7 = A Caminhante =

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Por Lyssa




-Lyssa....

A Escuridão do Coliseu é bem vinda. Pensar em Ryan e Thomas lá fora em perigo faz-me querer ir ajudá-los mas a escuridão impede-me de ver a saída.

Uma voz sussurra o meu nome vezes e vezes sem conta. É uma voz doce e faz-me lembrar lembrar a voz da minha mãe. SIgo a voz para dentro da Escuridão , reconfortada por aquela voz que me faz tanta falta.

-LYSSA! - uma voz diferente mas igualmente familiar grita o meu nome e viro-me na direção de onde acho que veio. Uma vela acende-se ao meu lado , iluminando uma parede de pedra negra manchada de vermelho.

Manchas não ; letras.

Grandes letras escritas a sangue.

-LYSSA ! - grita Thomas novamente , em pânico.

Outra vela acende-se no lado oposto ao da primeira , deixando ver o túnel escuro onde me encontro. Respiro fundo e digo , sem despregar os olhos da frase escrita na parede.

-Estou aqui Thomas.

Oiço passos e a silhueta magra e razoavelmente atlética do meu amigo começa a ganhar forma. Assim que ele me vê , a expressão dele suaviza e ele abraça-me fortemente.

-Como te sentes ? -pergunta.

Reviro os olhos ao perceber o motivo da preocupação dele.

-Já te disse que já não me sinto atraída para aqui. -informo , embora não seja verdade.

Ele abre a boca para protestar mas repara finalmente na parede escrita. As palavras há minha frente não me assustam mas há algo de familiar nesta situação.

-A letra. -sussurro , tocando ao de leve na parede. - É a letra da Channel.

-E porque raio haveria ela de escrever isto ?

Olho para a parede e uma onda de tristeza atinge-me.

A MORTE APANHOU-ME.

Viro as costas à frase da parede e sigo a Escuridão , ignorando os protestos de Thomas. A voz doce continua a chamar-me , levando-me mais e mais para dentro da Escuridão. Atrás de mim , Thomas segura uma das velas o mais firmemente que consegue. A chama da vela ilumina as paredes do túnel mas não é a luz que eu quero ver.

-Lyssa...

-Lyssa vamos embora. -Thomas aproxima-se de mim , tentando esconder o medo estampado na cara. -A Besta já se foi embora e não há nada aqui , só escuridão...

O túnel termina. Um vento gelado arrepia-me a pela e Thomas pára de falar , levantando a vela ao alto para ver o enorme espaço escuro que se estende à nossa frente.

Dou um passo. Outro. Thomas não se mexe. Dou o terceiro passo e luzes fortes atingem-me os olhos , cegando-me momentaneamente. Tapo os olhos com as mãos e espero um pouco antes de voltar a destapá-los lentamente , obrigando-os a habituarem-se à luz excessiva.

-Isto é que é o Coliseu ? -pergunta Thomas , incrédulo.

O espanto emudeceu-me e tudo o que consigo fazer é admirar o que outrora foi um estádio de futebol : as bancadas perfeitamente alinhadas com as suas cadeirinhas esburracadas e partidas , duas balizas em cada ponta do campo , sem rede e enferrujadas pelo tempo. Não há relva e sim chão feito de uma espécie de areia negra , dura nuns sítios e moles nos outros.

Parece um velho estádio de futebol , não fosse pelo chão e pela estátua posicionada exatamente no centro do campo , feita do mesmo material que o chão. Tem um formato esquisito , como se estivesse a gritar e a derreter ao mesmo tempo. Vejo Thomas aproximar-se dela e faço o mesmo , apresando-me ao vê-lo empalidecer. Posiciono-me frente a frente com o rosto da estátua e solto um grito de puro horror ao reconhecer as feições da estátua.

-Channel... -murmuro , rouca , as lágrimas a escorrerem abundantemente. -Minha irmã....

Ela gritava , a boca escancarada , os olhos arregalados de terror. Gritar de medo foi a última coisa que ela fez antes de ser petrificada. A estranha areia que a cobre liga o seu corpo ao chão , o que me impede de atirar daqui. Thomas aproxima-se de mim e abraça-me , os soluços dele ecoando os meus.

-Vamos embora Lyssa. -sussurra-me ele ao ouvido , com a voz embargada.

-NÃO ! -grito , afastando-me dele bruscamente. -Não a podemos deixar aqui Tom. -aproximo-me de Channel e toco-lhe na mão. -Ajuda-me a levá-la , por favor...

Um baque seco faz-me dar um salto de susto. Olho para o chão e vejo o corpo sem vida de Channel completamente livre de areia mortífera. Ajoelho-me ao lado dela e observo o rosto familiar , a pela branca com laivos azuis frutos da Morte , os olhos fechados e que nunca mais se voltarão a abrir.

Thomas ajoelha-se ao meu lado. Num gesto de carinho , o rapaz põe-se a ajeitar o cabelo da nossa irmã , desemaranhando os fios negros cobertos de terra. Uma estranha apatia abate-se sobre mim e a voz doce recomeça a chamar-me vezes e vezes sem conta. Sei que Thomas já se levantou e me chama mas não ligo.

Vazio. É tudo o que sinto.

Algo brilhante chama-me à atenção. Uma Espiral de luz dourada que não estava ali antes no peito de Chann , no lugar onde o coração bateria. Por alguma razão , sei que essa luz deveria ser mais brilhante , mais...viva.

-Consegues ver Thomas ? -pergunto e oiço-o ao longe dizer que não. -Eu vejo. É como se fosse a Espiral da vida.

-A Espiral do quê ? -questiona-me Thomas , julgando-me maluca. -Lyssa , tu estás bem ?

Assinto positivamente , sem desprezar os olhos na Espiral de vida da Channel. -Ela pode viver. - murmuro , aproximando um dedo da luz dourada , que se tornou incandescente ao fazê-lo. -Vês a luz ? Está mais brilhante !

-Lyssa , estás a assustar-me.

Toco no fio espiralizado e observo com atencão ao ver a cor regressar ao seu rosto.

A espiral desenrolou-se , tornando-se um fio comprido que ligava o coração à cabeça. Uma estrada de vida.

-Eu sou a Caminhante. -murmuro , inconscientemente , vendo o fio desaparecer lentamente e a rapariga a que chamo de irmã abrir os olhos inundados por uma luz dourada que só eu vejo.

-Lyssa ? -pergunta Channel , a voz dela tão familiar. -Thomas ?

Thomas desmaia e Channel olha em volta , já com os olhos na sua cor original. Eu limito-me a ficar ali , sentindo a Escuridão puxar-me e apagar os vestígios da luz que apenas eu consegui ver.

''Eu sou a caminhante '' foi o que eu disse antes de trazer Channel de volta à vida.

O que raio é que isso quer dizer !?

E como raio é que eu reverti a Morte !?

-Afinal a Morte não me apanhou. -suspirou Channel , a sorrir.

Fechei os olhos.

''Pois não. Quem a apanhou fui eu '' .




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Mão de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora