3-Mensagem noturna

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  O rosto de Leonardo parecia muito contente, um pouco pálido, mas contente. Sua barba mal feita exibia pequenos pontos vermelho, creio que devido a uma alergia da lâmina de barbear (elementar meu caro), não entendo muito, costumo fazer a barba com máquina de cabelo. Anny estava do mesmo jeito, seu cabelo negro amarrado com uma polpa, ela quase nunca dizia nada mas sempre estava ali do lado, olhando, rindo, fazendo cafuné em Leonardo. Sabe era estranho tentar imaginar o que ela pensava. Se eu sair ele fala de mim, não. Eu entendo o porque de seu receio.

A alguns meses atrás Leo ainda morava aqui, estudava e trabalhava sem parar um segundo, só voltando para sua casa à noite. Seus pais não se agradavam muito com isso, eles queriam que ele apenas estudasse, mas ele queria trabalhar e precisava do dinheiro, ele estivera juntando dinheiro por um longo tempo para presentear Anny com seu sonho de sair do país. Ele já havia preparado tudo, so faltava o resto do dinheiro. Ja havia avisado sua mãe que faria uma viagem e, mesmo sem o apoio da mesma, ele iria. Bom, ele era de maior, fazia seu dinheiro e podia decidir o que fazer de sua vida, e assim faria.
Chegando a quantia necessária para a viagem ele deu a notícia, eu não estava presente mas notei o seu entusiasmo em postagens de suas redes sociais.

Macchu Picchu era o destino, o proximo desafio após chegar ao destino era cambiar a seu dinheiro para dolares, ele me contara que teve de procurar a casa de cambio mais proxima da alfandega possível, feito isso a viagem seria tranquila.

Vimos em suas redes sociais fotos de trilhas na cidade, pontos turísticos, fotos no hotel, eu gostaria de um presente desse. Uma semana eles passaram viajando. Quando recebi a noticia que eles haviam voltado resolvi visita-los, meu pai havia preparado uma torta para levar para eles. Cheguei em sua casa, bati a porta e o senhor Maurício, pai de Leonardo, me atendeu. O homem com expressão seria mandou que eu entrasse, achei o clima muito estranho, Anny estava sentada no cantinho do sofá cabisbaixa com as malas de viagem ao seus pés, o senhor Maurício massageava as têmporas sem parar.

Ouvi ao fundo da casa uma certa gritaria, era Leonardo discutindo com sua mãe.

— Você está errado! Como
pode gastar três mil em uma viagem? Se matar de trabalhar para tirar fotos!  — gritava a mulher.

— Mãe, mãe não são só fotos! É uma memória pra toda vida, é diversão, mãe. Todo mundo precisa de vez enquando.

— O que? Você nem se preocupa com nada, gasta dinheiro a toa.

— Mãe, eu sou um adulto agora, da pra aceitar?

— Você é de maior mas ainda mora sobre o meu teto, trabalha de segunda a sábado pra gastar com vagabunda, aqui não meu filho. — no momento em que dona Soraia disse vagabunda, o senhor Maurício desligou a televisão e levantou, enquanto Anny sentada ao meu lado chorava em silencio.

Eu não sabia o que fazer, cheguei na hora errada, mas dizem que amigos era para as horas boas e ruins. Permaneci.
   
Leonardo colocou sua mochila nas costas, olhou para sua mãe e disse:

— Bom mãe, se o problema é esse, eu não moro mais aqui. Outra coisa, foi você que me educou todos esses vinte e dois anos. Foi você e meu pai, sempre me mostrando ser o meu espelho. Mas hoje, mãe, você me faltou com todo o respeito. — os olhos da mulher tremularam, Leonardo sem sequer visitar o quarto seguiu para sala onde eu, seu pai e Anny estava.

— Não filho, você não precisa, ela so estava nervosa, entenda sua mãe, ela só estava preocupada — dizia o homem em prantos abraçado ao pescoço de seu filho que agora segurava as malas que estava com Anny  em ambas as mãos. Pela primeira vez vi o forte Leonardo chorar.

— Chega pai, eu me cansei, já estava na hora não acha? Tenho que aprender mais com a vida, preciso sofrer um pouquinho.

— Filho — o homem tirou de seu bolso seis notas de 100 —, aceite. É uma pequena força, pequena, mas ajuda.

— Não pai, não posso aceitar, não quero ser um estorvo.

— Aceite filho, é o mínimo que posso fazer. – Leonardo pegou o dinheiro hesitante, ele com certeza iria precisar nesse novo caminho que escolhera.

Ele deu as malas para Anny, abraçou seu pai e beijou-lhe a testa. Pegou novamente as malas que estavam com Anny, olhou para mim e comunicando com os olhos pediu que eu o seguisse.

Seu carro era um celta branco com um leve arranhão na horizontal da porta direita. Eu estava um pouco travado vendo Anny pôr as coisas no porta malas, aconteceu tudo tão rápido eu fiquei sem reação.

— Char, você  não vem? — ele ja havia abaixado o banco para que eu entrasse no fundo, eu fui.

    Andamos por toda a cidade ouvindo Lynyrd Skynyrd, gargalhamos muito ao ouvir Sweet home Alabama acompanhada de uma nova versão cantada por ele mesmo.

— I left the sweet home, I will not go back there — o que significa mais ou menos "saí do doce lar, eu não vou voltar mais lá".

     Andamos por toda a cidade visitando todos os hoteis da cidade esperando o melhor preço de hospedagem por noite e só quando alcançamos a exaustão encontramos um hotel com preço favorável já na autoestrada. Era a unica opção, então adicionei uma quantidade de dinheiro para que eles pudessem ao menos colocar gasolina no carro. Liguei para meu pai e ele me buscou.

    Algumas semanas depois recebi a noticia de que ele havia encontrado uma casa com um preço que cabia em seu bolso, que ele dera uma entrada e ja estava dentro da casa, então fora transferido para a fábrica da cidade. E por isso, nós conversamos apenas por vídeo chamada. Hoje passamos apenas uma hora conversando, falamos da escola, os problemas e tudo mais, até que ele ficou cansado de ficar em frente a uma tela e fora dormir. Então resolvi assistir um pouco com meu pai na sala, ele assistia ao notíciario como eu assistia minha series, sem querer perder um episódio se quer.

Eu realmente não entendo, todo dia a mesmo coisa, crime passional, assalto, homicídio, suicídio, estupro jovem desaparecido, não necessariamente nessa ordem. Preferi cair no sono no sofá, uma opção que também não foi muito legal.

Logo que adormeci comecei a sonhar. Em meu sonho eu voltava a meus dez anos de idade, morávamos ainda em nossa casa antiga, paredes pintadas de salmão uma cerâmica branca por toda a casa.

Minha mãe discutia com meu pai bem do meu lado, eu estava muito assustado com tudo aquilo, minha mãe dizia:

— É culpa dele!

— Ele é só uma criança. – meu pai rebatia.

Eu não sabia o que havia acontecido, não sei o que eu fiz de errado. Minha mãe saíra pela porta e eu a segui, segurando em sua camisa. Pedindo para que ela não fosse embora, ela que estava de costas para mim, se virou e seu rosto se tornara o de Gustavo mas com presas enormes, cai no chão e me arrastei tentando fugir da aparição.

Rastejando para trás toquei um pedaço de terra solta, o chão estava aberto. Eu caí, de volta para meu corpo. Quando abri os olhos notei que meu pai tentava me acordar, ele estava de joelhos a beira do sofá com uma mão no coração e outra a me balançar, seus olhos arregalados diziam " socorro, estou tendo um ataque". Rapidamente me levantei peguei o primeiro celular que vi na frente e liguei para a ambulância. Em alguns segundos depois&
a ambulância chegou, agradeço por terem vindo tão rápido. Eles o colocaram na maca, deram uma injeção de sei la o que, e o colocaram na ambulância. Os vizinhos vestidos de pijamas estavam do lado de fora se perguntando o que havia acontecido, entrei na ambulância e me sentei ao lado da maca.

Meu pai respirava agora calmamente, mas dormia. Praguejava aos deuses, por que quando tudo parece estar indo certo da errado?

— Deus, Rá, Zeus, Odin... seja la quem for protejam meu pai.

  

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