Granizo

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Desde meus onze, doze anos de idade, descobri que tinha depressão. Eu sempre precisei de uma base para me manter de pé e eu tinha meus escapes principalmente na música. Além de escrever, eu era um bom ouvinte e completamente sensitivo. Naquela época, eu não tinha ideia de como fazer downloads, ou sequer imaginava que existiam artistas famosos mundialmente. Eu vivia num mundo pequeno, afinal, eu era jovem demais para saber do mundo inteiro. Até que rolando a barra do youtube, vi uma sugestão de vídeo. Bom, um ícone pequeno, com uma mulher de cabelos pretos, deitada numa cama rosa, usando um vestido dourado e segurando um gato me chamou a atenção. Cliquei sem nenhuma intenção. Desde então, descobri um mundo diferente. Os próximos anos foram dedicados a construir uma base de mim mesmo, com base no amor e na paz que sentia por ela. Muitos não entendiam, a maioria não entende e jamais vai entender. Eu sempre fui muito sozinho e precisava de alguém comigo. A música era a única que estava comigo e me dizia palavras de conforto quando eu precisava.

Katy Perry foi a primeira a me transmitir calma, foi a primeira a me mostrar que eu não era o único que me sentia perdido, a me falar que havia outra pessoa no mundo que as vezes se sentia culpado por tudo, talvez por ser como é, e isso o fazia se sentir morto. Eu me apeguei aos detalhes, me apeguei a uma base que com certeza me faria bem por anos, mesmo que fisicamente eu estivesse sempre sozinho.

E durante anos da minha vida, juntei dinheiro para vê-la em algum dia que fosse possível. E aquele dia iria chegar em alguns meses. Eu havia conseguido comprar o ingresso do show dela na área mais próxima do palco, talvez eu tivesse a oportunidade de dizer a ela o quão eu era grato por todo o suporte, aquilo me encheu de esperança.

Mais esperança ainda, tive ao saber que iria a São Paulo. Lucas estava lá, as coisas poderiam tomar um outro rumo até lá, se ele mudasse de ideia. Eu dormia tarde todos os dias planejando como seria.

Minha mãe conseguiu achar um grupo de apoio para mim, os encontros eram feitos uma vez na semana na casa de um dos membros ou na praia. Sentávamos em círculo e ouvíamos depoimentos de um e outro, tentávamos nos ajudar, nos dávamos conselhos e debatíamos sobre as palavras do outro. Eu nunca tive coragem de falar, eu ia para tentar confiar em alguém, para tentar ocupar a mente. Mas não acrescentou muito na minha vida.

Uma noite de julho, não consegui dormir nem um pouco. Passei a noite inteira em claro pensando em minha vida. O que eu estava fazendo dela, o que eu estava pretendendo e quem eu era realmente. Porque eu estava esperando alguém que estava simplesmente vivendo a vida dele sem mim e já tinha outra pessoa em meu lugar? Porque eu desejava alguém que não me desejava da mesma forma? Aquilo me matava aos poucos. Ás seis da manhã, ainda estava acordado. Decidi começar meu dia de uma forma diferente.

Pus minha roupa de academia, calcei os sapatos, coloquei alguma música animada e fui malhar. Foi um dos treinos mais intensos que já havia feito. Usei todas as minhas forças e descontei todas as minhas raivas e mágoas naquela manhã em todos os equipamentos que usei. Depois de quase duas horas cheguei em casa. Descansei por mais ou menos quatro horas e passei a tarde brincando com Pingo. Minha mãe estava no trabalho, então tentei ajudar e fiz os serviços de casa. Limpei os quartos, arrumei as camas e lavei toda a louça.

Passei a noite conversando com alguns amigos. Dani era uma das pessoas que eu mais conversava. Ela havia surgido na minha vida logo após a primeira ida de Lucas, ainda em 2014. Era uma pessoa que também passava por muitos problemas, e se eu aprendi algo nas reuniões que eu ia, era que problemas as vezes tem solução quando compartilhamos. Não porque temos que ir pela cabeça dos outros, mas pelo simples motivo que temos que olhar por todos os ângulos, aprender a pensar como uma pessoa de fora dos nossos próprios problemas.

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