Velhos sentimentos

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 Assustei-me. Não era quem eu estava pensando, era?

— Tudo bem, eu não vou ficar magoado se você não me reconhecer de imediato. — ele coçou a cabeça, meio sem graça.

Encarei-o, tentando identificar. Os traços de seu rosto me eram muito familiares, mas precisava de outro fator para saber quem era esse rapaz. Olhei suas mãos, com pequenas cicatrizes.

As mesmas cicatrizes de Vicente.

Dei um meio sorriso e foquei em seus olhos, já que a franja estava mais curta: um castanho e o outro verde.

— Vicente...

— Eu achei que você ia demorar mais para me identificar. — ele disse — Você é bem melhor do que eu, que demorei uma eternidade para te reconhecer no começo do ano.

— Mas é impossível não te reconhecer! Você tem características únicas, Vicente. — disse, sorrindo, arrancando uma risada tímida dele — Você ficou bem melhor assim, mas... está usando lentes?

— Meu grau diminuiu um pouco nesse período, meus óculos estavam me dando dor de cabeça. Eu consigo te enxergar quase nitidamente, bem diferente de quando eu tirava os óculos. Mas pode ficar tranquila, em breve vou fazer outros.

— Tem certeza que vai conseguir copiar a matéria? Se não conseguir eu te empresto meu caderno e...

— É tão engraçado te ver preocupada... — ele sorriu — obrigado, mas eu prometo que vou ficar bem.

— Se você diz...

Começamos a conversar sobre várias coisas, mas nenhum de nós dois tocou no assunto Alexandre. Devido a alguns problemas durante o trajeto, chegamos um pouco atrasados na aula. Cumprimentamos a professora de Química e sentamos em uma das poucas cadeiras que restavam. Embora eu tenha insistido, ele deu preferência que eu sentasse em uma das cadeiras mais para a frente. Assenti, já tínhamos chegado atrasados, não queria atrapalhar a aula por causa de uma simples carteira.

Durante a aula, podia ouvir algumas garotas fazendo perguntas para Vicente como "você tem namorada?", "a Beatriz não é nada sua não, né?", "no intervalo, quer ficar no nosso grupo? A gente te trata bem!", entre outras. Um grupo de meninos riam das respostas tímidas dele. Eu preferi continuar aonde estava, sem me intrometer, aliás, uma das meninas "atiradas" era Mariana e o clima na sala estava tão agitado que elas dificilmente ouviriam minha voz.

Continuei me concentrando em meus exercícios, ao menos, tentando. A junção de todos os ruídos na sala já estava começando a me dar dor de cabeça. Eu nunca esperei tanto que o intervalo chegasse logo.

Ou será que já?

Para minha sorte, o sinal bateu antes que eu piorasse. Levantei calmamente, peguei apenas meu celular, já que estava sem fome, e me preparei para sair da sala sozinha, pois as meninas já tinham arrastado Vicente junto delas.

— Eu não o culpo. — uma voz conhecida ressoou ao meu lado — Eu confesso que elas são bonitas, mas, cara, largar a dona assim é vacilo.

— Bom dia para você também, Alexandre...

— Você não parece bem. — ele abaixou um pouco para conseguir ver meu rosto — O que você tem, hein? Não gosto de te ver desanimada.

— Só um pouco de dor de cabeça. Nada de mais.

— Quer ajuda para descer as escadas?

— Não precisa, afinal, é só uma dor de cabeça. Mas você está muito prestativo hoje... — disse, levemente desconfiada — O que aconteceu?

Julgamento de uma IlusãoOnde histórias criam vida. Descubra agora