Não quero ir pra escola. É sempre a mesma coisa. Professores chatos, matérias que eu já sei.
Se bem que tem a Cat... ela é minha melhor amiga, e eu realmente gosto dela. Só que, desde que aquele garoto chegou, bem, ela não fala de outra coisa.
Tudo começou na quinta-feira da semana passada. Estava chovendo, e bem frio. Eu e a Cat estávamos trocando bilhetes com piadinhas, enquanto o professor explicava equação de segundo grau. Não me leve a mal por não prestar atenção na aula, eu sou um ótimo aluno, é que eu já sabia.
Bateram na porta, e a coordenadora entrou, seguida por um garoto ruivo bem desconfortável.
- Aqui é o nono ano B, certo? - a coordenadora me perguntou. Eu fiz que sim com a cabeça. - Olá, nono B - ela continuou, agora para a sala toda. - Esse é o Liam. Ele vai estudar aqui agora.
O garoto ruivo, Liam, acenou.
A coordenadora se despediu e saiu, enquanto o professor designava eu e Catarina para "tomar conta" de Liam.
- Liam, sente-se ali, ao lado de Kevin, o magrelo loiro ali - o professor me apontou -, e da Catarina, aquela menina de olhos pretos.
Isso foi uma péssima descrição da Cat, ela é muito mais que "aquela menina de olhos pretos". Para começar, não existem olhos pretos; o único preto que tem é a pupila.
- Professor - eu levantei a mão -, não existem olhos pretos, o único preto que tem é a pupila.
O professor me encarou mortalmente.
- Como eu dizia, Liam, sente-se do lado daquele sabe-tudo.
Disfarçando um sorriso, Liam puxou uma carteira entre a minha e a de Cat, nos separando.
- Oi, eu sou o Kevin, o "magrelo loiro sabe-tudo" - me apresentei, fazendo aspas com as mãos.
- Suspeitava - o ruivo achou graça. - Eu sou o Liam, dã, e você deve ser a Catarina - ele se virou para minha melhor amiga.
Só nesse momento eu reparei na expressão de Cat. Sério, dava pra ver corações nos olhos dela. Além disso, ela sorria como se o Natal tivesse chegado mais cedo, e mordia seu lábio inferior.
Só um idiota não perceberia que ela tinha caído por alguém.
- É, hehe, Catarina, mas você pode me chamar de Cat - ela disse, envergonhada e meio atirada ao mesmo tempo, se é que isso é possível.
- Certo, Cat - Liam tirou um caderno de sua mochila. - Eu não sei que matéria vocês estão aprendendo, poderia me emprestar seus cadernos?
Os olhos dela se iluminaram.
- Claro! E, hm, se você não entender a minha letra, pode tirar dúvidas comigo pelo whatsapp - ela abriu o caderno dele e escreveu seu número (que, por acaso, eu sei de cor).
- Mas como eu não entenderia sua letra? É linda - Liam passou a mão em cima de onde ela escreveu.
- Awn, jura?
- Caham - eu interrompi. - O professor está tentando explicar a matéria.
- Certo - Liam me respondeu, se voltando para o professor.
Cat me lançou um olhar mortal. Eu dei de ombros.
No intervalo daquele dia, ela mostrou a escola toda ao Liam, curiosamente evitando todas as suas amigas. Mas eu não, ela me arrastou o percurso todo.
Quando o sinal tocou, no começo da tarde, Cat se despediu de Liam e fomos andando para casa. Por acaso, moramos em casas vizinhas, na mesma rua, na mesma calçada, com a diferença de dois números.
- E então, o que você achou do Liam? - ela me perguntou.
- É - respondi. - Serve.
- Afe, Kev - ela riu.
Na madrugada de quinta para sexta, ela me chamou no whatsapp.
Catie: KEVV
Kevin: que foi, cat? Vai dormir, menina, são três e quarenta e sete e amanha tem aula
Catie: vc tbm ta acordado :p
Kevin: fala logo, to jogando
Catie: O LIAM ME CHAMOU ISNDKSNDOSBDISBDISNDOABDOABDOAHD
Kevin: vish, esse lesk n dorme n?
Catie: n foi agr, ne, seu loco
Catie: só to te contando agr
Catie: oliaaaaaaaaa
Catie: (imagem)
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Kevin: scr cat
Kevin: quanto print
Kevin: vou ler, pera
Eu não li.
Kevin: e daí?
Catie: ELE NÃO É UM AMOR? KDNDKANDIABDIANDIAND
Kevin: vc n ta bem
Kevin: ja tomou os remédios?
Catie: af kev, para
Kevin: e pq vc salvou o numero dele como "Liam aka ♡"?
Catie: pq será ne
Kevin: como ta meu nome aí?
Catie: kevin, ue
Catie: qria oq, kev aka bff?
Catie: isso não vem ao caso
Catie: como eu faço pra ele me notar?
Kevin: mata azinimiga
Catie: ta jogando yandere agr, n tá?
Kevin: to
Catie: af, isso é jogo pra garota
Kevin: vc n joga
Catie: pq eu n qro
Kevin: mas eu qro
Catie: DE QUALQUER FORMA
Catie: como eu faço ele saber q eu gosto dele sem falar p ele?
Kevin: continua se atirando desse jeito que vai dar certo
Catie: nss
Catie: vou dormir q isso aí é ciumes kdndksndnsndn
Kevin: ce q pensa
Kevin: boa noite
Catie: bjs
E está sendo assim desde a quinta-feira passada. Ela contou sobre o Liam para as amigas dela, mas nem elas aguentaram, então elas meio que brigaram. Não sei muitos detalhes.
E, em apenas sete dias, eu já impedi a Cat de mandar uma carta, de usar uma blusa no decote (de tão grande que era), de seguir o Liam até a casa dele e de ligar para aquele número do anúncio "trago seu amor em três dias".
Pois é, sempre que a Cat cai por alguém acaba sobrando para mim.
O lado bom é que ela não cai muito.
O lado ruim é que, dessa vez, ela não só caiu: ela se jogou, em algum abismo ainda mais profundo que o Tártaro.
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Snap out of it
Short StoryNão era uma queda, era um penhasco. ❝I wanna grab both your shoulders and shake, baby Snap out of it❞ 19.07.2017 → #43 em Conto