Capítulo XII - Ocupações de primavera na Aldeia

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Tudo estava tranquilo na semana seguinte, a neve já derretia e os primeiros sinais da primavera já podiam ser notados. No pico de uma montanha brotara um pequeno pé de rosa, que se enroscara numa pedra grande à medida que ia crescendo. Os primeiros raios de sol sempre iluminavam aquela planta que estava banhada pelo orvalho matinal, fazendo com que as gotas refletissem um azul anil na grama verdejante.

A primavera geralmente inspirava as pessoas, porém, para Kyrah não havia época do ano mais irritante. Ela preferira sempre o outono, pois era um bom tempo para as batalhas; na primavera era época de plantar, e não havia tarefa mais entediante (além de tecer) do que plantar trigo.

As filhas do chefe não eram tão cobradas nesta tarefa, porém, tinham que ficar na aldeia vazia, pois todos os outros aldeões iam para o campo, até mesmo os bardos. Numa manhã, lá estavam as três, olhando para o nada, na varanda. Até Una estava aborrecida. Era um dia cheio de calor e elas se abanavam com o leque. Mais meia hora de tédio e Berna pulou a mureta.

— Aonde você vai? — perguntou Una, modorrenta.

— Entre plantar e ficar aqui apodrecendo eu prefiro a enxada. Quem sabe eles nos dão sementes para jogar nos buracos; é mais fácil.

Quando Berna se retirou, Kyrah olhou para Una pensativamente e se levantou, ao que Una exclamou:

— Você também vai me deixar aqui sozinha, prefere sementes a mim? — num drama típico de gato abandonado.

— Eu não vou plantar, vou para a cachoeira, já que não tem ninguém lá... — pensou um pouco e exclamou, mais para si — Provavelmente, espero eu... — ela tinha alguma coisa em mente, e corou. — Hoje está muito quente! — disse, se abanando. Entrou dentro de casa e logo saiu em direção à floresta, com seu arco e flechas.

Raios de sol faiscavam nos borbulhos das cascatas. Kyrah, com um sorriso de satisfação, foi se aproximando pela margem do rio, os olhos fitos na cachoeira. Não olhava pra baixo, por isso não viu o "pequeno" obstáculo debruçado no riacho. Tropeçou nele e foi cair uns metros adiante.

— Quem foi o maldito... — rugiu Beowulf, levantando, a barba pingando água. — Ah, princesa... Não a vi chegar — ele mudou o tom.

— Me admiro eu não ver uma pedra desse tamanho — retrucou ela, repentinamente bem-humorada, levantando-se com cuidado.

— Você tá legal? — perguntou o Urso, correndo a auxiliá-la.

— Sim; não me machuco à toa. Só me dói um pouco o braço — respondeu Kyrah, tocando o antebraço esquerdo e fazendo uma careta de dor.

— Já passa, você vai ver — ele tocou o braço dela, massageando-o com delicadeza surpreendente para tamanho... tamanho! Enquanto isso puxou assunto — O que está fazendo aqui, Kyrah?

— A aldeia estava uma droga — retrucou ela. — E você? Devia estar plantando.

— Meu sonho! — ele riu, debochado. — Eu arranco cabeças, não ervinhas.

— É bem melhor — ela riu também. — E está melhor — completou, tendo alguma dificuldade em libertar o braço das mãos dele. — Obrigada.

— Foi um prazer. O que vai ficar fazendo na temporada de plantio?

— Fugindo do trabalho — respondeu Kyrah, jogando-se no chão com uma risada.

Mas nem todos eram assim. Com efeito, quase toda a aldeia estava na lavoura. Berna, chegando lá, procurou por alguém que conhecesse. Perto das sementes, encontrou Gabrielle. Era uma franca, sequestrada por um dos guerreiros naquela guerra em que Tristan quase perdeu a cabeça (literalmente). Já tinha se adaptado à aldeia (adaptava-se a muitas coisas) e pegara amizade com as filhas do chefe. Na verdade fora fácil se adaptar, porque ela se apaixonou por seu raptor, um rapaz loiro de olhos azuis de apelido "o Tímido".

Uma História Bárbara [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora