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Harry

Caminhei para cozinha com o Luke no intuito de preparar algo para comer. Já que Lolla saiu há um tempinho, extremamente apressada. Tanto que se despediu apenas com um aceno.

Me esforcei a engolir minha refeição. Em parte porque nenhum de nós dois sabia cozinhar, mas também, porque algo em mim dizia que eu deveria contar para o Luke os acontecimentos da noite passada.

Tratei de pegar toda a coragem que estava escondida e abri a boca para falar. Contudo, fui interrompido por Luke:

— É ela Harry. — Ele começou a falar antes de mim e o encarei confuso. — Lembra de quando éramos adolescentes e eu disse que iria arrumar uma garota para ser minha pela vida toda?

— Sei. — Revirei os olhos sem dar muita atenção. — E eu disse que teria várias pela minha vida toda.

— É... — Ele riu e continuou seu discurso. — Eu achei ela, cara. Eu sei que já faz tempo que eu a conheço é que demorei muito tempo para eu realmente me tocar que nutria sentimentos fortes por alguém. Mas, quer dizer, olha para mim agora. Eu estou apaixonado.

— Apaixonado...? — Perguntei. Ao mesmo tempo pedia por mais informações com um movimento com as mãos enquanto comia uma torrada.

— Você é bem engraçado, Harry. — Ele balançou a cabeça negando, como se eu soubesse exatamente a quem ele se referia. O problema era que eu não fazia a mínima ideia de quem era. — Lolla. É ela. Você já deve ter percebido pelo modo que eu olho para ela e...

De repente nada que vinha do Luke parecia fazer sentido. Eu não conseguia sequer decifrar nenhuma das suas palavras, era como se ele estivesse falando outro idioma. Minhas mãos puxam alguns fios do meu cabelo para trás, me mantendo inquieto. Tinha que ser justo Lolla?

— Harry? — Ouvi Luke me chamar, sua voz parecia tão distante. — Harry? — Ele cutucou meu ombro, me despertando do meu transe temporário. E nem sei por quanto tempo fiquei encarando-o. — Você está me ouvindo?

— Tô, cara. É claro que eu estou. - Respondi, passando as mãos pelo meu rosto. Eu precisava dar o fora dali o mais rápido possível.

— Não foi o que pareceu. Olha, eu sei que te acordei cedo pra um domingo... — Luke começou a se desculpar, mas eu o interrompi.

— Não, loirinho. Relaxa, eu estou bem. Só me distrai um pouco.

— Tem certeza? — Me forcei a assentir para ele. — Então, como eu estava faland...

— Cara... — Interrompi Luke novamente antes que ele pudesse retomar o assunto. — Esqueci completamente. Eu prometi para a minha mãe que a encontraria hoje e, poxa vida, eu estou super atrasado. — Menti, olhando para o relógio no meu pulso. — A gente pode falar sobre isso depois?

— Sim... Hm, claro. — Ele me respondeu incerto e, claro, um tanto confuso. — Diz para ela que eu mandei um beijo.

Assenti. Logo em seguida, pegando meu casaco no sofá e as chaves do carro para sair dali o mais rápido possível.

(...)

Qual era o meu problema? Eu tinha as mulheres, o carro que meus pais me deram, um apartamento no centro da cidade – não muito longe da faculdade – que compartilhava com meu melhor amigo. Também, tinha a faculdade e meu melhor amigo de infância junto comigo desde sempre.

Eu tenho certeza que se o Harry de sete anos me visse agora, ele sentiria orgulho de mim.

Mas, pensando por outro lado, o Harry de vinte e dois anos não se sentia no direito de se orgulhar por nada.

Eu transei mesmo com a garota que pela qual meu melhor amigo está apaixonado?

Como eu não pude perceber que ele estava apaixonado por ela?

Se ainda tivéssemos sete anos, tudo seria mais fácil. Naquela época, nós costumávamos brigar o tempo todo e ficávamos sem nos falar por alguns minutos, mas no fim, Luke sempre cedia e me perdoava.

Nossa amizade podia ser comparada à algumas coisas, mas eu sempre gostei de pensar que eu era uma espécie de Bart Simpson e Luke, meu Milhouse.

Ele sempre me perdoava. Sempre mesmo. Mas agora... Bom, agora eu não tinha certeza de nada e, além do mais, ele estava apaixonado por ela. E eu não sabia se tudo ocorreria como sempre foi.

Estacionei o carro perto de um parque qualquer. E assim que soltei o cinto, apoiei meu rosto na minha mão, sem saber exatamente para onde fiquei olhando, mas foi tempo suficiente para concluir que eu estava sendo um completo idiota.

Nós não tínhamos mais sete anos, nunca mais teríamos! Desta vez estávamos falando de uma garota e não na porra de um brinquedo. E mesmo que aquela tivesse sido uma das melhores noites da minha vida, eu não podia tomar ela para mim como fazia com as coisas do Luke quando éramos pequenos. Não mesmo!

Ele era meu melhor amigo e ela... Bem, a Lolla era minha única amiga. E eu não iria estragar as coisas por sexo, eu simplesmente não podia.

Qual é, eu não tenho mais quinze anos. Pelo amor de Deus!

É só uma garota, e eu posso ter outras garotas.

Tirando-me dos meus devaneios, meu celular vibrou no meu bolso e eu abri a mensagem. Era Lolla.

"Você contou para ele, né? Me diz que você contou!"
— Mensagem recebida, 09:22 a.m.

Suspirei fundo, repentinamente frustrado. Será que ela ficaria muito brava com uma resposta negativa?

"Não, eu não contei."
— Mensagem enviada, 09:24 a.m.

Minha resposta foi apenas o essencial, apesar de eu ter escrito e reescrito a mensagem, pelo menos, cinco vezes. Cheguei até a escrever que não disse porque Luke era apaixonado por ela. E, obviamente, apaguei a mensagem no segundo seguinte. Eu nunca revelaria uma coisa dessas.

Meu celular começou a tocar e eu apenas atendi, sem nem mesmo olhar para ver quem era. Eu tinha certeza que era Lolla.

— Fala. — Eu disse, puxando meu cabelo para trás.

— Fala? Você me diz "fala"? — Ela diz, parecendo estar impaciente. — Porque você não contou para ele?

— Porque você não contou para ele? — Rebati, mesmo que eu me sentisse na responsabilidade de contar por conta própria. — Que foi? Eu não transei sozinho.

— Na onde você está? — Me mantive em silêncio, esperando que ela falasse mais alguma coisa. — Sério, precisamos conversar.

É, Lolla estava realmente brava.

E eu estava fudidamente encurralado.

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