Capítulo 9

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CAPÍTULO NOVE O semblante de Estevão estava desfiguradode rai­va, a reação havia sido pior do que María havia pre­visto.- Achei que nãoteria problema falar o que qui­sesse com um advogado contratado pararepresentar meus interesses.- De ondeinventou isso? - desafiou-a Estevão. - A frase " o que quiser" émuito vaga e nunca leva­ria isso a público!- Mas você nãoteve qualquer problema quando estipulou que se nos divorciarmos ganhará aguarda das crianças - lembrou-o María. - Por acaso isso não é pessoal?Estevão ficouquieto, enquanto andava pela grande sala, depois se deteve e lançou um olharpara María.- Essa não é aquestão.- Essa éexatamente a questão - declarou ela. - Essa é a parte mais relevante docontrato pré-nupcial. Mesmo assim, você nem cogitou a hipótese de falar so­breisso comigo antes, pessoalmente. Claro que não.- Que querdizer com isso?- Como pôdedeixar seus advogados discutirem sobre a forma como posso perder meus filhos,quan­do é muito mais provável que você seja o culpado de causar nosso divórcio?A ofensa ao seucaráter deixou o rosto dele ilumi­nado.- Não aceitoessa acusação. Você está me agre­dindo.- Casamento éalgo que levo muito a sério. - María levantou a cabeça com altivez.Os olhosescuros de Estevão brilhavam, e ela sabia que era porque ele estava possuído pelacólera.- Eu também...por esse motivo fiz o contrato pré-nupcial. Mas não gostei nada de suasexigências. São descabidas!- Você não medeu outra opção. Fiz por precau­ção - respondeu María com convicção.- Tudo o que vêsão problemas e riscos. Não con­segue ter confiança e otimismo? Pois saiba queserei um ótimo pai - afirmou Estevão, sem hesitar. Outra coisa que o aborreciaera o fato de que havia gasto to­dos os seus minutos livres pensando nosdetalhes do casamento e, até agora, ela não tinha demonstrado nenhum interesse.- Não adianta,porque não vou assinar um contra­to que diz a forma como devo viver! Você nãosabe como é, porque nunca tentaram impor limites a você.O queixo de Estevãoergueu-se cheio de orgulho.- Isso porquetenho controle sobre mim e sei exa­tamente quais são meus limites - respondeu,brus­camente.- Você acha queessa atitude explica o que fez com Krista? - desafiou María, lutando com todasua força. - Comprometido com uma mulher e fa­zendo sexo com outra? Para mim éuma receita para o desastre.Aquelarecordação o deixou completamente sem reação. Ardia de raiva.-Não vou maisdiscutir isso com você - decretou, irritadíssimo, já na direção da saída. - Nãoposso.- Pode, sim -protestou María, assombrada pela ousadia dele de deixá-la falando sozinha.- Você estágrávida e não pode se alterar. Não podemos discutir desse jeito!Mesmo estandográvida, María chegou à porta da saída antes dele e bloqueou a passagem. Estavadisposta a ficar ali. Ele não sairia daquele quarto de jeito nenhum.- Não sejatolo... claro que pode discutir comigo. Sou forte. Aguento. Estou grávida, nãoestou doente. Não sou feita de açúcar.- Não, é feitade curvas gloriosas. - A mente dele estava atentamente fixada, sem vergonha, nafi­gura voluptuosa dela. Quando corria da cama para a porta, a toalha caiuvários centímetros, e os seios e os mamilos inchados chegaram a ficar poralguns ins­tantes no ângulo de visão de Estevão.María o olhoue, de repente, ficou arrepiada. On­das maliciosas de calor espalharam-se portodas as partes sensíveis do seu corpo. Sabia que se permane­cesse tão pertopor mais um segundo Estevão ficaria à vontade para usar o sexo como maneira dedesviar a conversa. María se afastou da porta e criou mais distância entre osdois.- Não temos oque discutir... só precisamos con­versar. - María tentou chamá-lo a razão,calma­mente.Estevão nãoqueria conversar. Queria arrancar aquela toalha e abraçar o corpo deliciosodela, até que os pensamentos e a raiva cessassem e o prazer e a volúpia osatisfizessem.- Por favor,não vá embora - pediu María, de­sesperada pela companhia dele. - Eu realmenteque­ro que nosso casamento dê certo.Um pouco datensão cedeu, e os dois ficaram fren­te a frente, olho no olho.- Não queromandar na sua vida ou tirar sua liber­dade. Você entendeu tudo errado - elaassegurou. - Sei que isso nunca daria certo.Estevão estavamais relaxado e apoiou os ombros contra a porta para descansar.- Quero dizerque, na minha opinião, a escolha é só sua. Se quiser, podemos viver umcasamento de fa­chada.- Fachada?- Para ascrianças. Compartilharemos as coisas boas com nossos filhos e você pode fazertudo que quiser com outras mulheres.Estevãocongelou. Não tinha idéia do que iria res­ponder. Sabendo a linha de pensamentode María, duvidava muito que estivesse falando com sincerida­de. A declaração odeixou cheio de ciúme e descon­fiança, pois em vez de soar liberal ecompreensiva a frase parecia vir de uma libertina.- Que querdizer?- Bom, proponhoum casamento aberto. Basica­mente, teríamos nossas vidas separadas.- Separadas? - Estevãoestava sendo invadido por vibrações perturbadoras.María corou.- Obviamente,não compartilharíamos o mesmo quarto.Estevão fez quenão com a cabeça arrogante, rejei­tando a idéia enfaticamente.Maríacontinuou, ignorando a expressão de des­gosto do futuro marido.- Se não podeser fiel, esse tipo de casamento se­ria a melhor opção para nós dois.Estevão forçoua coluna contra a porta como se ti­vesse acabado de acordar. Seu silênciodeixou María ainda mais nervosa.- Haveriabenefícios, claro. Pelo menos, nos aceitaríamos tal como somos.- Eu como umpecador eterno e você como uma santa reprimida? - respondeu Estevão com um ci­nismoatroz.- Não. Aospoucos, iríamos esquecendo... bem, você sabe... que tivemos relações sexuais -murmu­rou María sem graça. - E, então, nos tornaríamos bons amigos.Estevão fez quenão de novo com a cabeça e apon­tou o polegar para baixo como um imperadorromano declarando a sentença de morte.- Pelo visto, asegunda opção é aceitar a cláusula absurda que quer me impor e ser multado emmilhões e milhões se infringir suas regras?María fez umacareta.- Apenaspreciso que leve nosso casamento a sério. Estevão suspirou.- Se eu fizer oque você quer, vamos dormir na mesma cama? Não! Esqueça... a Grécia não produzcovardes que se deixam mandar pelas mulheres.- Onde estáescrito que um grego magnata pode ter uma amante? - atacou María com um senti­mentofurioso de frustração. - Não sou suficiente para você? Qual seria sua reação seeu tivesse um amante?Toda apretensão de relaxamento desapareceu, Estevão se afastou da porta e foi nadireção dela com movimentos e um olhar ameaçadores.- Nem pensenisso. Não toleraria nem que flertasse com outros homens. Nem em sonho!María lançou umolhar irônico para ele.- Prefiro nemfazer um comentário óbvio sobre essa sua atitude.- Theos mou...está me chamando de hipócrita?- Suponho quenão tenha importância. Tudo indi­ca que esse casamento não vai sair mesmo.Afinal, parece que nenhum dos dois vai assinar o contrato pré-nupcial.O silênciotenso invadiu o recinto e Estevão soltou um suspiro cansado. Os traços morenose belos esta­vam melancólicos. Observava-a com uma intensida­de extraordinária.Não iria se render. Nunca se ren­dia.Sem dizer maisnada, saiu do quarto. Desceu as es­cadas e pediu que a limusine o fosse buscar.Enquan­to esperava, serviu-se de um copo de conhaque. Esta­va tão furioso queandava de um lado para o outro, como um tigre preso em uma jaula. Quando alimusi­ne chegou, ficou em dúvida se deveria partir ou não. Tinha vindo parapassar a noite, e ficaria. Era ela quem estava acostumada a fugir dosproblemas, não ele. Franziu a testa. Reconhecia que a tinha pressio­nadodemais, o que acabou afetando a capacidade de María de confiar nele.Talvez nãofosse justo culpá-la por isso. Mas já não tinha mais amante, considerou,tomando mais uma dose de conhaque, irritado. Os advogados ti­nham lheaconselhado a formular a tal cláusula que lhe dava o direito da guarda das criançasem qualquer circunstância. Obviamente, María não entendia que o contrato era,principalmente, para resguardar a for­tuna Petrakos. Não entendia porque nãoera ganan­ciosa. Havia sido a única mulher que tinha ignorado o tamanho dariqueza dele e tratado Estevão como um homem comum.Provavelmente,refletiu ele, ela também não fazia idéia de que os casamentos na famíliaPetrakos ti­nham, quase sempre, uma história longa e infeliz. Di­vórciosamargos, batalhas nos tribunais pela guarda das crianças e escândalosexplosivos haviam atingido todas as gerações. Com exceção do casamento dosbisavós, que tinham sido o último casal feliz da fa­mília.Rodas Petrakoshavia se casado com o amor da in­fância, Dorkas, apesar de toda a oposição deambas as famílias. Não houve contrato pré-nupcial e, apesar das brigas e dosaltos e baixos da relação, o casal per­manecia unido com amor e respeito. Aolongo de todo o processo, haviam aprendido a ceder, a com­partilhar e ouvir.Advogados nunca precisaram inter­mediar qualquer crise. Talvez, ponderou, nãoesti­vesse sendo sábio ao deixar desconhecidos se meterem em sua vida privada.De fato, o acordo e aquela conversa deveriam ter deixado María insegura e in­timidada.Alguém bateu naporta e María se sentou na cama.- Sim?Estevão entrou,sem o terno e sem a gravata. A ca­misa azul estava aberta, deixando à vista opeito es­belto e definido.María piscou,surpreendida. Havia escutado a li-musine partindo e estava certa que Estevãotinha ido embora.- Ainda estáaqui? Estevão fez que sim.- Tenho um vôomuito cedo amanhã. Não faz sentido sair daqui. Até eu preciso dormir.María lembrouque os olhos estavam vermelhos e inchados, porque havia chorado, mas, para suasor­te, ele não a olhou diretamente. Em vez disso, estava com a atenção nodetalhe da cama com adornos talha­dos em madeira.- O que vocêtem? - perguntou, preocupada.A cabeça sempreereta e exibindo confiança estava cabisbaixa. Ergueu-a ao ouvir a pergunta.- Tomei umadecisão. Vamos esquecer esse con­trato pré-nupcial. Não é necessário.María ficouconfusa e aturdida. Quase chegou a perguntar quais seriam as novas exigências,mas pre­feriu manter-se calada, e suspirou aliviada preparando-se para o piorpossível. Estaria ele se defendendo? Ou, ainda, pensando nas opções que elaoferecera? Depois de tantas perguntas, chegou à conclusão de que o confrontonão daria resultados positivos. Preci­sava ser mais sutil. Afinal, nãoimportava o quanto brigassem, ela o amava e sabia que ficaria muito tris­te semele.- Está bem... -concordou María. - Está pre­cisando fazer a barba. Parece um pirata - acrescen­touela sem pensar.A tranquilidadede não ser atacado com perguntas permitiu que um sorriso se estampasse em seurosto.- O barco eu játenho - brincou ele. - Falta a espada e o papagaio.Ela riu.- Já émadrugada, pedhi mou - disse ele em voz baixa. - Deveria descansar.- Ficacomigo... - pediu ela automaticamente, sem raciocinar.Depois de umsegundo de hesitação, Estevão se aproximou. María ficou imóvel e mal conseguiarespirar, pois a presença dele sempre a deixava ner­vosa e ofegante. Com osbraços, ele a envolveu e a puxou para mais perto.- Precisadormir - disse ele. - Parece muito cansada.María nãoprecisava que lhe dissessem isso. Sa­bia de sua condição física, mas o calor deEstevão, seu cheiro inconfundível e inebriante e a textura deli­ciosa da pele adeixavam excitada demais. Mesmo cansada, o desejo de tê-lo mais intimamentenunca a deixaria descansar.Estevão passouas mãos por debaixo da camisola e parou na cintura.- Posso? -perguntou em voz baixa.- Faça o quequiser - respondeu ela com uma voz sedutora e convidativa, sentindo calafriospelo corpo.Na verdade, erao formato do corpo dela que pro­vocou seu interesse. As mãos fortes e os dedoslargos foram gentis ao começar a brincar e explorar a barri­ga volumosa.- Incrível... -sussurrou ele.Estevão sentiualgo mexer com força dentro de María.- É um dosbebés chutando? - perguntou as­sombrado.- Sim, sãomuito ativos. María escutouum idioma estrangeiro no salão ao lado e sorriu. Seu casamento ia ser uma cerimôniage­nuína e exclusivamente grega. No dia anterior, havia chegado de iate pelomar Egeu. Determinado a pre­servar ao máximo sua privacidade e a de María, Estevãohavia feito questão de guardar o local do ca­samento em absoluto segredo paranão ter a surpresa desagradável de ver algum paparazzo no dia da festa. Sabendoque María não tinha família nem amigos íntimos para servirem de padrinhos decasamento, Estevão convidou duas primas para representar esse papel. Ambas,Apollonia e Desma, eram apaixonadas pelo primo. Muito espirituosas, rapidamenteficaram à vontade na presença de María.Em determinadomomento, María ficou curiosa quando as duas começaram a conversar entusiastica­menteem grego.- Deve ser ummexerico bom, hein?As irmãspararam de conversar na mesma hora e se olharam constrangidas e tensas.- Mexerico? -perguntou Apollonia, preocu­pada.- Estoubrincando.- Ah, brincando- repetiu Desma com um suspi­ro aliviado.- Há algoerrado? - perguntou María notando algo estranho no ar.Apollonia, airmã mais velha, se aproximou e dis­farçou.- Não, imagina!Não há nada de errado. Você está linda, María.-- Esse vestidoé fantástico - disse María, ro­dopiando na frente do amplo espelho, tentando ver-sepor todos os ângulos possíveis. Pequenos adornos de pérola enfeitavam openteado que haviam feito com esmero e paciência. Sentia-se glamourosa pela pri­meiravez na vida. Um magnífico pingente de dia­mante em forma de coração brilhava nopescoço. Era um presente de Estevão, que dera durante o café-da-manhã.- Não é ovestido, você que é linda - corrigiu Desma. - Quando todos a virem, vãoentender por­que Estevão se apaixonou por você.Os olhos de Maríaescureceram. Foi à janela da cabine e se deu conta que após 24 horas emalto-mar o iate finalmente se aproximava de terra firme. Lem­brou que poucotinha visto Estevão nas últimas três semanas. Na noite em que dormiram juntos,ele não a tocou, e, quando María acordou, no dia seguinte, Estevão já havia partido.Na verdade, nãofaziam amor desde o Marrocos. Recentemente, o vira apenas três vezes. Ele haviaes­tado estranho, beijando-a apenas na testa ou na face, como se María fosseuma senhora de idade ou uma criança pequena.- Essa é Libos- informou Apollonia, aproximando-se de María e apontando pela janela. - O queé melhor que uma ilha particular para uma cerimônia de casamento reclusa ediscreta?O telefonetocou e Desma atendeu, passando-o, em seguida, para María.- O que acha dofuturo lar? - perguntou Estevão.Uma mata verdee exuberante corria por toda a ex­tensão da ilha, acompanhando a areia branca ea lím­pida água azul. A vila que podia ser vista no alto era pitoresca egraciosa, repleta de casas brancas e um porto, na costa.- É realmentelindo... soa brega, mas parece um cartão-postal... desses que dá vontade deentrar - respondeu ela, timidamente.- Por que nãovai até o deque? A vista é bem mais bonita de lá?María foi paraa varanda atrás do quarto. O cabe­lo estava embalado pela suave brisa do mar.Ainda no telefone com Estevão, sorriu quando ele descreveu alguns dos várioslocais turísticos que podiam ser vistos do barco.- Cadê você? -perguntou ela.- Aqui noporto, tomando meu último drinque como homem solteiro. Nos vemos daqui a unsdez minutos, pedhi mou.A voz familiare segura a tranquilizou, deixando-a um pouco menos ansiosa com o que estava porvir. O iate atracou e a tripulação se despediu de María e desejou felicidades aela antes que desembarcasse. María ficou encantada ao ver os cavalos brancos ea carruagem que a esperava no porto para levá-la ao al­tar. A igreja tinha umaenorme torre com um sino, ze­lando pela elegante e pequena vila.Estevão desceuas escadas da igreja para ajudá-la a sair da carruagem. Vestido com um terno tradicional,e o cabelo brilhando pelos raios do sol, a expressão de seu rosto era de puraalegria ao sorrir. Estava ex­tremamente irresistível. No instante em quedesceu, María notou o olhar atento e cheio de admiração de Estevão sobre ela.- Você está lindademais.- Gostou dovestido?Estevãoagarrou-a pelos braços e a retirou da car­ruagem. Seus olhos estavam brilhantese carregados de desejo masculino.- Muito, muitosexy - sussurrou-lhe ao ouvido.- Mas nãorevela nada! - respondeu ela, descon­fiada.- Tenho umamemória fotográfica - falou Estevão maliciosamente, enquanto a colocava no chãocom cuidado.De repente, Maríase perguntou por que havia fi­cado tão tensa e nervosa por causa da cerimônia.Afi­nal, não estava se casando com o homem que amava?A igreja estavaabarrotada de pessoas. Todos sus­piraram quando o casal entrou. María notou osbe­los arranjos de flores distribuídos pela pequena igreja e a decoração simples, porém impecável, e o cheiro deincenso que invadia o ambiente. A cerimônia co­meçou e o ritual ortodoxo chamoua atenção de María desde o início. Ficou transbordando de emoção quando osfamiliares banharam os recém-casados com pétalas de rosas.Depois da cerimônia,a carruagem fez um passeio pela cidade antes de tomar o caminho da festa. Avila Petrakos era muito mais antiga do que María havia imaginado. Estevãoexplicou que a família habitava aquela ilha havia mais de um século. Estevão aadqui­rira recentemente para protegê-la da especulação fi­nanceira e dodesmatamento. Rodeada por um jardim espetacular que se estendia até a praia, acasa, magní­fica, tinha uma vista maravilhosa do mar.Na recepção, Estevãoficou ao seu lado todo o tem­po, e María foi sendo apresentada, aos poucos, aosamigos e familiares. Os nomes e rostos rapidamente se confundiam.O número deconvidados era espantoso. A maioria falava inglês, mas María já arranhavaalgumas pa­lavras em grego. Durante o jantar, que durou horas, tentou ignorar ascentenas de olhares sobre ela, mas não se sentia à vontade.- Por que estátodo mundo me olhando assim? - perguntou, finalmente, a Apollonia.Depois devárias taças de champanhe, a jovem Apollonia já dava risadinhas ébrias, incapazde segu­rar a língua.- Quantasrazões quer? Hoje você virou uma mu­lher muito influente, porque é a esposa deum homem bastante poderoso e rico. Outro motivo é porque roubou Estevão, naúltima hora, de Krista. A família está muita curiosa, querendo saber se ascoisas que saíram nos jornais são mesmo verdadeiras!- Que jornais?- perguntou María surpresa. Apollonia tapou a boca com as mãos, caindo em si.- Estevãoavisou que você não podia saber disso. Por favor, não fale que fui eu quemcontou!Com essasúplica, a madrinha se retirou.Minutos depois,Estevão a levou até a pista de dan­ça. Enquanto dançavam, María tentou guardara curiosidade, mas acabou não aguentando.- O que saiunos jornais sobre mim? Foi em um jornal inglês?Estevãotensionou o maxilar em sinal de contrarie­dade.- Foi. Meusadvogados já estão cuidando disso.- Mas o quedizia?- Nada quevalha à pena contar?- Eu insisto.- Insistir nãovai adiantar, pedhi mou - falou Estevão, francamente. - Você agora é da famíliaPe-trakos. Somos superiores a esses tablóides.- Não falecomigo como se fosse uma criança - queixou-se María em voz baixa.O rosto de Estevãoficou ainda mais sombrio.- Então,comporte-se como uma adulta. Esse é o nosso casamento e você está fazendo umpapelão, discutindo na frente dos convidados.- Aposto queKrista não se comportaria muito melhor do que eu - retrucou, insolente.- Ocomportamento de Krista em público sempre foi impecável - rebateu ele,secamente.Os dois ficaram em silêncio até o términoda música. Tão logo acabou, María saiu da pista e procurou um lugar pacato ondepudesse ficar sozinha. Cogitou sair da festa, quando uma bengala caiu na suafrente.Ela a apanhou edevolveu para uma velhinha pe­quenina, sentada em um canto próximo.- Deixou cair,minha senhora...Uma mão fraca eenrugada a tocou.- Venha sesentar comigo. Sou Dorkas, a bisavó do seu marido.Sem hesitar, Maríase sentou.- Estevãosempre me lembra meu falecido mari­do, Rodas - confidenciou. - É cabeça-dura,não tem paciência e é esperto demais.María corou esorriu com a descrição.- A senhora oconhece muito bem, mesmo.- Mas Rodas tinhaa sorte de ter nascido em uma família carinhosa, ao contrário de Estevão - con­cluiuDorkas, mordendo os lábios antes de perguntar a María: - Quanto sabe sobre opassado do seu ma­rido?- Ele não gostade falar sobre isso. A senhora suspirou.- Os pais delenunca deveriam ter tido filhos. To­dos os dias eram de festa para eles. Estevãofoi criado por empregados. A mãe era viciada em drogas, mas o assunto eraacobertado para evitar escândalos. Estevão nunca conheceu o amor ou aestabilidade, uma prova de carinho por parte dos pais. María teve dó do marido.- Não fazia idéia.- Quando tinha16 anos, a única pessoa que o amava de verdade naquela casa morreu, e Estevãofi­cou completamente perturbado por um tempo. Feliz­mente, voltou a encontrar oequilíbrio. É um homem muito forte - afirmou Dorkas cheia de orgulho dobisneto. - Mas precisa de uma mulher igualmente forte, que saiba suavizar seulado severo e cético com muito amor e compreensão.A conversa comDorkas estava acalmando María.- Rodas e eutínhamos muitas brigas, mas quando alguém se atrevia a dizer algo contra mim,ele virava fera - declarou a bisavó.María sorriu.- Está sabendodo jornal, não está?- Tenho umacópia na minha bolsa.- Posso ver?Dorkas passouas folhas dobradas a María. Era uma cópia que um amigo lhe havia mandado porfax. María fez uma cara feia ao ler a manchete: Funcio­naria temporária roubaPetrakos da herdeira Krista.- Estevão nãofoi roubado - riu Dorkas. - Não era feliz com Krista. Você é uma menina doce etra­balhadora, e merece ser feliz.Os olhosescuros se fixaram em María e na bisa­vó Dorkas. Estevão não perdeu tempo em iraté elas. Gostou de vê-las juntas e esboçou uma risada de sa­tisfação.- O que achoude minha noiva? - perguntou à bisavó, em grego, sem disfarçar a curiosidade. Um sorriso radiante estampou-se na face deDorkas, que deu um tapinha no joelho de María.- Esta menina éum tesouro. Cuide bem dela.Estevãosentou-se para falar com ela, brevemente.


Em seguida, umcantor famoso na Grécia, que havia sido contratado por Estevão,iniciou o show. As pessoas no salão entraram em êxtase.


O céu estavaescurecendo quando Estevão levou María para um dos terraços privados, protegidopor plantas e árvores. Beijou-a sem pressa e com volúpia. Um frio na espinhadeixou María toda arrepiada.- Tem umaescada atrás da porta. Nossa suite fica nofinal dela. Eu encontro você lá daqui a cinco minutos - prometeu ele.- Mas nãopodemos desaparecer assim da festa.- Podemos, sim- respondeu ele de imediato, saboreando a boca carnuda dela com mais fervorainda.- E nossa noitede núpcias, ágape mou.A suitegigantesca e linda tinha as luzes baixas e íntimas. E havia o perfume das rosasespalhadas pelo ambiente.De repente,alguém bateu à porta. Achou que fosse Estevão, mas quando a porta se abriu viua emprega­da com o telefone na mão.- Alô... quemfala? - María franziu a testa, sentindo que a chamada não era para ela e de quea qualquer momento alguém começaria a falar em grego.- Krista.Maríaempalideceu e a mão que segurava o fone começou a transpirar de nervoso.- Por que estáme ligando?- É sua noitede casamento e quero que saiba que a única coisa que mudou foi que trocamos ospapéis - disse Krista docemente. - Você agora é a oficial e eu, a amante. Estevãonão tinha a intenção de me deixar. Achou que fosse? A única coisa que importapara ele é que você esteja satisfeita e sob controle, porque está grávida deseus preciosos gêmeos. Eu continuo sendo importante para ele, como sempre fui.Depois dessaspalavras, Krista desligou. Que mulher vingativa, pensou. Obviamente, nãoestava falando a verdade. Eram mentiras rancorosas só para deixá-la insegura epreocupada, disse a si mesma, convencendo-se de que já não era tão ingênua paracrer em tanta bobagem. O casamento, até agora, estava incrível. Amava Estevãoe havia aprendido a confiar nele. Por que poria tudo a perder, por causa daspalavras de uma mulher irada e rancorosa?

Amor sem fimOnde histórias criam vida. Descubra agora