C.7

105 2 0
                                    

(viqsão de Theodor)

Algo mais está na sala, parece um tipo de ruído. Mas um ruído estranho, de um animal talvez... Não sei ao certo. Logo depois ouço o som de passos, bem firmes, porém com certeza os pés de "seja lá quem for" estavam descalços. Não há som de calçado algum.
Após caminhar calmamente até mim ele se aproxima novamente e:
- Olá - pigarro - olá...
- Outra pessoa? Graças a Deus! Por favor, eu não sei o que está acontecendo! Me ajude a sair daqui. Por favor! Eu imploro
- Eu até posso te tirar daí... Mas você vai ter que implorar mais um pouquinho... - o desejo era algo incontrolável em sua voz.
Sem pensar em alternativa, eu então implorei:
- Eu imploro! Imploro sim! Imploro pelo amor de tudo que há de mais sagrado... Eu imploro. Eu juro que se você me tirar daqui eu não cobro nada à ninguém o que houve! De verdade! - dei uma pausa para ver se minha agonia e sofrimento já haviam suprido seu desejo. Sem resposta alguma eu continuo - Só... Só por favor me tira daqui...
Coloco minhas mãos enlameadas sob meu cabelo. Alisei-o por completo umas cinco ou seis vezes de ansiedade provavelmente
Não mais acreditado que haveria a mais remota chance de sair dali, começo a pensar nas coisas que gostaria de fazer... Gostaria de ficar bêbado, ficar chapado, ir ao túmulo de minha mãe (esse último principalmente...) Quem sabe arranjar uma namorada legal, ter uns 2 ou 3 filhos. Ir ao parque de vez em quando. Mas não adiantaria de nada mesmo pensar nas possibilidades já que, afinal, eu seria privado disso.
Ouvi mais um pigarro e então senti como se o tal do dono do cativeiro tivesse se sentado bem a minha frente. Meus pensamentos mudam de repente, como se aquele fiozinho de esperança tivesse brotado do chão
- Agora sim... Você até que é bom nisso sabia? Já vi muitas pessoas que imploravam bem pior sabia ceguinho? Elas começam a falar das suas de suas vidinhas medíocres e sem graça, dizendo o que gostariam de fazer antes de morrer... Mas ora, se eles queriam tanto assim, por que não o fizeram né? Afinal, se não tivesse sido eu, poderia ser um ônibus, uma alergia severa, um incêndio... ou qualquer coisa assim. Pessoas são muito ingratas.
Fiz uma cara de surpresa, não entendi ao certo se ele realmente pensava isso ou se falava por saber o que eu estava pensando.
Até que ele tinha razão. As pessoas sempre agem como se a vida fosse durar pra sempre, mas não é bem assim... Revi meus pensamentos e me deparei com uma grande hipocrisia: nunca havia feito nada para ver o túmulo de minha mãe. Absolutamente nada. Nunca havia nem mexido um dedo se quer para ir vê-la. Isso me fazia uma pessoa ruim?
Infelizmente fui cortado dos meus pensamentos quando ele lançou uma pergunta que me deixou com nó no estômago:
- Não está preocupado com a menina? Não fez nenhuma pergunta...
- Daniela...? - então me sinto apavorado ao imaginar um mundo sem ela. O que, pra mim, era impossível

(Visão de Daniela)

Vejo então Bruna se retirando da posição e indo ao final da sala, acho que ela já sabia o que aconteceria agora. Eu estava com um frio na barriga inexplicável.
Todas as meninas saíram e foram em uma direção, eu fui a última.
Mike então se dirige única e exclusivamente para Gabriel:
- Gabriel apresente a ajuda. - ele disse firme e forte. Como se estivesse bravo com a minha presença naquele local que parecia ser sagrado para ele.
- Ajuda se apresenta por: Daniela. Idade: 15 anos. Não tenho conhecimento de suas origens... Se apresente ajuda - e passou a palavra pra mim.
- Oi gente... Ér... Eu sou a Daniela e... - Mike não me deixou acabar de falar e interrompeu.
- Gabriel, tu sempre tem que foder o grupo inteiro? Cadê a Regina? Ela sim sabia dos rituais, do lema, e de todo resto. Quem caralhos é "Daniela" em? Sem querer ofender. - disse meu nome em tom de deboche e olhou pra mim um tanto quanto bravo.
- Pega leve com ela Mike. A Regina quer começar o próprio grupo de justiceiros, acha que pode ajudar mais que a gente. Chama-se "ignorados", pouco criativo eu sei... Irritado eu larguei ela e pedi pra que nunca mais apareça aqui. Ninguém se mete com os Problemáticos. Nós somos demais e não vamos nos deixar vencer por eles né gente?
- E deixa eu adivinhar como uma completa estranha veio parar aqui: na clínica do seu pai ela apareceu desamparada e você ficou com dó. Provavelmente não era um incidente grave, um braço machucado ou uma queimadura de panela, algo assim... Você então perguntou se ela queria aventura e ela está agora aqui. Única e exclusivamente por que você se sente triste no dia em que vamos fazer algo que tem que ser em dupla né? - David então corta Mike.
- Vai com calma com o cara Mike, a Daniela não tem cara de espiã ou algo assim, ela é fofa. Oi Daniela, eu sou David.
David saiu então de sua posição e veio até mim. Seu blusão rosa claro com a escrita "problemáticos de plantão" bem pequenininho no canto me distraiu por alguns segundos. Em seus pés havia um sapato social marrom bem escuro. Também usava uma calça jeans um tanto quanto desconfortável na minha opinião
- Fofa? Cuidado por que quando necessário, eu mordo - eu estava estressada com a situação.
- Relaxa, não precisa ficar brava justo comigo baixinha, eles vão ficar discutindo ali um bom tempo... Mike e Gabriel é tipo amor e ódio, só que mais a parte do ódio... Deixa eu te apresentar o pessoal
- Tá olhando muito pro meu namorado, gostei não! - Miguel disse irônico - pode tirar as mãos desse lindo - nisso segurou o queixo de David e deu um selinho.
Miguel usava uma blusa xadrez vermelha e azul, uma regata branca, uma bermuda vinho e um chinelo dos Minions. Ele parecia o mais confortável de todos.
- Miguel, fica calmo amor. Tá constrangendo a menina, coitada. Esse é o Miguel, como você pôde observar, nem deve ter reparado ele é meu namorado.
- E por que vocês não usam aliança? -questionei quase que sem querer.
- "Nada de joias nos rituais babacas que eu criei" - Miguel então debocha do líder.
- "Nem meninas bonitas, por que elas podem roubar o brilho do meu cabelo vermelho maravilhoso" - completei a fala. Bruna apareceu do meu lado colocando sua mão esquerda em meu ombro direito:
- Essa é das minhas. Zoando o líder de primeira? meu Deus, eu já te amo viu? Vem comigo - me puxou levemente pela blusa - vou te apresentar pra meninas. Você não quer conhecer os meninos. Eles são uns chatos.
David então disse:
- Bruna para de ser retardada e deixa eu apresentar ela pra todo mundo vai...
- Cala a boca que eu dou uns pega no seu namorado em David - fez um biquinho muito engraçado e mandou beijo pro Miguel, que logo retrucou:
- Da sua boca só quero as palavras "quer ser meu padrinho de casamento?"
- Isso mesmo, acho bom viu dona Bruna. - Ângelo disse em tom de sarcasmo - Ainda bem que não vamos fazer aquele ritual ridículo com vocês meninas... Foi mal mesmo por tudo Daniela, eles são assim mesmo. Agora que você entrou nessa maluquice vai ter que participar, o Mike não vai deixar você sair daqui tão cedo. Acredite, a gente tentou.
Pensei um pouco e me deparei escolhendo entre sair correr ou entrar de cabeça:
- Aventura né? "Iupe" - optei por ficar, afinal, pra onde mais iria?
Logo atrás de Bruna surge o Leon em seu traje formal (camisa social e calça jeans clara). Ele então da um sorriso pra mim, fez uma pausa para respirar e disse:
- Tu num viu nada do que o Mike é capaz de fazer. Os escândalos que ele dá e às vezes ele até inventa de quebrar as coisas. Ele é assim temperamental todos os dias. Vou te ajudar a se enturmar por que eu tô vendo que tá mais perdida que qualquer uma que já apareceu aqui - deu uma risadinha sem graça - Não vai ser fácil viu? As meninas não costumam gostar das novatas, só sorria e acene.
- Já ouvi essa fala em? - saiu ao automático pela minha boca, mas pra minha sorte, caíram na risada.
Todos os meninos (exceto Mike e Gabriel, que estão conversando) e Bruna se juntam a minha volta e então Miguel quebra o gelo:
- Vem cá, tem lugar pra passa a noite não né? Já avisou seus pais que tem que dormir fora?
- Na verdade eu nem sei onde é "aqui" exatamente - tentei ignorar a parte dos "pais".
- Que triste mocinha, mas depois você me explica isso direito por que hoje a gente dorme na casa do David. Mas sério, relaxa. Ele é rico tem uns quartos grandes. Inclusivé, ele que "financia" essa baboseira toda... Enfim, esses são os horários - ele esticou a mão com um papel - Vai precisar, confia em mim. E mais uma coi...- foi então cortado pelo forte tapa que Mike deu na cara de Gabriel, o barulho estrondoso o fez doer até em mim.
Todos ficaram em silêncio e imóveis, esperando apenas que a briga continuasse para que pudessem apartar.
Gabriel surpreendentemente não devolveu. Apenas se virou pra trás e fingiu andar até o outro lado.
Mas em seguida deu meia volta e segura Mike pela gola de seu longo sobretudo preto, o tira do ar e dá uma cabeçada que o deixou no chão. Caído.
Todos ficaram perplexos mas nada que não fosse esperado. Ainda ganhando, Gabriel da um soco em sua cara enquanto segura suas mãos para trás.
Quando parece que vai bater ainda mais nele, saio correndo já que ninguém mais parecia ter reação.
Seguro o punho fechado de Gabriel e olho em seus olhos.
- Me solta Daniela, não é da sua conta isso. Não o-defenda, ele não faria igual.
- Já deu uma puta cabeçada nele Gabi... Não faz isso não. Não bate mais nele. Ele vai morrer se tu bater nele já que você é tão forte - disse jogando charme.
Ele tirou o braço da posição em que iria soca-lo, olhou pra mim, suspirou até que aliviado, me ajudou a levantar e então solta:
- Salvo pelo gongo né Mike, como sempre.
Mesmo no chão, responde meio grogue:
- Sempre né parceiro!
Tiraram então Gabriel de perto do amigo e eu apenas o observei deitado no chão.
- Nossa! - fiquei perplexa - seu nariz... Ele meio que tá sangrando. Que horrível! Deixa eu te ajudar com isso.
- Sai! não preciso da sua ajuda e digo mais... - impedi que continuasse a falar asneira colocando a mão na sua boca.
- Deixa de marra, eu só quero te ajudar tá?
Ele me olhou desconfiado e tentou se sentar no chão apoiando a mão na mesa de centro marrom surrada
Vitória me empurra propositalmente para chegar até ele e diz:
- Tá tudo bem Mike? O que ouve ? Vou matar o Gabriel! Quem ele pensa que é? O dono?
- Por favor, faça isso. Que atitude de criança - olhei para ele do outro lado da sala, desapontada.
- É você o motivo da briga sabia intrometida? E aliás Penélope, o que está fazendo aqui? - disse me olhando feio.
- é Daniela na verdade... - tentei corrigir da forma menos grossa possível - e como você tem a capacidade de perceber, eu estou ajudando quem estava contra mim, enquanto quem estava me defendendo está lá, do outro lado da sala.
Pude ver o sangue de seus olhos se acalmando. Deu um sorriso breve e sem dente para mim como quem diz "não tinha pensado por esse lado, me desculpe".
Mike então passa a mão no nariz afim de descobrir se ainda estava sangrando e...:
- Aí meu deus! É sangue mesmo gente! Alguém me acode aqui por que eu vou morrer! - por incrível que pareça, ele falava sério.
Me levanto e vou em direção a caixa de lenços de papel que estava em cima do sofá que estava encostado na parede. Pego três e caminho de volta para a minha posição inicial.
Dou uma estancada no sangue de seu nariz e percebo o quão frágil ele parecia naquele momento
Após seu nariz estar intacto novamente, saio de perto dele e deixo sob os cuidados de Vitória, já que na minha opinião eles eram um casal.
Procuro de vista o meu defensor para agradecer e o vejo sentado em uma cadeira similar a um banquinho de um bar, com as duas mãos na cabeça. Provavelmente triste por ter brigado com o amigo. Vou até ele e agradeço:
- Obrigada por me defender. Significou muito pra mim... Quase ninguém nunca fez isso antes.
Ele tirou as mãos do rosto e as colocou nas coxas. Se virou pra mim e sorriu
- Sem problemas, apenas não gosto de injustiças. Você parece legal e eu te meti em uma enrascada só por que levei um pé na bunda dois dias antes de um ritual em dupla. Me desculpe Dani. Eu fui um babaca
- Não tem problema lembra? Aventura foi o que me prometeu e olha só? Consegui pelo visto. - ele me olhou agradecido e nos juntamos ao pessoal na rodinha que estava do nosso lado
Quando me sentei, as meninas me olharam feio. Não liguei muito, demoraria para se acostumarem comigo já que pelo visto, eu teria de ficar.
Jogamos conversa fora até que pergunto ainda meio tímida:
- Nós ainda vamos pra casa do David?
O dono da casa se manifestou:
- Bora lá né! Se esse manezão aqui não se meter em mais confusão - deu um tapinha de leve na testa de Gabriel ao dizer "menazão" o que me fez rir e repetir o ato com a fala:
- Ele não vai, né manezão?
- Prometo que não vou galera.
Demos uma risadinha e nos levantamos, a saia de Bruna estava toda suja por conta da poeira em que havia sentado, resolvi dar um toque para que não fosse zoada pelos garotos.
- Bruna... Sua saia está meio suja, acho melhor limpar antes que ele debochem de ti
- Obrigada por se preocupar! - ela respondeu.
Deu umas batidinhas de leve no bumbum e depois me olhou e disse:
- Obrigada por avisar... As meninas daqui não são muito minhas fãns digamos assim. Ângelo sempre fala que é inveja, mas eu não vejo motivo para tal sentimento.
Eu iria contraria-la, dizer algo tipo "você tem um namorado lindo, é maravilhosa, simpática... Eu vejo muitos motivos na verdade", mas Miguel chegou antes que eu pudesse pronunciar qualquer coisa:
- Vamos logo suas bobinhas, estão atrasando o grupo. Bru, chama os pombinhos apaixonados ali? - apontou para Mike e Vitória.
- É pra já!
Ela foi até os dois e deu um cutucão em cada um. Falou algo que fez eles rirem e levantaram. Nos juntamos então em uma espécie de rodinha e estávamos prontos para ir

Diferenças Onde histórias criam vida. Descubra agora