Capítulo 4: Naradá

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Meu despertar foi impulsionado por um sonho. Tudo nele era intenso, vívido. Só quando me deparei com o teto branco foi que tive certeza de que era um sonho. Mesmo chateada, não pude deixar de atender ao pedido de Megan e da estranha mulher que a acompanhava.

Após dias deitada, encolhida, envolta no lençol como um bicho-da-seda em seu casulo, coloquei o corpo para fora. Sentar foi desconfortável; tudo doía, resultado do castigo que infligi a mim mesma. Só tive forças para me levantar porque ainda estava em estado de êxtase pelo sonho. Sentada na cama, lembrava-me de tudo, tentando fundir essas boas lembranças à minha mente.

Em meu sonho, eu andava pela ilha, encantada com a profusão de cores que havia conhecido na floresta. Meus olhos não se acostumavam com aquilo. Encontrei uma trilha e soube que devia seguir por ela: alguém importante estava me esperando. Caminhava rapidamente, tinha pressa, não podia me atrasar. As árvores e flores gigantes foram se espaçando, até ficarem em meu passado. No futuro, só existia o enorme prado verde. A grama macia era alta, roçava em meus joelhos. Diferente da confusão de cores da floresta, aqui reinava o verde da grama. Ao longe, no centro do prado, podia ver alguma cor. Aumentei o ritmo. Meu encontro era lá.

– Droga! Vou demorar dias para chegar! – esbravejei.

– Não precisa ser assim. Basta você pedir, e a faço chegar mais depressa.

Procurei a dona da bela voz, mas não encontrei ninguém por perto.

– Devo estar ficando louca! – sussurrei.

– Não, você só está dormindo.

Aceitei que isso fosse possível, feliz por finalmente não estar tendo um pesadelo. Não vi nenhum mal em conversar com as vozes em minha cabeça.

– Tudo bem. Será que você pode me dar uma mãozinha? Preciso chegar à coisa colorida antes de acordar.

A primeira impressão que tive foi que a paisagem estava de algum modo se sanfonando, como um leque, diminuindo a distância até os pontos coloridos. Como a lógica e os sonhos não são lá muito íntimos, aceitei tranquilamente. Depois de algum tempo, observei que não era a paisagem que se movia. Era eu. Corria tão, tão rápido que mal via as coisas à minha volta. Não sentia nem mesmo a grama alta batendo em minhas pernas, só conseguia manter o foco em meu destino.

Estava perto quando pude distinguir que as coisas coloridas eram enormes pedras retangulares: vermelhas, verdes, amarelas, uma aquarela inteira. Estavam alinhadas paralelamente na posição vertical, algumas solitárias, outras em duplas. Deixavam pequenos vãos entre elas, formando um grande círculo. Havia ainda duas na vertical logo à minha frente, uma vermelha e outra branca, que sustentavam uma pedra marrom na horizontal, como um gigantesco portal. No centro das três pedras coloridas, havia um buraco circular; em volta dele, algumas estranhas palavras entalhadas. Lembrei-me dos antigos templos dos druidas.

Preocupada, notei que minha velocidade não diminuía. Tive certeza de que ia dar de cara em uma das pedras, o que faria tudo desmoronar em um efeito dominó. Em pânico, tentei parar, mas não consegui.

– Não consigo parar! – gritei.

Funcionou: voltei a andar normalmente. Sem dúvida, este era o sonho mais louco que já tive na vida.

Passei pelas enormes pedras, o sol a pino. Lá tudo era colorido, como a floresta. Os raios de sol que incidiam sobre as pedras refletiam dentro do templo. Era como andar dentro de um arco-íris. No centro do círculo, havia uma espécie de palco — não, “altar” era mais apropriado. Uma pedra escura com cinco degraus servia de base. Nas quatro extremidades, havia chafarizes com águas dançantes, como na vila branca. No centro, uma velha árvore. Sentado, com as pernas balançando em um galho baixo, havia alguém. Não conseguia ver quem era, mas precisava descobrir. Dei o primeiro passo em sua direção, mas senti uma mão quente no meu ombro. Assustada, virei-me. No fundo, ainda esperava que meus pesadelos me encontrassem.

O Despertar da GuillentOnde histórias criam vida. Descubra agora