Capítulo 7

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O lorde de Piemonte estava sentado junto a sua mesa, sob a luz fraca e tremulante das velas. O escritório do castelo ecoava o silêncio. Jogou para o lado os papéis que tinha nas mãos, bufando. Passou a mão pala cabeça coberta com poucos fios de um cabelo grisalho e olhou para a lua cheia que parecia estar ao lado da janela.

Sabia que precisava concentrar-se nos problemas do feudo, havia constantes conflitos com os burgueses, que lhe tiravam o sono. Entretanto, no momento, não conseguia dar a menor atenção a isso. Na noite anterior, tomado pela fúria por ter sido traído, espancara sua mulher até a morte e a deixara em um beco entre as vielas do local onde moravam seus servos. Pela manhã, mandara seus homens de confiança em busca do corpo, contudo nada encontraram. Quem roubaria um corpo moribundo? Ou reconheceram-na como a dama daquele castelo e julgaram-na digna de um enterro descente? Aquela prostituta, como tivera a ousadia de desafiá-lo! Bateu com força na mesa de madeira.

Ela era linda, porém tanta beleza só lhe trouxe infortúnios. Era mal-educada, não se curvava a ele como uma boa esposa. Para piorar, tivera a ousadia de engravidar de outro homem e não fizera o menor esforço para esconder.

Tal morte ainda lhe fora pouco castigo.

Uma brisa fria entrou assobiando ao preencher todo o cômodo. O homem se escolheu com o repentino arrepio que lhe percorreu a espinha. Pensou em gritar aos servos para que fechassem as cortinas. Contudo, um vulto passou como um borrão fazendo-o pular em sua cadeira pelo susto. Ora, não tinha mais a mente fértil de uma criança para ver tal coisa.

Tentou voltar sua atenção para os papéis, tinha trabalho a fazer. Mesmo que se arrependesse, algo longe da verdade, não poderia voltar atrás no que havia feito.

Uma silhueta entre as sombras formadas pelas altas estantes chamou-lhe a atenção. O que diabos seria aquilo? Sentiu outro calafrio lhe percorrer o corpo. Seus pelos se erriçaram. Postura, homem! És o senhor dessas terras, nada é mais temido do que ti, gritou para si mesmo em pensamentos.

Puxou um candelabro de prata que estava a poucos metros de sua mão e levantou-se. Aquela estranha forma o perturbaria até que tivesse a certeza de que nada era.

Em passos lentos, caminhou na direção até iluminá-la. Quando pode ver bem a criatura escondida nas sombras, engoliu em seco. Pai nosso, tendes de piedade de mim. O choque fez o homem deixar o candelabro cair no chão, as velas rolaram pela superfície de mármore até apagarem-se.

– Dária? – Trémulo, ele deu alguns passos para trás.

De os olhos arregalados e boca semiaberta com um grito entalado em sua garganta, encarou-a. Aquilo que deveria ser sua esposa por um momento lhe pareceu a pior reapresentação de seus pesadelos. Os olhos dela estavam fundos e enormes, e o antigo verde que lembrava belos campos havia dado lugar a um vermelho sangue, tão vibrante quanto o que derramara espancando-a. A pele clara estava mais pálida do que nunca. Seu vestido havia sido trocado por uma camisola branca, limpa. Talvez fosse um fantasma vindo atormentá-lo.

Dária abriu levemente os lábios exibindo presas pontiagudas que não costumava ter, e caminhou na direção do homem.

– Saía daqui, fantasma! Volte para o inferno.

– Estou bem aqui, querido, e não vou a lugar algum até que tenhas o castigo que merece. – A voz dela, que costumava ser calma e gentil, ecoou como uma música fúnebre assustadora, fazendo o homem se encolher.

– O que fizeram a ti? – O lorde dava passos lentos para trás, calculando quanto tempo levaria para chegar até a porta onde os soldados estavam de guarda.

Do Sangue Ao Desejo (Desejos Sombrios 1) - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora