Capítulo 3: Vou contar uma história

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Mariana não sabia o que pensar. Em qualquer outro caso teria imediatamente gargalhado e ignorado como se fosse uma brincadeira qualquer — quem nunca brincou sobre algo ou alguém ser um príncipe disfarçado — mas alguma coisa no olhar ou mesmo nos gestos de Bernardo a fez vacilar. Ele tinha de estar brincando, certo? Só que de repente ele parecia urgente demais, ansioso para fazê-la acreditar, medindo as palavras como se ela pudesse sair correndo a qualquer momento. O que de fato ela estava cogitando fazer.

Havia contratado não um ladrão, mas provavelmente um louco.

— Por favor... — ele pediu mais uma vez. Seus olhos refletiam sua ansiedade e havia neles uma solidão e certo grau de desespero e desesperança que a fizeram ficar. Mari cruzou os braços de novo.

— Certo, você pode se explicar antes que eu considere estar falando com um louco.

— Que bom. — E havia realmente alívio em sua voz, mas a cautela continuava reverberando por cada poro de seu corpo.

Ao longe, a voz de Marta chamava por Mari para almoçar. A cabeça altiva de Majestade virou-se na direção do som e as narinas cor de rosa dilataram.

Mari se afastou, aliviada.

— Talvez mais tarde você possa se explicar melhor. — Ela lançou um último olhar para Majestade.

Então o deixou rápido, confusa. Por que a resposta de Bernardo a deixara tão perturbada? Provavelmente era apenas uma brincadeira, assim como ela e as irmãs brincavam quando eram menores, sobre príncipes que viriam salvá-las do alto da torre — que era uma pilha de almofadas em cima da cama — não havia motivo para se perturbar por uma brincadeira boba. Bernardo provavelmente estava apenas tentando chamar atenção utilizando contos de fadas e cavalos brancos que são montarias de príncipes de faz de conta.

Se ela tivesse um cavalo branco também se sentiria tentada em algum momento a dizer que ele era o cavalo do príncipe. Não havia motivo para pânico.

Mas o problema era que as palavras de Bernardo deram uma luz nova a Majestade, foi como se mecanismos rodassem e rodassem até encontrarem um eixo ideal, que fez tudo ter sentido: Majestade era encantado.

Isso podia explicar o fascínio dela e a estranha conectividade que sentia cada vez que os profundos olhos azuis do cavalo focavam os olhos dela. Ou os de Bernardo.

E eles sempre a olhavam nos olhos.

Mariana só se deu conta de que chegara quando a varanda se impôs em seu caminho. Ela parou com a mão sobre os balaústres, observando o estábulo ao longe, além da linha das árvores e das cercas de madeira. É óbvio que não acreditava no que Bernardo dissera.

Mas sentia que podia vir a acreditar.



Majestade corria pelo pasto como um raio de luz, uma mancha branca em movimento. Ele corria de um extremo a outro, até perder-se de vista, e então retornava para perto de Bernardo. Às vezes parava para observar um boi ou um outro cavalo, depois retomava a corrida. O pelo branco refletindo o sol, quase prateado em seu esplendor. Ele sorriu, era difícil não encontrar alguém que olhasse para Majestade com certo encanto, até ele não era imune à magia que o rondava.

O que às vezes o preocupava era que Majestade antes parecia muito mais um humano aprisionado em sua maldição, mas com o passar dos anos Bernardo vinha notando que ele estava se afastando, se esquecendo de quem era por baixo do pelo branco e do corpo imponente do cavalo. O humano dentro dele estava se perdendo e Bernardo não sabia o que fazer. Como fazer pessoas acreditarem em contos de fada? Em maldições?

Majestade: A história do Cavalo BrancoOnde histórias criam vida. Descubra agora