Sexta folha

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Via e arrumava os vestidos com o cheiro dela,aquele cheiro de bebê ou cheiro de manhã,era algo único dela,não sei explicar corretamente,mas era um cheiro de algo bom. Talvez pelo o simples fato de ser uma parente minha e por conviver com a menina de cabelos loiros por tanto tempo,praticamente trinta anos. Minha situação emocional tinha estado a um novo ponto. Felicidade. O que me surpreende já que isso dura pouco. Mas é o que me admira,e isso que me faz bem.
Estava quase terminando de arrumar a mala,estava dobrando a manga de uma camiseta  vermelha com botões e Gola branca de tricô quando ouvi uma pequena discussão entre meus pais:
  - O GAROTO JÁ ESTÁ AQUI A MAIS DE TRINTA E DOIS ANOS
  - FODA-SE HENRIQUE.
  Eles brigaram por minha culpa,ótimo,realmente perfeito...Sai um pouco do quarto e me apoiei no primeiro degrau da escada que levava ao meu quarto e ao antigo quarto de Marina. Isso me lembra quando tinha quinze anos. Vivia na escada por que nunca sobre pra onde ir,vivia lá. As vezes pegava o rádio e esperava ouvir um jogo de futebol ou uma música para aprofundar minha solidão.
Quando conseguia. Era raro,por que sossego é uma coisa inédita para mim. Alguém sempre ia me chamar,ou minha mãe ou meu pai ou Marina. As vezes eu lia romances ou jornais. Ouvia sobre a industrialização...Era jovem,mas me interessava
Mas,de volta ao assunto...Dona Rosa ou minha mãe estava discutindo
  -Henrique,querido,ele é  nosso filho!
  - Entendo e por isso quero que ele viva!
  - Mas,ele vive bem aqui,amor.
  - Não há mulher que queira essa praga!
  - NÃO FALE ISSO DO MEU FILHO!
  - Nosso. Filho,Rosa.
  - Você não trata ele como um.
  - Sempre quis ser pai,amor. Queria ser o exemplo,o herói,um pai. Mesmo que fosse menino...
-Mas....
  - Queria alguém para ensinar a jogar futebol,queria alguém para brincar,para  contar histórias antes de dormir,pra abraçar apertado...A coisa que me fez feliz foi saber que era pai. Tudo que queria era um filho,alguém que pudesse me relacionar que fosse como eu,mas o que eu ganhei foi um menino quieto,sem sal,fraco,chorão e esquisito...Acho que nunca fiquei tão decepcionado...Queria ter feito mais coisas antes. Queria ter saído mais com você,amor,queria ter saído nas ruas com meus amigos
  - Querido...
  - Acho que a pior coisa que aconteceu comigo foi ele ter nascido
  ...
Estava no primeiro degrau de cima das escadas e sussurrei enquanto chorava:
  - Me desculpe,pai.
  - Fernando? Minha mãe disse preocupada
  - Também não queria ter nascido
  - Não,meu anjo não acredi...
  Desci as escadas com mala nas mãos,sai pela a porta o mais rápido que pude. Comecei a chorar,andava com a cabeça baixa,chorava e andava segurando a mala em direção a casa. Ia pelas as ruas iluminadas com belos postes,e lojas coloridas,o matagal era pouco intenso,mas deixava o lugar mais belo,as ruas e vielas de pedra me encantavam,mas minha tristeza era maior...Após caminhar lentamente segurando a mala,quando ouvi uma voz
  - Fernando..?
  Era Marina,e ela tinha me visto...Me pergunto o que ela estaria fazendo ali.
  - Marina..?
  - Deus!!Por que está chorando?
  - Não estou chorando!
  - Percebo. Ela riu
  - ...Posso te perguntar algo?
  - Lógico!
  Encostei a testa no tórax dela segurando os braços dela
  - Você queria que tivesse nascido..?
  - Lógico...Foi algo que nosso pai disse, não é?
  - Sim...
  - Sabia. Sim,queria que tivesse nascido,na verdade, foi ótimo isso. Você é o melhor presente que podia ter. Ela disse passando a mão na minha cabeça...
  - Ob-obrigado...
  - Tudo bem. Irmãos são para isso.
  Ela estava muito bem arrumada,tinha um vestido novo,azul marinho com bordas provavelmente feitas a mão tinha um laço de ponta cortada nas pontas,no fim do vestido tinha flores como margaridas desenhadas no tecido azul como o mar,era até o joelho,usava um batom bem vermelho e seu cabelo estava penteado,mas continuava com as trança de cabelo para o lado esquerdo,estava também com uma presilha na franja de cor preta,tinha sandálias pretas e rasas,e um lindo colar fino com uma jóia no meio.
Estava linda para um encontro normal.
  - Aonde vai,Marina..?
  - Numa festa!!Venha!Isso vai melhorar o seu humor!!
  - É sobre comunismo?
  - Não!É uma festa!
  - Okay
  - Vai ter música...E sabe que qual vou pedir?
  - Não.
  Ela parou por um estante,pegou a mala começou a fazer uma batida com a mala enquanto batia o pé para soar melhor,afinou a garganta e começou a cantar docemente:
  - Oaira raio,obá obá obá....Ooooo oo Oaira raio.
  - Mas que nada. Eu ri
  - Sim!Nossa música!Agora vamos

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