Capítulo 5 - Eu a perdi...

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− Não acredito que você saiu da festa de ano novo sem se despedir de ninguém.

− Acho que foi a ressaca. Mas eu tenho a sensação de que não fiz falta nenhuma.

− Pode ter certeza que não. Foi muito boa aquela festa - João comeu seu último pedaço de lasanha e colocou os talheres sobre o prato.

− Imagino - eu disse. - Pelo menos, meia dúzia de pessoas que estava lá me odeia - bebi um gole de água. − Falando sério, João. Eu me sinto culpado por tudo o que fiz com Olívia. Como... Como se eu tivesse brincado com seus sentimentos.

− E não brincou? Thomas, você transou com duas mulheres por meses... Isso é o fim da picada.

− Eu só queria ajudar...

− Você foi um canalha. Aliás, um canalha e tanto - João fez uma voz de locutor de rádio. - Converse com ela. Peça desculpas. Talvez se sinta melhor. Acho que até seu irmão vai concordar comigo.

Ele levantou-se e foi até o banheiro. O restaurante estava movimentado para o dia quatro de janeiro; todas as mesas tomadas, um fluxo contínuo de pessoas aguardando um lugar para comer, um burburinho de conversa animada se elevando acima da música. Durante o dia todo, eu bem que tentei me concentrar nos processos que aguardavam audiência, mas minha cabeça doía demais. Talvez fosse o excesso de uísque que eu havia tomado nesses dois últimos dias. Tentei esquecer Lúcia, mas nem a bebida me dava essa honra.

João deu uma secada na loira que aguardava no bar e voltou para nossa mesa.

− Olhe, eu sei que você ficou puto da vida com a história da gravidez falsa, mas Olívia teve seus motivos. E é um horror ter que conviver com todos vocês se estranhando.

− É um saco ser você.

− Como se você entendesse.

− Por que você não arruma uma namorada e melhora esse humor?

− Porque eu não quero. Estou estudando para ser juiz. Não tenho tempo para pensar em namoro, flores e sexo.

− E o que está fazendo aqui? Deveria ir para casa estudar.

− Estudo de dia. Me distraio à noite. Aliás, amanhã quero te levar em um inferninho - A atenção de João vai para o outro lado do restaurante. - Uau. Acho que estou apaixonado.

Desde a hora em que comecei a comer notei a presença da loira sentada no banco do bar, movendo seu copo em círculos no ar. Ela estava de costas com um ar absolutamente sereno e eu presumia que aguardava alguém.

− Se eu fosse você, pagaria uma bebida para ela.

− Tenho que manter o foco, Thomas. Nada de mulheres. Estudo, estudo, estudo!

− Ok. Cada um escolhe o quer para o seu futuro.

Então, virei para a porta e tudo sumiu da minha mente. A única pessoa que eu tentava não pensar. A única pessoa que eu não esperava ver ali no restaurante. Eu tentava me distrair um pouco com João para ficar menos neurótico com meus pensamentos malucos, e lá estava ela.

− Lúcia - disse em voz alta.

− Quem é Lúcia? - perguntou João desviando os olhos da loira do bar para a porta. - Não é a irmã da Olívia?

Vi o vestido vermelho curto modelando seu corpo, a postura quase perfeita sobre o salto alto, a maquiagem forte que a tornava mais sexy do que nunca. O cabelo preto e liso que eu tanto amava.

− Uau! Ela é muito gostosa - João quase babava. Achei que fosse socar ele, mas me controlei. − Vamos cumprimentá-la...

Mas, antes dele terminar de falar, eu peguei meu paletó da cadeira e logo vi que Lúcia e a loira do bar desceram pela calçada com passos apressados.

− Aonde você vai, cara?

− Pague a conta, João − fui atrás dela. - Preciso resolver um assunto.

Ainda ouvi meu amigo bufar.

− Ok. Como sempre eu pago a conta...

Da porta do restaurante, avistei Lúcia e a loira do bar se misturarem na multidão de pedestres do outro lado da avenida Paulista. Era certo que eu queria saber aonde as duas iriam juntas, vestidas para matar qualquer homem de tesão.

Então, elas viraram a esquerda no sentido da Rua Augusta num passo apressado. Antes que eu conseguisse atravessar a Avenida Paulista, os carros passavam a toda e eu não conseguia mais vê-las. Assim que o semáforo abriu, corri. Olhei para a rua em que elas haviam descido, mas não avistei nenhuma das duas. Provavelmente, haviam entrado em algum taxi, ou ônibus.

− Porra! - xinguei.

Subitamente, me senti acabado. Era como se fosse um jogo e eu tivesse perdido todas as minhas chances de vencer. Então, eu me sufocava com as emoções: o medo, a dor, a perda, a traição, o desrespeito. Ela tinha um segredo que talvez eu pudesse não gostar. Mas, ficar com a dúvida do que me escondia, me matava aos poucos.

Eu precisava descobrir a verdade. Nem que fosse para colocar um ponto final em nossa história.


Nunca esqueça de nós doisOnde histórias criam vida. Descubra agora