13° Camada

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Decido ir pra casa.
Chego e minha mãe não está. Subo pro meu quarto e deixo a mochila no chão.
Abro uma janela e vejo se encontro sniff pela vizinhança. O gato não aparece já há dois dias. Coloco comida em sua bandeja e pego meu notebook. Coloco em um episódio de uma série, e assim que termino, desço para cozinha para comer alguma coisa.
Pego um pacote de biscoito no armário e me jogo no sofá.
Fico ali por um tempo esperando a hora passar.
Mando uma mensagem pro meu pai perguntando onde iremos nos encontrar e ele responde dizendo que pode ser num café que fica próximo a seu trabalho. Penso que terei que pegar um ônibus pra chegar até lá mas decido não criar caso e só digo que tudo bem.
Olho as horas e já são 12:50, então decido trocar de roupa e ir.
O ônibus não demora a passar então acabo chegando 30 minutos mais cedo.
Marcamos de nos encontrar num café que costumávamos ir sempre.
Durante sua residência no hospital, meu pai passava a maior parte de seu tempo aqui, e como minha mãe, nessa época, trabalhava nesse mesmo hospital, este acabou se tornando  um lugar de encontro comum para nós.
Espero durante 20 minutos até que ele chegue. Ele pede o mesmo de sempre: Café preto bem forte e quente. Peço um cappuccino e nos sentamos numa mesa ao fundo do lugar.
Permanecemos em silêncio durante um tempo até que ele começa:
— Então Nick, não vi você indo embora naquele dia...
— É... Não tinha mais nada pra eu fazer lá, disseram que eu estava liberado então fui embora.
— Seu nariz já está bem melhor. — Ele me observa analisando meu rosto — Ele deve desinchar completamente nos próximos dias.
— É, é, espero que sim. — Permaneço com os olhos baixo, rodando meu copo.
— Mas então... Como você está, Nick?
Para de rodar o copo. Bebo um pouco e o coloco em cima da mesa novamente.
— Por que você me chamou aqui? — O encaro, percebendo fios brancos em seu cabelo preto, seus olhos castanhos parecem mais claros sob os feixes de luz solar, seu cenho rígido se mantém igual, porém é visível o cansaço das horas passadas em plantão.
Ele abaixa os olhos e se mantém em silêncio por um momento.
— Me desculpe, Nick. — Ele me encara, sua fala trava por um momento. — Eu nunca... Nunca deveria ter deixado passar tanto tempo. É que a situação estava insustentável, e tanto eu como sua mãe não conseguiríamos ficar daquela forma por muito tempo, ela tinha ciência do que estava fazendo e de como as coisas estavam acontecendo e indo para o pior lado possível e... — Ele fala rápido, sem pausas e repetindo as palavras.
— E você preferiu partir. Preferiu ir embora, seguir em frente. Preferiu seguir
sozinho. — Minha voz sai cortante, e as palavras escapam sem que eu as consiga conter. Percebo lágrimas se formando em seus olhos, e penso nunca ter o visto tão vulnerável quanto agora. Ele coloca a mão em seu rosto e as limpa antes mesmo que elas caiam.
— Eu sei que te decepcionei, e eu peço perdão por isso. Eu tentei falar com você, eu tentei mas sua mãe não deixava e naquele momento eu não tentei ir contra, eu não quis deixar o clima pior do que já estava, eu não percebi naquele momento... — Sua voz sai trêmula, frágil. — Já faz um tempo que eu venho tentado falar com você mas eu não tinha seu número e todas as vezes que ligo pra você, sua mãe desliga o telefone. Eu sei que nada justifica o que eu fiz, Nick, eu sei. Mas eu quero que você me ajude a consertar isso.
— Nós. Você nos decepcionou. Eu fiquei chateado quando você foi embora, mas minha mãe ficou devastada. — Ele desvia o olhar, pega o copo de café e bebe todo o conteúdo em um gole. — Eu tinha quatorze anos na época, não era uma criança. Você poderia ter conversado comigo. Poderia ter tentado. — Ele baixa os olhos. — Eu te desculpo pelo que fez a mim, eu já não sinto mais raiva de você. Mas eu te culpo pelo que fez com
ela. — Ele me encara, me olha fixamente.
— O que eu fiz com ela? — Ele diz, franzindo a testa.
— Minha mãe ainda não superou o fato de que você foi embora, e ela tenta compensar isso de outras formas. Se isso é sua culpa, eu não sei. Mas sei que eu te culpo por isso.
— Nick... — Ele me olha com tristeza. — Eu não larguei sua mãe porque eu não a amava mais. Eu larguei sua mãe porque ela estava tendo um caso com um cara.
Fico sem palavras.
— Eu descobri que ela estava ficando com um cara já há algum tempo, eu a amava Nick. Tentamos continuar mas eu não aguentei, eu disse que queria um tempo e ela não aceitou, então resolvi terminar tudo de vez.
O encaro sem acreditar no que diz.
— Não quisemos te dizer isso antes porque não achamos que você saberia lidar com isso. Nosso casamento estava desgastado Nick, nós dois trabalhávamos demais... Eu não a julgo pelo que ela fez, doeu na época mas hoje vejo que foi o melhor. Nós dois procurávamos por um motivo para que pudéssemos terminar aquilo.
Abaixo a cabeça.
— Não estou tentando justificar o que aconteceu Nick, nem tentar fazer com que sinta raiva dela, eu só quero que você saiba que foi difícil pra mim também.
— Eu não sei o que dizer, não sei o que pensar... Preciso de um tempo para que consiga digerir tudo isso.
Me levanto e saio antes que ele tente dizer alguma coisa. Decido não ir pra casa agora e fico dando voltas pensando em tudo que ele me disse.
Recebo algumas ligações da minha mãe e decido voltar pra casa.
Quando abro a porta, vejo minha mãe sentada no sofá.
Ela me olha e posso ver que está irritada com alguma coisa, ele pede pra que eu me sente e diz:
— Recebi uma ligação do diretor da sua escola hoje, Nick. Ele me disse que você não tem frequentado a escola regularmente desde que o ano começou e que se você continuar dessa forma vai ser reprovado por frequência. — Ela me olha e para a mão em seu queixo. — Você me desapontou, Nick.
A encaro sem ter o que dizer.

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