Foi numa terça-feira ensolarada que recebi a sua visita. Tão pequenina a joaninha que pousou em minha mão. De forma tão natural, me pareceu que ela havia esperado o dia todo justamente para me encontrar ali, sentada no estreito banco de madeira em frente ao lago calmo do Parque dos Macaquinhos, a quilômetros de distância da minha cidade natal.
Com a palma da mão estendida, observei a delicadeza da pequena criaturinha, que parecia me encarar de volta com seus diminutos olhos. Seu corpo era de um tom laranja avermelhado, assemelhando-se ao por do sol nas noites serenas de outono. Suas pintinhas pretas me lembravam os pingos dos is que eu costumava escrever quando era mais nova, em formato de bolinha ao invés de pingos. A joaninha era repleta de bolinhas, de tamanhos e formatos irregulares, exatamente como a escrita de uma criança.
Num ímpeto momento de puro egoísmo humano, a quis para mim. Desejei com todas as minhas forças levá-la para casa e tratá-la como um animal de estimação. Não suportava a ideia de devolvê-la à natureza, por mais acolhedor que fosse o ambiente, e ignorar aquele pequeno encontro do destino. Ela esperava por mim. Talvez eu também esperasse por ela.
Talvez eu ansiasse, ainda sem saber, por seu leve toque em minha pele, por sua sutileza, sua delicadeza simples e profunda. Mais que isso, talvez eu aguardasse sua companhia. Sentada no banco, não estava mais sozinha. Meu dia, enfim, havia valido a pena.
Em meio aos meus devaneios, enquanto contemplava a pequena perfeição da natureza que pousara em minha mão, senti suas patinhas minúsculas se moverem. Num piscar de olhos, a joaninha correu até a extremidade do meu dedo e levantou vôo, se afastando para longe, até se perder no horizonte.
Contudo, compreendi, no exato momento em que seus olhinhos encontraram os meus. Ela era livre. E livre continuaria sendo. Ingênua eu, que imaginei, sequer por um segundo, que poderia tê-la para mim.
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Marcas Indeléveis - Crônicas
Non-FictionColetânea de crônicas extraídas do blog: marcasindeleveis.blogspot.com.br. "Tudo deixa marcas, meu caro leitor. Bem ou mal, inefável ou não. Estamos o tempo todo sujeitos ao registro de nossas vidas. As marcas em nossas peles, os respingos de chu...