Capítulo 2

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Acordo dos meus pensamentos, e assim que isso acontece sinto uma sensação estranha por vê-la fora deles.

- Jorge? Você ta bem?

- Eu acho que sim.

- Não ta feliz por me ver?

Sorrio com o seu exagerado uso do verbo abrazileirado "ta".
Somos dois Brasileiros, porém artistas mundialmente famosos.
Estamos falando português, sempre fazíamos isso.
Algumas pessoas olham estranho por não entender a língua com tantos "r".
Mas nunca ligamos para isso, por que ligaríamos agora?

- Sim, claro que estou feliz, na verdade não sei o que fazer.

Ela sorri.

- Não precisa saber, tem alguém aí?

Ela aponta para o banco vazio ao meu lado direito.
Infelizmente tinha sim alguém.

- Tem uma senhora japonesa que baba muito.

Ela gargalha.
Que saudade eu tinha de ouvir este som.

- E onde ela está agora?

- Não faço ideia - dou de ombros.

- Bom, espero que ela não tenha raiva.

Logo percebo que ela falou "raiva" se referindo à doença, e entendo o trocadilho.
Ela se senta do meu lado.

- Você não deveria fazer isso. - digo preocupado.

- Quem liga? - Ela fala em tom de despreocupação.

- As pessoas que vão procurar os corpos se morrermos.

- Não vamos morrer - ela ri.

- Quem sabe? - dou de ombros.

- Percebeu?

- O que?

- Eu não desapareci - els diz alegre.

Sorrio por ela lembrar de suas últimas palavras ao me ver à um ano atrás.

- Desapareceu sim, por um ano. Nem na mídia tive notícia sua.

Era a mais pura verdade, ela é, ou pelo menos era uma cantora de sucesso.
Sempre estava na mídia, porem de um ano para cá, ou a mídia não a queria mais, ou ela teria tirado férias da vida.

- É, eu meio que fugi da minha vida, mas estou indo fazer um show em chicago.

- Hum, legal. - não quero que ela saiba que também farei isso.

Ela olha pra trás e arregala os olhos.
Olho também curioso e vejo a velhinha.

- Acho melhor você sair. - digo assustado.

- Deixa que eu resolvo.

Eu fico confuso mas faço que sim com a cabeça.
A velhinha chega e olha furiosa para seu assento.
A Samanta respira fundo e começa a falar me deixando surpreso.
Sim ela está falando japonês.
Ela negocia o assento com a senhora e acaba ficando lá, ela se vira para a janela observa as nuvens como se nada estivesse acontecendo.

- Então você fala japonês?

- É coreano, mas falo japonês também.

- Como assim?

- O que você quer dizer com isso? Achava que eu era apenas bonita?

- Modéstia você!

- Mas eu sei que sou bonita, não estou sendo arrogante, isso é um fato, e é por esse fato que todos me subestimam. Me olham e pensam: "menina bonita, provavelmente burra" é sempre assim.

- Nunca te subestimei.

- Não diretamente, a sua surpresa foi maior do que de qualquer outra pessoa quando descobriu que falo umas 10 línguas.

Me esforço para não ficar mais surpreso ainda, eu fui pra cama com ela por uma semana, e achava que sabia de tudo.

- Ah, ok então.

- Pode se impressionar.

- Caraca! Dez línguas?

Ela sorri largamente.

- Sim, dez, quando te conheci já sabia seis.

- É incrível como a gente...

- É, sem detalhes, e você não sabia de nada. - ela fala sorrindo, porém a conheço e sei que ela não está bem.

- Desculpa.

- Tudo bem. - ela se aconchega no assento, encosta a cabeça na janela, respira fundo e fecha os olhos.

Tento me perguntar o que está acontecendo, mas tudo acontece tão rápido, é uma turbilhão de ideias, pensamentos e lembranças na minha mente.
Ela pode estar dormindo, só queria conversar mais, saber quem ela realmente é.
Uma poliglota? Sim
Uma garota audaciosa e que eu achava ser a mais graciosa do mundo? Sim.
Mas essas não são minhas únicas perguntas. Todos os garotos olham para ela por qualquer coisa menos pelo que ela é. E cometi o erro de fazer o mesmo.
Queria pedir perdão e desejar que tudo acabasse e só se resolvesse mas isso não vai acontecer.
Ela se mexe e me olha, ela só move o pescoço para direcionar sua cabeça para me ver.

- Pensando em que ruivo?

Sorrio. Queria poder dizer que tudo ali em minha mente se direcionava à ela, mas não podia, ela olharia estranho, com suas sobrancelhas dobradas como sempre fazia quando estava confusa.

- Na vida, em tudo que está acontecendo.

- Você ta bem confuso né?

- Sim, se eu estou, imagino você.

- O abandonado foi você, não eu.

Me sinto ofendido, mas ela logo abre um sorriso e me dá um empurrão de lado.

- Não devia brincar com isso.

- Não brinquei, só falei a verdade.

- Então admite?

- Admito o que?

- Você me abandonou, não disse pra onde ia, as únicas palavras que disse foram "não se preocupe se eu desaparecer" acha que isso não doeu?

- Calma ruivo! Pensei que já tivesse superado.

- É, parece que não. - me levanto e vou no banheiro.

Olho para os lados e sinto uma forte dor de cabeça.
Molho meu rosto e saio do banheiro me deparando com a linda garota de cabelos castanhos com os olhos tristes, seus olhos encontram os meus, e em um gesto apressado ela me beija.
Eu não entendo muito bem, mas retribuo.

- Não me pergunte nada - ela fala.

- Não pretendia - percebo que a dor na minha cabeça evaporou como água no deserto.

Olho de novo em seus olhos.

- Desculpa por tudo - ela fala triste, consigo sentir em sua voz.

- Não precisa pedir desculpa, estava tentando seguir seu caminho, eu devia ter feito o mesmo, mas sou muito imaturo pra te esquecer - abraço ela.

- Eu sou madura, mas nem assim te esqueci. - ela me olha sorrindo.

Penso se eu deveria contar à ela que estou indo para o mesmo lugar, mas decido que não.
Pode piorar tudo. Mais cedo ou mais tarde ela pode me procurar e tudo vai começar de novo.

- Vamos sentar. - digo.

Vamos até nossos assentos e ela se apressa para ir lodo para o "dela".

- Vou dormir um pouco - ela fala e logo depois boceja.

- À vontade.

Ela encosta a cabeça na janela novamente e fecha seus olhos.

Don'tOnde histórias criam vida. Descubra agora