C A P Í T U L O 2

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A magia voltou enquanto eu estava colocando os itens básicos na bolsa, e tive que usar a Karmelion em vez do meu carro habitual. Uma caminhonete enferrujada e em más condições, de cor verde bile e sem o farol esquerdo, a Karmelion só tinha uma vantagem: andava com água impregnada de magia e podia ser dirigida durante uma onda mágica. Ao contrário dos carros normais, a caminhonete não roncava nem produzia nenhum dos sons que as pessoas esperavam que um motor fizesse. Em vez disso, rosnava, zunia e emitia trovões ensurdecedores com uma regularidade deprimente. Não fazia ideia de quem a chamara de Karmelion ou por quê. Comprara-a num ferro-velho com o nome rabiscado no para-brisa.

Para minha sorte, em um dia normal a Karmelion precisa percorrer apenas cinquenta metros até Savannah. Hoje eu a forcei através da linha ley, o que não era tão ruim já que levava quase direto até Atlanta, mas o percurso pela cidade não fez muito bem à caminhonete. Agora Karmelion estava esfriando no estacionamento atrás de mim, gotejando água e transpirando magia. Levaria uns bons quinze minutos até eu conseguir reaquecer o gerador, mas tudo bem . Eu planejava ficar por aqui um bom tempo.

Eu odiava Atlanta. Odiava cidades, e ponto.

Fiquei parada na calçada e vigiei o pequeno e antigo prédio de escritórios que supostamente abrigava a filial de Atlanta da Ordem dos Cavaleiros da Ajuda Misericordiosa. A Ordem se esforçava para esconder seu verdadeiro tamanho e poder, mas nesse caso tinha exagerado. O prédio, uma estrutura de concreto de três andares, se erguia como um polegar ferido entre as mansões de tijolos que o cercavam . Os muros mostravam manchas alaranjadas de ferrugem causadas pela água da chuva que gotejava do telhado de metal pelos buracos nas calhas. Grossas grades de metal protegiam as pequenas janelas, encobertas por venezianas pálidas atrás do vidro empoeirado.

Tinha que existir outra instalação na cidade. Um lugar onde a equipe de apoio trabalhava enquanto os agentes de campo apresentavam uma fachada modesta para o público. Teria um enorme arsenal de última geração, uma rede de computadores e um banco de dados com arquivos sobre qualquer pessoa de poder — mágico ou mundano. Em algum lugar daquele banco de dados o meu nome estaria colocado em seu próprio lugar, o nome de uma rejeitada, indisciplinada e imprestável. Do jeito que eu gostava.

Toquei o muro. A cerca de meio centímetro dentro do concreto, meu dedo encontrou uma resistência elástica, como se eu estivesse tentando apertar uma bola de tênis. Um débil brilho prateado pulsou na minha pele e retirei a mão. O

edifício estava altamente protegido contra magia hostil. Se alguém com muita energia lançasse uma bola de fogo contra ele, provavelmente ela ricochetearia

sem nem chamuscar as paredes cinzentas.

Abri um pouco das portas duplas de metal e entrei. Uma passagem estreita se estendia à minha direita, terminando numa porta que ostentava uma enorme placa vermelha e branca que dizia: "somente Pessoal Autorizado". Minha outra opção era subir as escadas que levavam para o andar de cima.

Subi os degraus, notando que estavam surpreendentemente limpos. Ninguém tentou me impedir. Ninguém me perguntou por que eu estava lá.

Olhe para nós, somos prestativos e inofensivos, vivemos para servir a comunidade e até deixamos qualquer um entrar na nossa sede.

A necessidade de um edifício despretensioso eu podia entender, mas os registros públicos declaravam que a filial inteira consistia em nove cavaleiros: um protetor, um sagrado, um investigador, três defensores e três guardiões. Nove pessoas, supervisionando uma cidade do tamanho de Atlanta. Tá.

A escada terminava num hall com uma única porta de metal pintada de verde-claro. Uma pequena adaga brilhava fragilmente sobre a sua superfície na altura do meu olhar. Bater não me pareceu uma boa ideia, então abri a porta e entrei.

Sangue Mágico - Kate Daniels Vol 01.Onde histórias criam vida. Descubra agora