galhos secos na grama...

Acordo de meus devaneios sabendo o que tenho que fazer. Observar e me colocar no lugar daquelas pessoas despertou algo em mim, que eu nem sei o que é, mas essa coisa me diz o que eu tenho que fazer. Preciso falar com Arya.  

A Teoria do CaosOnde histórias criam vida. Descubra agora