Capítulo 24 #Olivia

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Olivia está cheia de coisa para fazer... Está na época em que o restaurante faz fila do lado de fora e esses são os dias que ela mais gosta porque são os únicos dias que ela simplesmente se desliga da sua vida. Hoje não é diferente. Olivia andava de um lado para o outro na cozinha, um hora ela mexia em uma panela, outra hora ia para outro fogão e colocava um pouco do conteúdo na boca para saber se estava bom de tempero. Ouvia-se o sino que indicava que a comida estava pronta para ser servida. O garçom recebia o pedido e levava até a mesa. Olivia trabalhava no automático. Ia até os pedidos pendurados na entrada da cozinha gravava três pedidos de uma vez e começava a trabalhar nos pratos junto com sua equipe. Ela era a chef naquela cozinha, mas não podia ficar apenas dando ordens numa noite tão corrida. E assim ela podia pensar em outra coisa que não envolva o falecido. Nada melhor que aquela bagunça organizada que ela tanto amava.
- Estou preparando os pedidos da mesa 23!
- A mesa 17 disse que o frango está gelado por dentro.
- Ramon! Diminui o fogo, seu frango esta voltando frio.
- Sim, chef, refazendo o frango!
- Mesa oito falta a almôndega!
- Saindo almôndega. Pronto! Mesa Oito!
Toca o sino.
- O risoto está pronto!
- Mesa cinco!
Toca o sino novamente.
E isso dura mais duas horas e então quando Olivia finalmente consegue parar para respirar Dolores, uma das gerentes do Cortina d'Ampezzo, entra e abre um sorriso para Olivia. Ela retribui, gosta bastante de Dolores, mas quase não teve tempo de falar com ela hoje, dada a quantidade de trabalho.
- Oi Dolores, tudo bom?
- Sim, e você?
- Bem cansada.
As duas riem e Dolores continua.
- Liv, tem dois clientes que querem conhecer a cozinha e agradecer pela comida. Um casal de irmãos e falaram que você os conhece.
Olivia tentou ficar mais ereta, sempre pediam para conhecer o Chef e agradecer pela comida, talvez por verem filmes demais. Na vida real, sair da cozinha era quase impossível. Mas ela estava finalmente respirando e por mais que esteja cansada, sabe que seus superiores ficam agradecidos quando ela recebe os elogios dos clientes e descansar, pelo visto, é algo que não está na sua agenda para hoje. Sentiu um pouco mais ansiosa quando percebeu que deveria ser o Alex, irmão da amiga de Rafa com irmã. Claro, porque fica menos estranho ele vir jantar com a irmã para convidá-la para sair. Pensou com certo sarcasmo assim como fazia com qualquer investida do sexo oposto nos últimos meses.
- Tudo bem, pode mandar entrar, mas diga que tem que ser rápido, estamos respirando agora, mas tem muita coisa pra fazer ainda.
- Não se preocupa, eu já deixei avisado, é que ele insistiu muito.

Olivia arrumou seu Dolmã, se afastou das panelas e tirou a rendinha do cabelo deixando a mostra seu rabo de cavalo loiro. Não tinha espelho para saber se estava apresentável, mas se estivesse tão ruim assim Dolores avisaria.
Enquanto esperava percebeu que o balcão estava desarrumado de uma forma que se seu patrão soubesse reclamaria por uma semana no seu ouvido.
- Joel, Tamara e Lídia, eu sei que hoje estava corrido, mas isso aqui não é nem de perto apresentável.
- Desculpa chef.
Ela ouviu o coro dos três cozinheiros responsáveis por revezar naquele setor e Tamara começou a arrumar a bagunça.
- Tudo bem, só prestar mais atenção e revezar. Vocês estão ótimos hoje...
Ela se virou e paralisou com as duas figuras a sua frente.
- Você fica ótima numa cozinha desse tamanho também, como você consegue?
Olivia sentiu suas pernas se tornarem gelatina, na verdade ela teve a sensação que seu coração subiu até sua garganta e ela precisava lembrar que ela já tinha aprendido a respirar.
Se manteve calma tentando não parecer abalada com a presença de Bruno. Mas ela não pôde simplesmente ignorá-lo porque ele foi esperto o suficiente para vir com Júlia.
- Trazer sua irmã para a Itália? Que irmão atencioso.
-Ela me pediu de aniversário, não pude recusar.
Bruno estava sorrindo timidamente para Olivia. Ela reparou que ele estava de barba feita, o cabelo estava menor e não tinha mais aquele aspecto de bagunçado permanente. Ainda assim ele estava lindo.
Ops, pensamento errado.
- A Itália é enorme.
- Mas eu queria vir para cá. - Bruno disse sem se importar com os curiosos ao redor. - Ouvi falar da comida que fazem aqui.
Olivia sabia que todos estavam querendo saber das suas férias no Brasil e agora duas pessoas falando em português com ela na cozinha onde todos falavam Italiano? Sim... Todos estavam curiosos e pro seu azar a maioria ali também sabia português suficiente para entender o que falariam ali.
- Se você não veio para elogiar a comida eu vou precisar que você se retire, estamos com muitos pedidos e aqui não é o melhor lugar para conversar.
Os pedidos saiam e os cozinheiros passavam ao lado deles toda hora, Olivia nunca se sentiria a vontade falando do quanto ela queria se esquecer de sua viagem naquele lugar.
- Tudo bem, posso passar na sua casa se me passar seu endereço e podemos tomar um café. Não acho que Julia queira ficar mais tempo comigo.
- Ja vi tanto italiano gato que estou triste por ter vindo com ele e não com a Lila. Ela não é tão empata foda. - sussurrou a última frase.
Esqueceu que ela era tão carismática e falante. Percebeu que sentia sua falta. Como pode? Só se viram duas vezes.
- Eu estou pagando a sua viagem e é assim que você me retribui? E sobre o que combinamos? Você não fala.
Bruno reclamou e Julia riu.
- Até parece. - Ela passou pelo irmão e pegou Olivia pelo braço e abraçou-a. - - Meu irmão pode ser cabeça dura as vezes, mas ele está aqui sem nenhuma máscara. Amanhã tomem um café e tentem pelo menos não se matar, quero ter alguém na Itália para ter desculpa de visitar.
Julia sorri novamente e abraça sem outro aviso e sai dando um tapinha no braco do irmão.
- Te espero lá fora?
Bruno nega e se vira para Olivia.
- Não vou obrigar você a passar algum tempo comigo, mas quero deixar bem claro que eu quero demais que você venha amanhã. Por falar nisso, obrigado, Julia. Estava mesmo precisando que você falasse tudo por mim.
- Você ainda tem tanta história pra contar, acho que isso não foi nada.
- Eu vou, quero acabar logo com isso. Amanhã eu passo aqui as 13:00, depois da faculdade.
Bruno assentiu um pouco triste e se virou para sair quando ela o interrompeu.
- Porque você está aqui, Bruno?
Ele se virou, olhou bem nos olhos de Liv e disse:
- Porque eu te amo o suficiente. Eu vim pra cá porque você está aqui. Eu estou aqui porque mesmo que você estivesse no fim do mundo, eu estaria. O resto perdeu a graça.

Olivia literalmente ficou de boca aberta quando Bruno simplesmente saiu. Ele disse que a amava?
Todo mundo estava olhando para ela, mas quando acordou e olhou-os de volta continuaram com seus afazeres sem falar nada sobre a cena de novela mexicana incrivelmente dramática, e aos poucos o barulho dos talheres nas panelas, o óleo fritando batatas e frangos mascaravam seu constrangimento e ela voltou ao trabalho lembrando que seu sonho, apesar de não ter sido exatamente assim, acaba de se tornar real.
Só precisava saber se isso seria mesmo um sonho bom ou um terrível pesadelo.

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