Deixo meu despertador tocar até quase quebrar: é tudo o que eu posso fazer para
não dar uma martelada nele. Mas, se tivesse um martelo por perto, não sobraria muita coisa.
Dou um tapa nele e me sento na cama, esfregando os olhos. Meus cobertores estão enrolados ao meu redor porque passei metade da noite virando para lá e para cá, morrendo de raiva do desastre que foi a minha festa.
Ai, não quero nem ver o dia de hoje. Não quero saber se a Janae contou para todo mundo que a minha festa foi como um filme B dos anos oitenta ou como eu tentava ficar bonitinha naquele vestido horroroso de marinheira. Ou se minha mãe está irritada porque assoprei as velinhas e me retirei na hora, fui para o meu quarto, tranquei a porta e coloquei Blink-182 no último volume para não ouvir a bagunça lá fora.
Bocejo enquanto me levanto e alongo os braços sobre a cabeça, resmungando sobre o começo da minha vida mala, quando vejo alguma coisa brilhante passar pelo gramado abaixo da minha janela. Cor-de-rosa. Será que o pessoal da organização ainda está aqui, tirando a decoração da festa? Eu me enrolo na minha colcha xadrez verde e laranja fluorescente, apesar de estar usando um pijama totalmente nerd de flanela, que me cobre da cabeça aos pés, e me apoio no beiral da janela para olhar melhor. Lá embaixo o jardim está exatamente como há quarenta e oito horas: um gramado normal. A cerca de cedros não está mais enfeitada com flores, a tenda desapareceu, e a tigela de ponche, quero dizer, fonte, foi aposentada. No jardim, só vejo as cadeiras de ferro pretas, nada mais.
Mas, então, o que foi aquele flash cor-de-rosa?
Abro a janela com tudo e apoio a testa na tela, para poder ver o que está rolando à direita e à esquerda da casa. E é aí que vejo de novo: uma explosão de cor-de-rosa fazendo uma curva.
Hummm. Isso fede à coisa do meu irmão. Ele provavelmente planejou uma emboscada com balões cheios de água e está tentando me atrair lá para fora. Deve estar fazendo uns doze graus. Ele adoraria me deixar encharcada.
Nem pensar que vou cair nessa. Ele é do tipo de pessoa que tenta fazer a mesma brincadeirinha sempre, contanto que funcione. E fez exatamente a mesma coisa há um mês. Ele armou um acampamento e então jogou os balões de água na minha janela. Eu saí para o jardim, para berrar com ele, e quase me afoguei numa explosão de água. Talvez eu devesse ir para a frente de casa e usar o elemento surpresa para surrupiar as armas dele e fazê-lo provar do próprio veneno. Anos de prática como a irmã mais nova me mostraram que ter cérebro é mais importante que ter músculo, principalmente quando, no caso, são o meu cérebro e os músculos dele.
Visto um roupão azul fofinho com estampa de nuvens. Foi um presente de Natal, e foi por isso que não ganhei o preto com estampa bonitinha de caveirinhas verde-limão.
Desço as escadas de dois em dois degraus e estou na porta da frente em segundos. Abro-a fazendo o mínimo de barulho possível; então, passo pela varanda com chão de ardósia e vou para a frente da casa. Atravesso o gramado de fininho, a grama fria e coberta de orvalho nos meus pés descalços. Vou andando nas pontas dos pés até o jardim. Provavelmente, meu irmão está do outro lado da moita repleta de flores, de olho na outra ponta da casa, esperando que eu saia pela porta dos fundos.
Quando fecho o portão atrás de mim, sinto uma respiração quente no meu pescoço e um bigode fazendo cócegas na minha orelha. Eca, meu irmão está precisando fazer a barba. Que nojo!Eu me viro para encarar meu irmão, mas não vejo nada além de ar. E então sinto aquilo de
novo: um sopro quente, mas dessa vez na parte descoberta da minha barriga, entre a blusa e a calça do meu pijama de flanela azul, onde o roupão se abriu.
E, quando finalmente olho para baixo, grito e pulo para trás, batendo com tudo no portão e caindo de bunda no chão. A dor sobe pelos meus braços.
O pônei — o pônei cor-de-rosa —, com olhos arregalados, pula no ar e então fica na pontinha das quatro patas, como se eu é que o tivesse assustado. Suas narinas se alargam, ele respira bem fundo e dá uma tremidinha. Ele não é muito alto, suas costas não passam da minha cintura. Talvez seja um minicavalo, e não um pônei. Ou eles são a mesma coisa? De qualquer maneira, não deveria ser cor-de-rosa e definitivamente não deveria estar no meu jardim.
A gente se encara, ambos congelados, até ele se virar e sair trotando, arrastando seu rabo com mechas azuis. Ele solta um relincho comprido e fininho e desaparece por trás da casa.
Alguém pisou na bola feio com aquele pônei. Acho que ele era branco, porque seria o único jeito de um corante cor-de-rosa daquele jeito pegar no pelo. E a crina devia ser branca também, a não ser por aquelas mechas azuis eletrizantes.
E, eu juro para você, ele tinha um sorvete de casquinha pintado na bunda. Três bolas. Casquinha de biju.
Esfrego os olhos algumas vezes. Isso não está acontecendo de verdade, né? Será que o coitadinho escapou de alguma fazenda aqui por perto? Quem fez aquilo com ele? Espera aí. Se ele é cor-de-rosa, então provavelmente foi uma menina.
Saio correndo atrás dele, irritada por ter saído da cama por causa de uma coisa maluca e ridícula. Quem é que pinta um pônei de cor-de-rosa? Isso não deveria ser classificado como crueldade contra os animais ou algo do gênero?
Quando viro a esquina de casa, tenho uma visão geral do jardim e avisto o gramado totalmente vazio. Hummm.
Ando ao redor do quartinho que há no fundo do jardim e olho lá dentro, mas o pônei também não está lá. O portão lateral está aberto, então volto para a frente de casa e fico olhando da calçada. Olho para os dois lados, mas não o vejo também.
Fecho os olhos por um bom tempo, esperando sentir aquela respiração morna e os pelinhos de novo, mas não acontece nada. O pônei se foi.
É oficial: sou louca.
Volto para casa e passo pela sala da frente, onde minha mãe está colocando um par de sapatos pretos bonitinhos, com o cabelo penteado perfeitamente, depois de uma ajudinha do secador.
— O que você estava fazendo lá fora? Fico plantada ali, meio boba.
— Humm... Estava procurando o jornal. Para uma lição de casa sobre acontecimentos atuais.
— Está sobre o balcão — responde ela, olhando-me de um jeito esquisito. Sempre está no balcão. — Ah.
Ela se levanta para sair.
— Mãe?
— Hã?
— Você alugou um pônei para a minha festa? Minha mãe cai na risada.
— É claro que não, querida. Você está grande demais para essa coisa de pônei.
E então ela simplesmente sai em direção à porta da garagem, onde seu Lexus brilhante a aguarda. Eu a vejo sair, pensando se estou louca mesmo ou se a promotora perfeita de eventos nem sabe que tipo de atividades reservou para a festa de aniversário de dezesseis anos de sua filha.
Fazendo que não com a cabeça, volto para o meu quarto. Está na cara que meu cérebro não funciona direito sem um banho quente de vinte minutos. E só tenho mais dezenove antes de me atrasar.