Capítulo 05

283 18 3
                                    


Depois de obrigar Awa a ficar quieta no próprio quarto até que lhe chamasse, Alexsander desceu para a biblioteca, onde Lungstalt havia servido para si mesmo uma garrafa inteira de vinho. As chamas da lareira acesa próxima reluziam pelas paredes quando o ruivo fechou a porta.

Já era quase noite, mas o cômodo estava estranhamente escuro. O tom alaranjado dava um ar caseiro apesar do silêncio.

― Julie se matou há seis dias.

― Aquela menina? ― Alexsander ficou surpreso, sentando-se na poltrona ao lado da do amigo.

― Sim. Não consigo... Há um tempo... Nenhuma energia duradoura.

O ruivo estranhou, encarando a face pálida de Franklin.

― Quanto tempo você tem?

― Quatro dias.

― Isso é preocupante. ― Não poderia mentir e dizer que não estava surpreso.

― Acha que eu não sei? ― O moreno estreitou os olhos, com um sorriso de escárnio comum nos lábios masculinos.

― E no que está pensando?

― Não apenas pensei, como vim aqui, tendo a certeza que você... ― Ele parou de falar. Conhecia Alexsander desde que o ruivo nascera. Era cento e quatro anos mais velho que ele. Velho o bastante para entender que, da maneira que os olhos azuis estavam fincados nos seus, completar a frase talvez fosse um risco de vida.

― Awa não é um alimento.

― Então você também está morrendo? ― A pergunta foi de uma malícia descarada, enquanto o bico da garrafa pousava nos lábios já vermelhos.

― Eu tenho um ano. ― Deu de ombros.

― Então ela não vai ser o alimento por um ano. ― E não fora uma indagação. Franklin dizia como se já visse o futuro.

― Ela nunca vai ser um alimento, Lungstalt. Se foi pra isso que veio-

― Eu vim pelos anos que nos conhecemos e porque sei que nunca deixaria um amigo na mão. Nossa amizade é como um contrato, não? ― O moreno sorriu, mas o ruivo continuava sério como um cadáver.

― Awa não faz parte desse contrato. ― Ele foi gélido, levantando-se no exato instante em que a porta da biblioteca se abriu, revelando a figura loira, vestida numa grossa camisola de lã que lhe cobria do pescoço aos tornozelos e mesmo assim, os orbes azuis faiscaram em direção aos dela.

― Que contrato? ― A loira sussurrou e Franklin não pôde deixar de rir, levantando-se também apesar da nítida expressão de "se afaste" do outro.

― Estávamos falando sobre as coisas que fazemos por amizade. ― Lungstalt explicou, calmamente, não compreendendo que Awa não era como as outras. Ela não era uma criança e não pensava como uma. O simples fato de ser tratada daquela forma lhe transformava em uma menina irritada.

― Eu estava falando com Alexsander. ― O sorriso nos lábios do moreno cresceu, conforme a expressão da loira se fechava ainda mais para que a mão delicada agarrasse a do ruivo e o puxasse para fora da sala.

Alexsander deixou-se ser levado e fechou a porta atrás de si, encarando a menina.

― Por que vocês estavam falando de mim...?

― Você tem uma imaginação muito afiada para quem só ouviu algumas palavras.

― Eu não gosto dele. ― Ela foi sincera, entrelaçando os dedos aos do homem, que deu o passo seguinte para abraçar o quadril delgado com a mão livre. ― Me trata que nem criança. E alguma coisa nos olhos... Ele é mau. Ele é muito mau.

Sentimento Solúvel - (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora