Capítulo Oito

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Nossa esperança estava voltando. Finalmente reabastecemos as garrafas. Decidimos que vamos passar a noite por lá mesmo, e quem sabe até alguns dias. Voltamos para avisar Josh e Bruce. Ele já estava melhor.
- Sou a favor de cada um contar um pouco de sua história. Quem está comigo? - Eu pergunto, erguendo o braço. Eles parecem não escutar, mas depois percebo que apenas me ignoram.
- Qual é? Gente, nós não sabemos de nada um do outro. - Eu falo tentando parecer amigável.
- Você está sozinha nessa, srta Curiosa. - Brooke diz. Eu faço uma careta de espantamento, porém sei que é verdade.
- Como vocês sabem, meu nome é Bruce. Meu sobrenome é Morris. Eu tinha uma família comum, pai, mãe e irmão. Todos se foram. Mas o importante mesmo é que eu tenho um pacote de Ruffles guardado. - Bruce fala. Eu dou risada. Ele tem um pacote de salgadinho guardado até hoje. Nunca encontrei nada industrializado. Não ainda. Penso que seria algo difícil, já que eu procurava não explorar nada depois da destruição.
- Sou Josh Irving. Acho que tenho a história bem parecida com a de Bruce. Nasci dia 17 de junho em 103 da Nova Fase. Tristemente todos se foram também. E infelizmente, eu não tenho um pacote de Ruffles. É isso. -Josh diz e em seguida, todos olham para Brooke.
- Não. Não vou seguir o exemplo que a Animadora ali, deu. - Brooke diz, levantando o olhar de um "ninho de mato" que estava criando.
- Não precisa ser chata, Brooke - Ryan diz, o que me deixa surpresa. Ele me defendeu de certa forma e ainda disse com um tom que dá a entender que conhece Brooke.
- Vai defender a sua nova amiguinha? Sabe qual é a diferença? Eu não preciso de ninguém para me defender. - Brooke fala e levanta em seguida. Bruce e Josh a acompanham. São seus amigos já faz tempo. Pelo menos, mais tempo que são nossos amigos. Eles saem, tropeçando em alguns galhos. Quando estão longe o suficiente, eu pergunto para Ryan:
- Vocês se conheciam? - Ele não precisa perguntar de quem estou falando.
- Ela morava comigo no orfanato. Nós éramos amigos... Não apenas amigos. - Ryan diz, olhando para baixo. Não demora um segundo para que eu caia na risada. Ryan e Brooke. É difícil imaginar isto. Por algum motivo, lá no fundo, isso dói.
- Ela era diferente, tá? - Ele tenta dizer, mas eu não consigo parar de rir. Por fim, ele acaba rindo comigo.
- E isso simplesmente acabou? - Eu pergunto depois de ter ficado um tempo me recuperando da crise de risada.
- Eu achei que ela estivesse morta. Não esperava vê-la. - Ele fala.
- Ela era como? Do tipo romântica? - Eu pergunto, sendo irônica.
- Acho que sim - Ele diz. Sua voz soa triste e eu paro de sorrir.
- Desculpa. - Eu falo me aproximando.
- Não tem problema. Foi engraçado. -
Ryan diz, abrindo um sorriso. Eu volto a rir para quebrar qualquer clima ruim e, ele volta a rir também.
- Eu não consigo imaginar a Brooke de agora com o Ryan de agora. - Ele diz. Acho que ninguém consegue, penso.
- Eu não consigo imaginar vocês juntos, tipo nunca - Eu digo, porém ele não me interpreta de um jeito grosseiro, como era de se esperar.
- Ah, então você está com ciúmes? Não acredito que Ella Baker está com ciúmes. - Ele fala dando risada.
- Não, é claro que não... -Eu tento dizer, brincando é claro, mas ele me interrompe. Não com palavras. Estávamos tão perto que não pensei ser possível nos aproximarmos mais. Mas ele me puxa trazendo-me para si. Por um momento, eu penso em me afastar, brigar com ele, dizer que aquilo não aconteceria. Mas esse momento não existiu. O beijo parece demorar dias e ao mesmo tempo, milésimos. Quando eu me afasto, percebo que Josh, Bruce e Brooke já estão aqui. Eu não sei o que dizer, então simplesmente não digo nada. Ainda sentada, eu me arrasto para perto de uma árvore, próxima de onde estou. Sinto um forte olhar sobre mim. Não de todos. De Brooke. Ela tenta fingir desdenho, mas acaba demonstrando sua euforia ao sentar tão lentamente. É possível imaginar o ódio que seu olhar contém. Eu não quero olhar, entretanto a curiosidade atrapalha meu desejo. Eu resolvo olhar fixamente para ela. Não quero parecer fraca. Ela vira o olhar imediatamente e se instala um clima chato e assustadoramente ruim sobre nós. Eu não ouso falar mais nada. Nenhuma brincadeira por hoje. Não mais.
Já está tudo escuro. O sol já se foi faz tempo. Algumas folhas voam com o vento e a areia fina irrita meus olhos. Os cabelos escuros de Brooke se esvoaçam. Seus dedos calejados permanecem inquietos e ela mexe os dois ao mesmo tempo, em uma sincronia estranha.
- Aqui também existem aquelas câmeras ambulantes - Brooke diz, o que me deixa boquiaberta. Talvez fosse isso que a estava deixando nervosa e fazendo com que ficasse inquieta. Ou talvez seja só uma mania horrível. Ela resolveu falar, e não foi para brigar comigo.
- Isso pode indicar que há pessoas aqui? - Eu pergunto depois de reunir todas as minhas forças e deixar a vergonha de lado.
- Pode. Mas elas podem ter sido colocadas ou alguém as abriu em outro lugar. Não temos como saber. - Brooke fala como se nada tivesse acontecido.
- Mas podemos seguí-las. Igual fizemos em Nova York. - Falo me virando para Ryan. Ele está sério. Na verdade, ele está normal.
- Não acho que seja seguro. Eu tô dentro! - Ela fala. Josh e Bruce se entreolham e balançam a cabeça em sinal de "sim".
- Então está combinado. Amanhã vamos partir atrás disso. Assim que o sol nascer. - Eu digo e todos concordam.
- Já estou com sono. Vocês não vão ficar acordados por muito tempo ainda, né? - Bruce pergunta. Respondemos que sim. Não há o que fazer.
As estrelas resolveram aparecer. Tão lindas. Eu me acomodo por ali mesmo, uso a mochila como travesseiro e uma blusa velha como coberta, apesar de não estar frio, longe disso. Brooke e seu grupo vão até outro ponto, não muito distante, mas algumas poucas árvores impedem que eu os veja.
- Ella... - Ryan fala e eu o impeço dessa vez.
- Eu quero dormir! - Falo, resmungando. Ele abre um leve sorriso e eu faço o mesmo. É claro que não estou realmente brigando com ele. Deitada apenas olho para o céu. Queria tanto descobrir o que há através dele. Não só o Novo Mundo que foi criado. Vários outros. Muitos outros. Talvez, um lugar onde nada esteja destruído, ao contrário, um lugar para recomeçar. Um lugar para viver novamente. Um lugar para realmente se viver. De repente Ryan invade meu pensamentos, do mesmo jeito que aqueles agentes vão invadir a terra. Nunca sabemos quando exatamente, porém já esperávamos de certo modo. Até mesmo antes dos avisos, nós já esperávamos que eles voltassem. Na verdade, viessem. Não voltariam para um lugar onde nunca estiveram. Penso que seria melhor eu ir dormir, pensar tanto está causando fome e não estou a fim de procurar algo para comer, mas Ryan insiste em me irritar.
- Ella! - Ele diz e eu me viro para o lado contrário, ignorando-o.
- Ella! - Ele fala novamente.
- Eu quero dormir. - Eu digo dessa vez mais séria. Ele levanta e vem até onde estou.
- Agora sei como eu era irritante. Me deixa! - Eu digo para ele.
- Não consigo dormir- Ele diz. Eu olho pra ele e sua expressão demonstra uma animação que nunca percebi.
- E? - Eu pergunto e ele já me puxa pelo braço. Sua mão áspera não desgruda de mim.
- Venha! Quero te mostrar um lugar. - Eu resolvo levantar, realmente não estava com sono. A empolgação dele me contagia e eu corro ao seu lado. Não me preocupo em ser silenciosa. Acho que finalmente nos entendemos.

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