Capítulo 04

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A maior dor é aquela que te machuca lentamente, a que te destrói aos poucos e você não teve tempo suficiente de viver sem ela.

UMA SEMANA SE PASSOU desde o falecimento de vovô Jimmy, e eu lembro como se fosse hoje. Eu tive um sonho esta noite. Havia alguém, mas eu só via seus pés. Os passos eram largos, e na frente havia um abismo. A pessoa angustiada parecia tentar parar, mas algo a puxava para mais perto do fim. O fim se aproxima, e a escuridão também.

Quando eu acordei na madrugada, uma coisa engraçada que eu tinha notado era que, nesse sonho, diferente do que pensam, não é como se nele eu visse tudo perfeitamente bem, porque o meu subconsciente já estava acostumado em imaginar e ver as coisas da forma que a doença me propõe.

A história do Dr. Anthony e de Dave Collins, seu filho, ainda era uma incógnita para mim, mas que aos poucos eu estava entendendo, e de alguma maneira ficando cada vez mais próxima de qualquer tipo de relação que tive com Deus. Parecia que Dr. Anthony estava na mesma ideia que eu tenho quanto ao todo-poderoso. Caso Ele me prove sua existência, então eu acredito.

A madrugada era o momento mais aterrorizante para mim. Fiquei de pé e consegui chegar até a minha janela para abri-la. Olhei para o céu. Não via nada. Voltei para a cama e sentei na beirada dela, ainda observando a vista da minha janela. Eu sabia onde ficava a posição da janela, eu sabia onde ficava o céu, as estrelas e as nuvens. Eu apenas não podia vê-los.

Quando eu era pequena eu imaginava que cada estrela era uma pessoa morta. A única coisa diferente é que agora, além dos mortos, nem os vivos eu podia ver.

A noite é tão apavorante para mim que, mais uma vez, esperei o dia amanhecer para ter certeza de que ainda não estava cega, e aproveitei para ler algumas anotações quando amanheceu. Minha visão noturna é basicamente nula, então o dia é o meu presente, e a noite é o meu pesadelo.

– Bom dia Sky – Kaylee disse e jogou-se na minha cama. – Está com vontade de ir à escola hoje?

– Absolutamente não.

– É, nem eu. Mamãe disse que ligou para a escola e eles exigiram que nós fôssemos hoje, porque do contrário nos – ela pareceu pensar bastante na próxima palavra que usaria – pre.ju.di.ca.rí.amos nas provas que antecedem o verão.

Alguém bateu na porta, e logo depois tocou a campainha.

– Ding dong. – Kay repetiu – Vou abrir a porta.

– Pergunte quem é – gritei assim que Kay saiu correndo. E depois de alguns segundos voltou com suas pernas curtas até mim.

– É pra você.

– Quem é?

Ela sorriu baixo, e elevou os olhinhos para cima.

– Um menino alto, dos olhos mais bonitos, dos cabelos castanhos e bagunçados, que é lindo e que bateu num bandido por minha causa, ah e que vai ser o meu marido quando eu crescer.

– Luke?

– Ei! Pra você é Lucas – ela parecia brincalhona. Ou não, nunca sei quando ela fala sério ou não.

– Sim, senhora.

Fui até a porta, me perguntando se ele tinha me seguido ou algo assim, porque não é normal um estranho saber onde eu moro. Até que eu notei que o estranho já estava dentro de casa.

– Como nos achou?

– Bom dia também – a voz dele parecia mais rouca do que antes, e isso deixou ele mais bonito. Não que eu pudesse vê-lo completamente, era apenas uma idealização perfeita que eu tinha do estranho.

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