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          Passaram-se alguns dias sem que eu ou Miguel tocássemos no assunto do meu passado doloroso. Ele entendeu que eu estava lhe dando o tempo que ele precisava, sem que eu precisasse dizer alguma coisa. Essa capacidade de entender um ao outro sem precisar de palavras denotava o quanto nosso amor era peculiar. Na sexta feira quando voltávamos do trabalho ele resolveu se pronunciar a respeito e me pediu para concluir a história naquela noite.

- Antônia se tiver tudo bem pra você eu gostaria que terminasse sua história hoje. Pode ser? – perguntou em tom mais sério que de costume.

- Por mim tudo bem. E quanto a você? Você está pronto pra ouvir? Estou notando sua apreensão com relação a esse assunto.

- Estou pronto sim. O problema é que isso tudo me deixa desconfortável demais. Na minha cabeça é impossível imaginar uma criança sofrendo assim. Meu instinto de justiça fala mais alto e me faz sentir coisas terríveis brotando dentro de mim. Esses dias tenho me deparado com sentimentos até então desconhecidos. Nunca senti ódio de ninguém como sinto desses caras que te fizeram isso.

- Não deixe que esse sentimento tome conta de você meu amor, eu sei o que é odiar e posso te garantir, o ódio só faz mal a quem o sente. Tudo isso é passado, eu já superei com a sua ajuda e espero que você também supere. – falei tentando dissuadi-lo de pensamentos destrutivos, na verdade ainda tenho muito o que superar.

- por você meu amor eu vou tentar. – disse acariciando meu rosto.

Após o jantar nos deitamos no sofá e recomecei a contar minha história para Miguel. No fundo eu sabia que seria libertador contar tudo, dizer toda a verdade nos mínimos detalhes estava me fazendo lidar diretamente com a dor a ponto de conseguir combate-la. Mirei meu rosto em um ponto invisível na parede e recomecei de onde havia parado dias antes.

Depois que minha amiga foi embora passei alguns anos sem constituir amizades sólidas. Tinha algumas colegas de escola, fazia trabalhos escolares com elas, ia passear, e, conseguia ter um relacionamento amigável com os garotos da minha turma.

Não pensava em namorar de jeito nenhum e quando algum rapaz se aproximava com essa intenção eu erguia um muro intransponível entre nós. Meus pais acharam que eu tinha problemas de relacionamento e até que não gostasse do sexo oposto.

Tudo piorou quando eu tinha dezessete anos e precisei ir a uma viagem da escola. Lembro que não queria ir de jeito nenhum, estava com um pressentimento ruim sobre aquilo, porém, minha mãe foi até a escola e a professora falou que a viajem seria tema da prova final e que eu não poderia deixar de ir. Infelizmente não tive outra alternativa a não ser comparecer. No dia e hora marcados lá estava eu pronta na porta da escola. Confesso que fiquei aliviada ao ver que motorista do ônibus era meu tio, achei que se precisasse ele poderia me proteger.

Viajamos para uma cidade histórica a cerca de trezentos quilômetros de onde morávamos. A viajem duraria de duas a três horas. A ida ocorreu normalmente e o dia foi tranquilo. Visitamos diversos pontos históricos e culturais, almoçamos em uma antiga fazenda, visitamos construções do século passado, igrejas, casarões e sobrados. Por ultimo para encerrar o dia fomos a um festival de comidas regionais.

Tudo parecia ir muito bem até que meu tio me chamou pra ir com ele buscar alguma coisa no ônibus. Como já estava de noite, o estacionamento dos ônibus estava muito escuro e deserto. Todos estavam entretidos se divertindo com as bandas regionais e as danças típicas. Não vi problema algum em acompanha-lo afinal era meu tio e ele falou precisar de ajuda com umas caixas, então eu fui.

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