10 - Lola

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Na segunda feira, encontrei Helena no lugar de sempre para irmos à escola. A conversa fluiu normalmente, como sempre, e não mencionamos nada que remetesse aos últimos acontecimentos. Passamos pelo cemitério sem olha-lo e continuamos nosso caminho.
Assim que chegamos na escola, Helena entrou no corredor, indo direto ao seu armário pegar o material da primeira aula. Segui até o final do corredor, virando a direita, a caminho do meu. Ao abri-lo, lembrei, feliz, que a primeira aula era de física. Isso fez com que eu ficasse ainda melhor.
Já tinha pegado minhas coisas, fechado o armário e me dirigia a sala quando um menino com um dreads, alto e magro disse com uma voz grossa:
-Você é a Lola Murray?
Assenti sem reconhecê-lo.
-O diretor quer você na sala dele agora. E é pra você levar uma tal de Helena - disse se afastando logo em seguida.
Decidi procurar Helena o mais rápido possível para dar tempo de assistir a aula. Encontrei-a no bebedouro, no final do corredor.
-Helena, o diretor quer ver a gente - disse assim que cheguei perto.
-Por que? - ela disse limpando a boca molhada.
-Não sei. Um cara que me falou. Mas vamos logo. Minha primeira aula é física.
-Não sei como você pode gostar disso - ela disse, virando os olhos - Vamos logo então.
Chegamos a secretaria e a mulher sentada atrás da mesa disse que ele já estava a nossa espera. Assim que entramos, o diretor Terence estava de costas. Nos acomodamos nas cadeiras de costume e esperamos.
-Meninas - ele disse, com a voz e a expressão firme,virando-se. Sua careca brilhou. Olhou para mim. - Tiveram boas manhãs desde nosso último encontro?
-Sim - disse, estranhando a pergunta.
-E as tardes? Foram agradáveis? - ele disse ainda sem mudar o tom de voz, olhando agora para Helena.
-Foram... divertidas - disse Helena, cautelosa, franzindo o cenho.
-E vocês fizeram o que? Posso perguntar? - ele disse agora alternando os olhares entre nós.
-Ãh, nós.. saímos e.. ficamos com nossos pais e.. andamos de bicicleta, talvez - disse Helena, visivelmente confusa. Afinal, onde ele queria chegar?
-Hum - ele disse se encostando na cadeira e suavizando um pouco sua expressão. - Vocês não esqueceram de nada? Um compromisso talvez, com hora marcada? Em um lugar como a escola?
Droga.
-A detenção - disse Helena baixinho.
-Ah sim, a detenção - disse, com ironia - Que bom que vocês lembraram. Pena que seja tarde demais.
Ele se levantou, deu a volta a sua mesa e parou atrás de nós. Viramos para olha-lo.
-Vocês sabem que não são santas. Causaram muitas coisas por aqui e eu sempre tento ajudar como posso. Não gosto de ver os alunos dessa escola na detenção ou suspensos, mas as vezes, é a única maneira. Vocês sabem quantas vezes já ficaram aqui depois do horário melhor que eu, só que dessa vez, será diferente. Vocês duas estão suspensas por uma semana.
-Suspensas? - eu e Helena dissemos alto.
-Vocês pediram por isso - o diretor continuou sem alterar a voz dura e a expressão seria. - Não aparecer durante uma detenção geralmente só gera outra detenção. O sr. Steel apareceu aqui na sexta feira dizendo que vocês não compareceram nenhum dia da semana passada e me cobrou punições mais sérias. Então, essa é minha decisão.
-Diretor, mas foi apenas uma semana. Já comparecemos a tantas outras.. - Helena começou a argumentar, mas ele disse mais alto.
-Como eu disse, a escolha foi de vocês. Preciso que as duas assinem depois de lerem. - ele disse voltando a sua mesa, passando um livro grosso para nós. No topo da folha, estava escrito "As alunas Helena Smith e Lola Lancaster Murray estão suspensas por não comparecem a quatro dias de detenção. As alunas já tem um histórico de detenções e a suspensão está sendo aplicada na esperança de que as senhoritas se atentem as suas responsabilidades e permaneçam longe de qualquer tipo de confusão. A suspensão deve ser de sete dias a partir da data de hoje."
Olhei para Helena. Ela suspirou e pegou a caneta que o diretor lhe oferecia. Depois de assinar, me passou a caneta e fiz o mesmo
-Seus pais já estão sendo avisados - ele disse enquanto guardava o livro na gaveta e a caneta no porta-caneta -Bem, é isso. Eu realmente espero que essa suspensão faça vocês pensarem nas suas responsabilidade. Vejo vocês semana que vem - ele disse indicando a porta a mão.
Peguei minha mochila que estava no chão e me dirigi a porta. Helena já havia saído. Nem nos damos o trabalho de olhar para a secretária.
Assim que fechei a porta da secretaria, o sinal anunciando a primeira aula tocou. Os alunos passaram correndo e logo o corredor ficou vazio. Fui andando até meu armário guardar o material.
-Não acredito que esquecemos a detenção - Helena disse andando ao meu lado.
-Eu também não. Apesar das detenções, nunca fomos suspensas. - disse olhando para ela.
-Eu sei. - disse olhando para baixo - Mas tínhamos tantas coisas na cabeça.
Eu suspirei.
-Pois é. Tudo isso por causa dos sonhos, do cemitério, do menino bode.. Não acredito que vou perder as aulas de física - disse chegando ao meu armário e guardando meu caderno e o livro, fechando-o logo em seguida, caminhando agora para o armário da Lena.
-Murray, para de pensar na física. - ela disse séria, me fazendo rir. - Você ainda vai ter muitas aulas pra assistir e muitas olimpíadas pra fazer.
-Claro. Eu recupero. - disse fazendo minha melhor cara orgulhosa. Foi a fez de Lena rir.
Quando chegamos no armário dela, ela jogou seus livros e cadernos de qualquer jeito, colocou algumas coisas na mochila e bateu a porta.
-Quanta organização - disse, referindo-me ao seu armário, enquanto andávamos para a saída.
-Você me conhece Lolinha. Não tenho paciência pra arrumar aquilo.
-Claro que não. Mas vai arrumá-lo? - disse enquanto já saíamos do prédio da escola, indo em direção a rua.
-Não né. Se não arrumei até hoje, acha que ainda vou arrumá-lo?
-Droga, achei que a suspensão seria um ótimo pretexto - disse ironicamente.
-Apenas em sonhos Lolinha. - ela disse fazendo cara de mau, enquanto eu ria.
Continuamos a conversar e Helena me chamou para ir a sua casa passar a tarde, já que eu ficaria sozinha na minha. Então eu fui.
Assim que adentramos a casa, Helena chamou pela mãe, mas não obteve resposta. Coloquei minha mochila do lado da porta e avisei que ia a cozinha beber água. Enquanto isso, Helena subiu as escadas em direção aos quartos.
Fui para a cozinha e peguei um copo no armário, indo em direção a pia para enchê-lo, encontrando ali algumas louças para serem lavadas. Aquilo era estranho, já que desde que conheço Ebbie, ela nunca deixava a cozinha suja. Talvez ela não estivesse em um dia bom.
Enquanto bebia a água, ouço Helena gritar.
-MÃE! MÃE! LOLA! - ela gritou mais alto.
Larguei o copo em cima da pia e subi as escada correndo, entrando no quarto da Ebbie, encontrando-a caída no carpete, mais branca que o normal.
-Ebbie? - disse, abaixando ao seu lado. Seu peito subia e descia sutilmente - O que aconteceu Lena?
-Não sei Lola, chamei por ela e nada. Fui até o ateliê, mas ela não estava lá. Aí encontrei ela aqui - ela disse arrumando a cabeça de Ebbie em seu colo da melhor maneira possível.
-Vou chamar uma ambulância - disse me levantando e indo até a janela.
-911, qual sua emergência? - disse um homem assim que levei o celular ao ouvido.
-A mãe da minha amiga tá desmaiada e a respiração dela tá muito fraca.
-Faz muito tempo que ela está assim? - disse ele, com a voz mais neutra possível.
-Não sei, encontramos ela agora, mas não sabemos há quanto tempo ela tá aqui.
-Certo, qual o endereço?
Passei o endereço à ele.
-Já estou enviando uma unidade para este endereço. O tempo estimado é de até 15 minutos
-Quinze minutos? Mas isso é muito tempo. Não tem como ser mais rápido?
-Sinto muito moça. - ele disse - É tudo que posso fazer agora. Ah, e evite mexe-lá. Não sabemos o que aconteceu.
-Certo. Obrigado - disse desligando o celular. Assim que me virei, a campainha toca. Franzi as sobrancelhas.
-Ótimo momento - Lena disse com a voz carregada de ironia.
-Eu vejo quem é - disse à ela, que concordou com a cabeça. Desci as escadas rapidamente e abri a porta.
-Menino bode?

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