Capítulo 4

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CAPÍTULO QUATRO Quando o helicóptero decolou do aeroporto Marrakech-Menara, María fechou os olhoscom força. In­felizmente, ao fazer isso, sentiu-se terrivelmente ton­ta edesejou que a última etapa da viagem estivesse perto do fim. Talvez fosse acomida, ou talvez tivesse comido demais.Não queriacomeçar a imaginar que pudessem ser os primeiros enjoos de uma gravidez.Lembrou-se de que em poucos dias acabaria com aquela angústia, pois seu ciclomenstrual era bastante regular.María haviasaído da cidade de Londres pela ma­nhã, bem cedo. Já passava do meio-dia efazia bastan­te calor. A blusa de manga cumprida e a calça de al­godão quehavia escolhido para viajar grudavam na pele molhada pelo suor. O céu límpido,sem nenhuma nuvem, era de um azul-lilás profundo e muito bonito.Até então, nadana viagem parecia real. Era a única passageira no jatinho particular com umatripulação que tinha se mostrado, quase que embaraçosamente, ávida poragradá-la durante o vôo. Ao aterrissar, pas­sou rapidamente por um controlealfandegário e logo foi escoltada até um heliporto.O helicópteropousou e Nemos a ajudou a sair da aeronave. O edifício à sua frente era tãoimponente que a fez perder o fôlego. As paredes com pés-direitos altíssimosestavam decoradas com desenhos geo­métricos e com colunas ornamentadas em cadaum dos cantos. María ficou algunssegundos boquia­berta.- Éimpressionante. Ele deve vir aqui com fre­quência.- O patrão temmuitas propriedades. Faz bastante tempo que ele não visita esta.Na entrada dohall principal, um chafariz de jade jorrava água de suas bicas sobre uma fontetrabalha­da com mosaicos. Pétalas de rosa boiavam sobre a água. Nemos aapresentou ao mordomo, Hamid, res­ponsável por uma grande equipe de empregados.O edifício eraenorme e suntuoso, construído ao redor de um amplo jardim ornamentado compalmei­ras e trepadeiras floridas abundantes e verdejantes. O interior da casaera opulento e elegante. Duas cama­reiras a guiaram até o andar de cima, ondeum portal em formato de um buraco de fechadura separava o corredor principal dovão da escada. María teve a sensação imediata de ter sido transportadadiretamente para um conto das Mil e Uma Noites.Ao entrar noquarto que lhe indicaram, María de­parou com uma suntuosa cama ornamentada comcortinas e enfeites banhados a ouro.- Nossa... -sussurrou María, maravilhada.O banheiro eraigualmente espaçoso e no centro havia uma enorme banheira de hidromassagem, queestava sendo preparada por uma das camareiras, com óleos e sais minerais.Quando estava tudo pronto, María agradeceu as meninas em um francês sofrível efechou a porta para se despir. Entrou na banheira e tentou relaxar.Será que adecisão de ir ao Marrocos fora influen­ciada pela suspeita de que estavagrávida? Era isso que a fazia se sentir tão ligada a ele? Ou estava ape­nasmentindo para si mesma e criando desculpas to­las em um esforço patético paraevitar encarar a ver­dade constrangedora?Desde aprimeira vez que vira Estevão Petrakos na sala de reunião María ficara obcecadapor ele. Mes­mo na adolescência já nutria uma paixão platônica por ele, o quecontribuiu para que ficasse ainda mais suscetível ao charme vibrante e à belezaexcepcional dele. Fora para a cama com ele porque não consegui­ra resistir aseus encantos, e aceitara ir ao Marrocos pelo mesmo motivo. Finalmente, pensoucom pesar, estava sendo honesta consigo mesma. Pena que o re­conhecimento dosfatos a tornava infinitamente mais vulnerável.Com que tipo demulheres Estevão gostava de se envolver? Seria previsível como a maioria dos ho­mens?De repente, desejou que pudesse comprar aquelas revistas de mexericos repletasde fotos e no­tícias sobre a vida dos ricos e famosos. Porém, por mais curiosaque estivesse, sabia que não poderia comprar nada que fosse supérfluo nofuturo. Havia ti­rado três dias de folga no trabalho, o que faria dife­rença nofinal do mês. Ficaria com menos dinheiro durante um bom tempo.Ao sair dobanho, um massagista a esperava do lado de fora. Atónita, María obedeceu àsorienta­ções do profissional e se deixou massagear com óleos perfumados erelaxantes. Em seguida, fizeram suas unhas e o cabelo. Depois do banho debeleza, sentiu um sono incrível. Nãoconseguiu achar a mala com suas roupas e acabou vestindo um penhoarazul-turquesa de seda que encontrou sobre a majestosa cama. Adormeceu alimesmo.Quando KristaSpyridou ligou para Estevão na­quele mesmo dia, o jatinho estava parado emParis para reabastecer.- Tive umaoutra idéia para o tema da festa de ca­samento - anunciou a noiva alegremente.Estevão fez umacareta de desânimo. , - António e Cleópatra! - gritou Krista entusias­mada.- António eCleópatra tiveram um casamento bí­gamo - revelou Estevão sem paciência.- Não acredito.Mentira! - Ela protestou. - Não foi isso que mostraram no filme que eu vi.- António já era casado. Tinha uma esposa em Roma.A tolerância de Estevão estava se esgotando en­quantoouvia Krista lamentar a notícia do outro lado da linha, como se tivesse acabadode ouvir uma sen­tença de morte. Alguma vez a tinha visto lendo um li­vro?Discutindo algo remotamente inteligente? Estevão franziu a testa. A visívelignorância da noiva co­meçava a irritá-lo profundamente, pela primeira vez.Quandofinalmente chegou à sua isolada mansão no Marrocos, o sol já se punha nohorizonte. Subiu as escadarias e foi até a suite principal. Deteve-se ao ver Maríaadormecida sobre a ampla cama. As madei­xas que mais pareciam raios onduladosespalhavam-se sobre o travesseiro. O perfil delicado e pálido con­trastava coma boca voluptuosa e vermelha. A fenda carnudaentre os seios espessos e redondos estava ex­posta. A curva generosa e bemdefinida do bumbum marcava a seda do penhoar. Estevão estava enfeitiça­do pelopoder de sedução dela e espantado com a in­tensidade do desejo que sentianaquele momento.- María...? -murmurou o nome dela, usando o diminutivo pela primeira vez.Ela se virou defrente e abriu os olhos. O ar faltou ao vê-lo a alguns passos de distância.Estava lindo como sempre. Tentou disfarçar o deslumbramento que sentia e se pôssobre um dos cotovelos, levantan­do o rosto sonolento.- Acabeiadormecendo.Estevão despiuo terno de seda cor de ébano e o co­locou sobre a cadeira mais próxima, comelegância.- Fiquei presoem Paris... peço desculpas. Mas adorei encontrá-la aqui me esperando, glikiamou.- Este é um doslugares mas fabulosos que já vi - confessou ela.Ele se sentouna beirada da cama e tomou os lábios exuberantes de María, embevencendo-se coma lín­gua por cada milímetro de sua boca suave e quente, de uma forma tãocarnal que a fez excitar-se nos bra­ços dele.- Estou loucode desejo por você.O corpo de Maríaestava tenso e os mamilos rígi­dos, e ela temeu que pudessem ser notadosatravés da fina seda do penhoar. Percebeu que precisava urgen­temente vestiralgo menos provocante. Em um movi­mento abrupto que o pegou de surpresa, elasaiu da cama.- Precisovestir alguma coisa.Estevão a tomoupela mão para impedir que ela se afastasse. Seu instinto lhe dizia que ela jáestava um muito medrosa e desconfiada e não era o momento de contar que ocloset estava abarrotado de roupas de estilistas famosos e de grifes caras queele havia mandado comprar exclusivamente para ela.- Não. Nãotroque de roupa. Você está tão des­contraída e relaxada. E essa é uma dascoisas que gosto em você. Não está obcecada com a aparência do cabelo, do rosto ou como tipo de roupa que vai vestir. O jantar vai ser servido na varanda.Estevão foi aotelefone que estava sobre a cabecei­ra da cama e falou em uma língua que Maríanão conseguiu identificar. Após desligar, começou a tirar a camisa.- Preciso de umbom banho.A atenção de Maríase deteve nos ombros nus e bronzeados e no peito com a quantidade perfeita depêlos másculos, sem exagero. Ele se espreguiçou e ela pôde ver a musculaturarija desenhada na pele bronzeada e o abdómen reto e bem definido. Tentoucontrolar o desejo ao lembrar da sensação suave de seus dedos sobre as costasquentes e suadas de Estevão, na primeira vez que fizeram amor.Bastou queentrasse no banheiro para que ela dese­jasse sua volta. A prudência que lhe eranatural a atormentava, no entanto, estava em uma batalha per­dida contra arealidade, que era o fato de se sentir simplesmente feliz por estar no Marrocose em êxtase por estar com Estevão. Por um momento, a força da­quelessentimentos a amedrontou, porém resolveu es­pantá-los. Qual o problema se jánão era mais a mulher sensata e calma que acreditava ser? Caso se ma­chucasse,paciência. Como dizia o ditado, melhor amar e perder do que não ter amadonunca, lembrou ela, com alegre determinação.María foi até opátio onde uma linda mesa havia sido preparada para o jantar. O calor do diaagora dava uma trégua. Hamid ofereceu uma taça de suco a María que se sentousobre um sofá opulento e con­fortável para terminar de ler um artigo que haviaco­meçado durante o vôo.- O que estálendo? - perguntou ele. Os cabelos ainda estavam molhados, quando se aproximoudela vestindo uma bermuda muito elegante e camisa lis­trada, aberta no peito.María contousobre um político que foi flagrado traindo a esposa pela segunda vez em poucosmeses.- Tomara que aesposa mande-o passear. Balançando a cabeça com ar de reprovação, Maríasuspirou:- Acho ainfidelidade algo sórdido.- Nem sempre -retorquiu Estevão, disfarçando a surpresa e o desconforto com a opinião de María.- Não podeestar falando sério. - María ficou abalada com a resposta, pois se tratava deassunto que mexia muito com ela. - É algo que causa muita mágoa e tristeza.Imagina o que essa pobre mulher e seus filhos adolescentes estão sofrendoagora!- Édesagradável - concordou Estevão.- Muito mais doque desagradável - refutou María, levantando-se bruscamente. - É errado! Minhamãe traía meu pai com o melhor amigo dele.Isso destruiumeu pai. Nunca seria capaz de trair a confiança de alguém de forma tão vil.Honestidade é sempre a melhor solução e lealdade significa muito para mim.As sobrancelhasopulentas disfarçaram o brilho escuro dos olhos dele.- Dá paraperceber.- Se você nãofosse solteiro, pode acreditar, não estaria aqui agora.Estevãodisfarçou a expressão de surpresa com tal revelação, fez um sinal ao mordomopara que servis­se o jantar e ajudou María a se sentar. Foram leva­das à mesainúmeras travessas de comida, enquanto Estevão avaliava a situação. María nãosabia que ele estava noivo.Achavasimplesmente que o mundo todo sabia que ele estava comprometido com KristaSpyridou. Po­rém, María não tinha a menor idéia, pelo que tudo indicava.Obviamente, teria de contar a ela, reconhe­ceu ele, desanimado.Aquele momento,porém, lhe parecia uma péssima hora. Justamente após a defesa veemente de Maríaem prol da fidelidade não parecia adequado contar que estava noivo e que ia secasar com outra mulher. Principalmente porque María já havia dormido com ele epor estar seriamente determinado a convencê-la de que teria um futuro excelentecomo sua amante.- Seusprincípios são idealistas e românticos - comentou Estevão com tranquilidade. -Minha bisa­vó estaria de pleno acordo, mas ela tem mais de 90 anos e seusvalores são inflexíveis, rígidos.María comentou:- Pelo visto,sou uma mulher antiquada, mas o tempo e a experiência, certamente, não vãoalterar meu ponto de vista. Como são os outros membros da sua família?- Tenho umafamília enorme.- Que sorte asua.María comeu comapetite voraz, e os lábios zom­beteiros de Estevão não conseguiram evitar umsorri­so divertido.- Não sobrouninguém da minha família, e sinto muita falta dos meus parentes mais próximos.Quando jáhaviam terminado a refeição, uma brisa suave atravessou a fina seda do penhoare María se arrepiou, surpresa com a queda repentina da tempera­tura.- Está ficandofrio aqui fora.- As noites nodeserto são frias na primavera. - Estevão a pegou pela mão e a levou paradentro.Bastou um passodentro do quarto suavemente ilu­minado para que ela decidisse que queriadividir aquela cama com ele, de todas as formas. Por que le­vantar uma barreirasuperficial entre eles? Era mes­mo algo justo ou honesto, quando ela tambémansia­va por viver aquela experiência tão íntima e especial novamente?Com a cabeçabaixa, abriu um dos botões da ca­misa de Estevão. Uma timidez súbita quase adomi­nou; era um grande desafio pedir a ele que fizesse amor com ela, depois deter resistido durante o final da tarde.- Não precisaesperar mais - disse ela, final­mente, sentindo o corpo trêmulo enquantofalava.A declaraçãoinesperada surpreendeu Estevão ape­nas por alguns segundos. Sem perder tempo, aenvol­veu, erguendo-a nos fortes e imponentes braços.- Passarei aspróximas 24 horas na cama com você, pethi mou- Vá com calma- ela pediu timidamente. - E tenha cuidado.- Cuidado com oquê?Olhosbrilhantes e imponentes a fitaram, as so­brancelhas espessas piscavaminterrogativamente, como que pedindo queela se expressasse melhor.- O acidentecom o preservativo... - ela o lem­brou, demonstrando desconforto em tocar noassunto.- Esse é o tipode acidente que acontece uma vez na vida. Não está preocupada com isso, está? -Ele a censurou. - Sua menstruação atrasou?- Não... mas...- Então não hápor que se preocupar. Relaxe.Ele a deitou nacama com um sorriso reconfortante, que a convenceu de que seus temores eramdesnecessá­rios.

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