Sofia hesitou na hora de assinar o papel. Notou que estava tremendo, talvez não conseguisse. O agente funerário a fitava com pesar.
- Lamento, Sra. Andersen. Ele era seu avô?
- Tio avô - ela corrigiu. Sofia Andersen estava morta.Na teoria, ela era Hellen, uma sobrinha neta que casou com um sobrinho do marido de Marta. Podia ser confuso, mas aquela era quem ela tinha se tornado. Sofia não existia mais. Ali, nos Estados Unidos, tão vulnerável em sua cidade, ela era somente Hellen.
Assinou o papel rapidamente.
- Obrigado, Sra. Andersen. Já iniciamos os trabalhos com ele. O velório será iniciado quando a senhora permitir.
- Obrigada. Vou verificar com... Com minha tia Angela, e minha prima, Marta. Entraremos em contato, pois haverá muitos convidados.
- Está bem. Anotado. Obrigado, Sra. Andersen. Fico no aguardo de seu contato.
- Obrigada.
Sofia saiu da funerária para encarar o ensolarado dia em Nova York. Ela pegou um táxi e foi até o apartamento de Giselle. Pela janela, olhava como a cidade parecia diferente. Sentia muita falta do seu lar.
Ao chegar, deu de cara com Richard, sentado no sofá e assistindo tv. Levantou assim que ela chegou. Ouviu também que tinha alguém na cozinha.
- Oi, mamãe. - ele disse, tristonho.
- Querido - ela o abraçou forte. - Como você está?
- Eu estou bem. Vou ficar bem.
- Querido - ela queria chorar - mamãe também está muito triste. Mas precisamos ficar fortes. Vai ajudar a mamãe, a vovó e a tia-bivó?
- Vou sim. Vocês precisam de mim. Vamos ficar todos juntos.
- Esse é meu menino. Quem está aí?
- Tia Giselle. Ela está fazendo algo para a gente comer.
- Ótimo. Fique aqui.
Ela foi lentamente para a cozinha.
Encontrou Giselle mexendo uma omelete na frigideira. Ela estava concentrada para não desmanchar.
- Está com uma cara ótima.
- Oi, So. - Giselle baixou o fogo e se virou para a amiga.
Elas se abraçaram e choraram um pouco. Depois de um tempo, se afastaram. Elas ficaram em silêncio, enquanto Giselle terminava a omelete. Alguns minutos mais tarde, quando ficou pronta, Giselle separou uma porção com bacon para Richard e levou a ele, pedindo para ele ficar na sala. Voltou para a cozinha a se sentou de modo que conseguisse ver se Richard se aproximasse.
- Então? - perguntou Sofia, bem baixo.
- Seu avô o chamou para contar tudo. Não pudemos fazer nada, Sofia. Eu soube, assim que o vi na recepção, mas não fui capaz de impedir. Me perdoe.
Sofia começou a chorar, mais ainda. Giselle esperou alguns segundos e continuou:
- Ele não acreditou, a princípio. Estava muito nervoso, com raiva, porque achava que tínhamos a intenção de magoá-lo. E eu tive, novamente, a chance de mandar ele embora. Mas não consegui. Não achei justo que ele ficasse daquela maneira, ainda mais que ele visivelmente ainda sofre por você.
- Se ele não estivesse lá, eu teria conseguido ver vovô... - disse Sofia
- Seu avô queria que fosse assim. Ele sabia que só poderia fazer uma coisa: ou contar as coisas a Brandon ou se despedir de você e Richard. Ele escolheu o que achava certo...
- Ele escolheu errado.
- Não veja as coisas dessa maneira...
- As coisas são exatamente dessa maneira. Agora ele está morto mesmo, não tem mais com o que se preocupar. Mas e nós? Como vou fazer com meu filho?
- Eu conversei com Brandon - disse Giselle, prestando atenção na sala - Ele vai dar um tempo, pelo menos por enquanto. Claro que ele queria vir atrás de vocês na mesma hora, mas o contive. Vai esperar a poeira baixar um pouco. Só não espere que ele vai ficar de braços cruzados diante disso. Ele vai lutar por vocês...
- Como é?
- Sofia - Giselle disse, bem baixo - Ele ainda ama você. Vai querer você de volta...
- Não serei a outra. Não mais. Não aceitarei mais isso...
- Você não seria a outra. Ele está em crise no casamento e vai se divorciar.
Giselle notou um pequeno brilho nos olhos de Sofia, mas só isso. Esta também não disse nada. Enxugou o nariz em um lenço de papel e continuou em silêncio.
- Me diga uma coisa, - Giselle sentiu que precisava saber - Você ainda o ama?
Sofia a encarou com o olhar morto.
Fazia tempo que as duas não conversavam sobre isso, justamente porque ambas sabiam como esse assunto era difícil. Giselle sempre evitava falar e, naquele momento, notava que a necessidade de conversarem sobre Brandon Flowers foi diminuindo com o tempo.
- Sabe - Sofia disse, depois de um tempo, as lágrimas contidas - antes doía tanto que eu mal conseguia respirar. Hoje, sinto quase isso quando vejo meu filho caindo da bicicleta. Acho que fiz uma transferência, inconscientemente, das prioridades.
Giselle nem sabia o que dizer. Sofia continuou:
- Eu já tinha em mente que eu jamais o veria pessoalmente, nunca mais, e vice-versa. Meu coração cicatrizou inflamado.
- Você não pensava mais nele?!
- Penso, todos os dias, e lembro de como foi perfeito, apesar de ter sido a amante. Mas eu já tinha me conformado.
Giselle recuou. Sofia disse:
- Meu maior choque foi, sem dúvida, você ter me ligado para contar que ele estava com vovô. Jamais esperava, em nenhuma hipótese. Vou precisar de ajuda.
- Terá toda ajuda que precisar. Mas você ainda não respondeu à minha pergunta.
- Qual pergunta?
- Você ainda ama Brandon Flowers? Porque ele está disposto a lutar por você, de novo.
- Eu...
Richard entrava na cozinha, com o prato.
- Pronto, tia Giselle.
- Nossa, querido, que rápido que você foi! - Giselle se levantou - Quer mais?
- Não, obrigado. Estava ótimo, mas já estou cheio. Vocês não vão comer?
- Daqui a pouco. Estamos conversando...
- Está bem. Mas se o tio-bivô visse que vocês não estão comendo, pegaria vocês pelas orelhas.
Sofia e Giselle tiveram que rir.
- Vamos comer sim - disse Sofia - Ele não vai se decepcionar conosco.
- Acho bom mesmo - ele disse, severo.
- Santo Deus - disse Giselle, quando viu ele voltando para a sala - ele tem bem o jeito do Brandon. Nem lembrava mais, mas como vi ele e Richard quase em sequencia, é inacreditável e semelhança...
- E como é que ele está? - perguntou Sofia, de repente.
- Continua bonito, só que maduro. Sinceramente, ele está envelhecendo bem. Mas - ela estranhou - Você não acompanha mais?!
- Claro que acompanho, mas... Você viu ele pessoalmente.
- Sofia, você quer negar mas sabe que quando ver ele pessoalmente de novo vai ter um troço. Não minta para mim.
Sofia suspirou. Era verdade. Ela quase tinha enganado Giselle, mas se entregou quando perguntou como ele estava. Ela queria saber se ele realmente estava tão incrível quanto ela via pela tv ou na internet. Brandon já estava em seus 40 e tantos e ele continuava fantástico. Ela morria com a ideia de acompanhar aquilo de longe e, diante da possibilidade de ter ele de volta, ela se via em seus antigos surtos fangirl. Se sentia ridícula por isso, afinal era uma mulher feita, na faixa dos trinta e com um filho de 8 anos.
- Você quase conseguiu - disse Giselle - mas para mentir para mim é necessário muito jogo de cintura. E, no caso de Brandon Flowers... - ela deu uma risadinha - Você perde a compostura.
- Me sinto idiota. Vou ter uma conversa séria com vovô quando reencontrar ele.
Giselle riu.
- Há quantos anos você está sozinha?
- Desde sempre. Sabe que não quis me envolver com ninguém, por causa de Richard.
- É, mas agora que Brandon Flowers quer você de volta...
As duas riram.
- Bom, tudo bem. Isso pode ficar para mais tarde. - Sofia disse - Onde mamãe está?
- Ela foi para seu apartamento. Está com sua avó lá. Ia começar a fazer os contatos para o velório e o enterro, enquanto você providenciava o resto na funerária...
- Ótimo. Vou passar lá - levantou - Richard!
- Deixe Richard aqui - Giselle pediu - Sempre prometi levar ele para a Broadway e assistir ao musical do Homem Aranha. É uma boa hora, para ele se distrair...
- Ah sim, - disse Sofia - Boa ideia.
Obviamente, Richard concordou na mesma hora em ficar com Giselle. Sofia foi sozinha para seu apartamento.
Giselle se arrumava pensando que seria morta em pensamento por Sofia dali a pouco.
Porque, muito além de levar Richard para a Broadway, ela sabia que Brandon Flowers também estava no apartamento da amiga.
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Just Another Girl II
FanficOito anos após a morte de Sofia Andersen, Brandon Flowers ainda tentava voltar a viver de maneira normal, embora a perda estivesse gravada em seu coração como uma profunda cicatriz. No entanto, ele não fazia ideia dos efeitos que uma surpreendente l...