Capítulo Nove

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– Sempre vinha aqui com... o pessoal do orfanato. – Ryan disse. Eu observava o lugar, atentamente. Era um parque. Não aqueles que possuem roda gigante. Era um parquinho. Aqueles que têm um balanço, agora, um pouco mórbido. O tempo e a destruição o deixaram feio. Não é muito convidativo, mas eu caminho até um dos balanços. Mesmo quebrado, destruído, de certa forma ainda resta um pouco dele. Não sei como sobreviveu a tantas bombas. Mas não foi só ele.
– Nossa! Que orfanato maravilhoso. Levavam vocês a viagem longas? – pergunto, desconfiada.
– Sim, eu tive "sorte". – Ele diz, me encarando de volta, um pouco receoso.
Respiro fundo. Ele não está sendo sincero. Não ainda. Porém, quem decide quando irá dizer certas verdades sobre si mesmo, é apenas ele.
– Vamos voltar? – Eu pergunto. Ryan fica pensativo. Por fim, ele me responde?
– Tao rápido? – Eu balanço a cabeça indicando que sim.
– Quero dormir – Minto. Ele percebe que não digo a verdade, no entanto, isso não me incomoda. Eu não preciso ser sincera com alguém assim. Voltamos tranquilamente. Todos aparentam estar dormindo. Volto ao lugar que estava antes, me acomodando. Ele se vira, apenas uma vez para me encarar. Eu olho de volta. Espero que ele "entenda" a minha raiva estampada no olhar, talvez. Viro rápido, sem vontade de o encarar novamente.
Os raios do sol já me irritam, mesmo fracos. Espero poder dormir mais, entretanto, alguém não está a favor desta ideia.
– Levante-se, preguiçosa. – Abro os olhos e vejo Brooke. Não esperava menos dela.
– Só estou cansada. – Resmungo. Levanto e retiro a areia do corpo.
– Não vamos andar muito. Apenas conhecer um pouco. – Bruce diz.
Brooke se senta de uma maneira esquisita. Calma e trêmula, ela começa a suar muito.
– Brooke? – Eu digo. Eu me aproximo e ela segura minha mão de um jeito extremamente forte. Josh aparece também.
– Ei! – Ryan diz. Ela está passando mal. Respirando fundo, ela parece ser forte.
– Eu vou melhorar – Ela fala mais para si mesma. Eu discordo.
– Você não está bem. Deveria ficar aqui. Deveríamos ficar aqui. – Eu digo, olhando em volta.
– Não! Tenho a sensação de que estamos sendo observados. – Ela praticamente grita.
– Sendo observados ou não, você gritando assim não ajuda. – Digo. Viro e uma dor no estômago me pega de surpresa, me fazendo suspirar.
– Desculpe – Brooke diz, me surpreendendo. – Parece que temos alguém com fome. – Ela termina de dizer. Ela está incrivelmente melhor. Ainda está suando um pouco, claro. Quando ela tenta se levantar, já nos colocamos a disposição de ajudá-la, mas ela recusa e levanta sozinha. Não que esteja nos ignorando ou sendo ingrata. Apenas quer mostrar ser maior que qualquer mal estar.
– É... – Digo, vermelha. Todos se olham buscando alguma resposta do que devemos fazer.
– Vamos buscar comida, certo? – Brooke fala revirando os olhos e sai esbarrando em Ryan. Não de propósito. Eu acho. Seguimos ela, e procuro qualquer árvore frutífera pelo caminho. O dia não está tão quente, algo ótimo. Algumas nuvens aparecem, mas estão claras, sem sinal de chuva. A areia arranha meu pé, mas não ligo. É umas das coisas que me fazem perceber desde um lugar destruído até a talvez sorte de estar viva. No final, não são coisas boas de se perceber. Bruce não para de assobiar, me deixando irritada. Até Josh revira os olhos. Assim que resolvo falar, alguém faz isso por mim.
– Fique quieto, ou vou pendurar você na primeira árvore que ver. – Brooke esbraveja. Ele parece surpreso, demonstrando estar distraído. Perdido no passado, talvez, no futuro. Algo mais difícil. Pensar no futuro é algo pior do que se pensar sobre o passado. A única coisa que temos certeza é de ficar neste mundo e algum dia morrer por causas naturais, ou morrer pelo Serviço de Inteligência Nacional. De um jeito ou de outro, o final sempre é o mesmo. Até antes do mundo supostamente acabar. Apenas o caminho é incerto. Não sei se amanhã alguém mais estará ao meu lado de um jeito bom ou ruim. Não sei se amanhã o dia se parecerá com o hoje, o agora, onde tudo está normal.
– Aqui – Brooke para de repente. Comida. Encontramos. Todos nós colocamos a serviço de retirar o maior número de maçãs. Subindo na árvore, balançando, arremessando alguns galhos. Abro a bolsa para evitar que caiam no chão. Após pegarmos quase todas, sentamos sobre o chão e matamos a fome. Claro, com um pouco de água. Não é o jeito mais higiênico, mas não temos muito. Uma sombra maravilhosa me faz relaxar e me esquecer por um momento de onde estou. Bocejo, ainda estou com sono. Um barulho, em meio a tanto silêncio. Todos olham ao redor. Todos ouviram e parecem atentos. Um vulto. Dois. No início, parecem ratos, mas já sabemos o que é. Levantamos, ao mesmo tempo rápidos e quietos. Tentamos seguir aquelas malditas câmeras, mas elas são ágeis demais para nós. Outro vulto, desta vez maior. Bem maior. Sinto um arrepio descer pela espinha. Fazemos o possível para alcançar, chegando a algum lugar e a lugar nenhum.
– Melhor... – Eu digo, mas vejo que todos estão olhando assustados para mim. Eu fico paralisada entre o medo e a curiosidade enorme, por acaso. Não apenas eu, mas todos estão parados, sem reação. Eu estou em posição contrária a deles, fazendo com que eu esteja mais vulnerável. Eu quero perguntar o que é, o que está acontecendo, porque não me dizem mais nada. Sinto algo atrás de mim, alguém. Respire fundo, Ella. Eu penso. Apenas respire. Você já passou por isso. Duas vezes. Tento me convencer e de nada adianta. "Ella, você consegue, você sabe o que fazer". Minha mãe dizia isso algumas vezes. Ela falava para que eu me lembrasse sempre de quem eu era. Mas afinal, quem eu era? A mesma de agora? Não. Sei que não sou a mesma. Talvez isso seja bom se visto de um ângulo diferente. Parece que meu estado em choque tem demorado muito tempo. Porém, tudo aconteceu em menos de dois segundos. Algo borra minha visão, entretanto não sei o que é. Meu corpo está mole e tudo que eu quero é simplesmente deitar no chão e ficar aqui por muito tempo. Apenas deitar. Isso é tudo. Finalmente faço. Talvez alguém esteja fazendo isto por mim. Talvez eu estou sonhando. Talvez, seja um pesadelo. Sinto alguém me arrastar.

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