Um conselho gratuito

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Despertei com o coração rugindo no peito com a ferocidade de um animal enjaulado. Pisquei algumas vezes tentando eliminar a imagem de Ferreiro preso enquanto nossa casa submergia em chamas e fumaça. Atordoada pela paisagem ao meu redor, por um momento pensei que estava presa em um sonho dentro do meu cotidiano pesadelo.

Respirei ritmicamente até normalizar as batidas aceleradas no meu peito e observei a paisagem escura e densa que me cercava levando instintivamente a mão à adaga presa a minha cintura. Eu não tinha a mais remota idéia de que horas eram, quando todos os dias se convertem em noite fica difícil estabelecer uma regra. Quando você se sente cansada você dorme, quando sente que pode seguir adiante você simplesmente faz o que costumava fazer, embora já nada seja como antes.

Senti meu corpo estalar e protestar enquanto me levantava e praguejava culpando o maldito tronco de árvore onde havia adormecido encostada pela repentina dor que ameaçava explodir minha cabeça e observei o fogo, azul, laranja e amarelo crepitar na fogueira que havíamos feito antes de discutir uma e outra vez sobre qual seria o lugar mais seguro para descansar.

Amis havia ganhado.

Ele era o curandeiro do príncipe afinal.

Mas agora ele não estava ali... E Illián tampouco.

                                                                               *☆**☆**☆**☆*

Caminhei entre as árvores sentindo seus galhos rasparem meu rosto enquanto avançava na escuridão. A tocha que levava não iluminava mais que uns poucos metros adiante e a lua parecia ter se escondido, e embora eu soubesse que isso era impossível sabia também que aquele caminho era uma armadilha da qual poucos haviam conseguido escapar.

Os que conseguiram tinham enlouquecido e jamais puderam contar sua glória.

Foi então que escutei uma risada seguida de outras tantas vindas de todos os lugares. Uma risada que parecia um estrondo, uma risada que faria estremecer montanhas.

E depois o som de uma espada cortando o ar e logo sua luz, como uma estrela fugas queimando na noite.

Amis estava encolhido atrás de um tronco, observando com os olhos arregalados enquanto remexia com dedos trêmulos no conteúdo da bolsa que levava. Não somente sua expressão denotava o terror que estava sentindo, mas também sua postura. Estava entregue, era um grande e patético imbecil.

Tirei silenciosamente duas adagas da cintura segurando uma em cada mão, e me esgueirei entre as sombras esperando com isso poder ver melhor o que o inútil curandeiro do príncipe observava tão apavorado.

E então vi sua espada deixar rastros de luz em meio às sombras, como pontos incandescentes em meio ao breu.

Assim também eram os olhos do príncipe. Duas fendas prateadas e mortais em meio à escuridão.

Illián desviou de um golpe que certamente o mataria justo quando um dos Trolls decidiu que era hora de colocar um fim no que aos olhos de qualquer um pareceria uma luta injusta.

Observei aquela criatura horrenda e maldosa de quase quatro metros de altura enquanto tentava pensar com rapidez em todas as possibilidades. Eu tinha um metro e sessenta e dois e pesava infinitamente menos do que aquela coisa, isso queria dizer que me movia mais rápido e isso queria dizer que teríamos uma chance... Não teríamos?

Fechei os dedos ao redor das adagas e dei um passo silencioso e preciso na direção daquele ser imenso que agora se dispunha a esmagar Illián como se fosse um inseto. Foi então que Amis saiu do esconderijo, correu em direção a imensa criatura e injetou em suas pernas uma espécie de liquido amarelado causando um breve momento de distração onde:

Noite eterna (Livro 1) Onde histórias criam vida. Descubra agora