12.Tyana

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A parede, eu e Alex. O melhor tipo de sandes, não acham?

Bom, de qualquer maneira, foi uma boa memória, ainda deixada pelo seu perfume quente e natural na cama, entranhado nos lençóis. Inspirei-o com deleite.

Oh, nada como o aroma do caso de uma noite bem-sucedido. O espaço ao lado da cama convidava-me, e tomei-o com alegria, pois ainda estava quentinho. Não devia ter feito muito tempo desde que ele se havia ido embora à socapa. Sorri. As almofadas cheiravam tão bem.

Aquele sábado seria todo meu. O domingo, igualmente. Sem Natalie, sem limites nem regras ou censuras. Oh, a liberdade, as hipóteses de modos de passar aquele tempo todo.

Fechei os olhos, com um sorriso, mas algo me fez abri-los outra vez.

O som de algo a cair na cozinha.

Puta merda. Natalie ia matar-me. Não me havia lembrado da quantidade de coisas que havia posto na borda da mesa, umas encima das outras, enquanto ia sendo conduzida para cima dela, na noite passada. Se matasse as peónias que uma nobre galega havia plantado com a minha amiga inglesa na sua infância, Natalie ia estripar-me com os cacos de porcelana cara do vaso, ou eu provavelmente ia ter que vender a minha alma a Satanás para pagar o prejuízo.

Antes que pudesse sequer pensar nalguma coisa, abri a porta do quarto de rompante e dei de cara com a imagem de Alexander, com uma espátula na mão e um pano na outra, limpando o balcão da cozinha, onde provavelmente havia acabado de entornar o raio de um copo cheio do que parecia sumo de laranja.

—Hey— saudou ele, olhando para mim e sorrindo.

Ok, estava um rapaz na minha cozinha.

A fazer o pequeno-almoço.

Com um sorriso bonito, mas não tanto quanto havia parecido na noite anterior.

Ah, e para que conste, ali estava eu, na minha maior cara de tacho, acabada de acordar, vestida com o meu fato de nascimento.

Não me julguem. Além disso, eu não podia deixar de me sentir sexy, apesar de exposta. Muito exposta, mesmo. Então, tentei não ser rude nem má nem elevar demasiado a voz. O resultado?

—...Hey.

Admito, eu estava nervosa para caraças.

—Dormiste bem?

Ouve lá, mas eu é que faço as perguntas aqui, ok? Porque raio ainda estás aqui? Vestido? A fazer-me o pequeno-almoço? Isto é para os apanhados?

—O que estás a fazer? — Foi tudo o que consegui expressar, sem gaguejar muito, aproximando-me da cozinha e apanhando a meio caminho o lençol de Natalie, ainda estendido pelo sofá, para cobrir a minha nudez.

—Ovos mexidos e panquecas— ele inclinou um pouco uma frigideira, mostrando o conteúdo. Oh, meu Deus. Certo. Óbvio. — Não sabia de qual ias gostar mais, então, fiz o dois.

Eu não o podia mandar embora. Não, nem pensar.

Mas... que raio?!

—Está tudo bem? — Questionou ele, levantando uma sobrancelha, enquanto mudava o conteúdo da frigideira para um prato na mesa, a mesa que ele havia reorganizado com tudo no sítio certo, até a terra das malditas peónias estava húmida, recém regada.

—Eu gosto de ovos— murmurei, sem sequer conseguir agir de outro modo que não me mostrasse severamente nervosa. Sentei-me à mesa e tomei um gole do sumo, tentando empurrar o espanto.

Ele não me ia pedir em casamento, certo?

Eu nem sabia o seu último nome. Ele chamava-se mesmo Alex?

—Pareces assustada— observou ele.

—Estou... surpresa. Os ovos estão bons— gaguejei, sem lhe conseguir olhar nos olhos.

Porque raio fizera ele aquilo tudo? Era algum tipo de piada? Alguma coisa séria?

Raramente me via nervosa à frente de alguém, mas não havia outra maneira com que eu pudesse agir. Aquele rapaz era doce demais.

Comemos em silêncio, e ele acabou mais rápido, pediu licença e foi tomar um banho, deixando-me sozinha com os meus pensamentos.

Não o podia expulsar de casa, ele estava a ser tão simpático, a comida estava uma delícia... Mas também não o podia manter. Seria insensível e desonesto, porque eu não queria por nada que Alex pensasse que eu sentia alguma coisa por ele.

Engoli o pequeno-almoço tragicamente maravilhoso e liguei a televisão, e não demorou muito tempo para ele se sentar ao meu lado, envolvendo os meus ombros com o seu braço, o cheiro doce a gel de banho e shampoo.

Deitei a cabeça no ombro dele, absorta demais no filme e na minha heroína, Angelina Jolie, para sequer reparar no gesto carinhoso.

À queda dos créditos finais, ele levantou a cabeça e sorriu para a minha figura preguiçosa e seminua, inquirindo:

—O que pensas de uma salada de atum para o almoço?

—Porque perguntas?

—Porque está quase na hora do almoço. Acordámos tarde.

Cerrei os olhos e afastei-me do abraço dele.

—Olha, Alex, eu não sei o que estás a pensar— larguei, com uma voz franca e calma. — Mas eu não sinto nada de romântico sobre ti. Quero dizer, és querido e generoso, pelo que percebi, mas a gente só se conheceu ontem, e tu não passas de um caso de uma noite para mim, um entre alguns outros. Nada de especial. Sem laços criados.

Ele olhou para mim, sério, talvez até um pouco surpreendido.

—Nada?

—Bom, até tens um bom... quero dizer, nada, nada, mesmo nada— garanti. — Foi uma noite bem passada, apesar disso.

Alex encostou-se no sofá, fechando os olhos e deixando o sorriso tornar-se nalgo mais leve, mais distante.

—Eu também não sinto nada. Até seria um pouco absurdo se o fizesse, a gente só foi para a cama. Não é como se eu sequer me lembrasse do teu nom...

—Tyana— interrompi, sem conseguir evitar sorrir.

—Tyana. Fixe. Desculpa. Adiante...— Os olhos bonitos fitaram-me, e ele garantiu: — Também gostei de ontem à noite, Tyana. És uma mulher bonita...

Sabia bem ter os pratos limpos.

—..., Mas ainda não me disseste, Tyana, o que achas de uma salada de atum— insistiu ele.

—Parece-me bem. Desde que te ponhas na alheta logo a seguir ao almoço.

—Logo a seguir ao almoço— garantiu ele, saltando para cima de mim e roubando-me um beijo.


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