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          Acordei ainda com uma enorme dor de cabeça. Miguel dormia feito um anjo abraçado comigo. Parecia querer me proteger do mundo. Com cuidado pra não acorda-lo retirei seu braço da minha cintura e levantei devagar. Depois de um banho e minha higiene matinal fui aos meus afazeres. Organizei o jardim e aprontei o café da manhã. Resolvi tomar um chá pra tentar aliviar a dor. Me distrai com a xícara na mão e o olhar perdido através da vidraça em direção ao jardim. Era duro pensar que não conhecemos as pessoas como imaginamos. Tivera muitas experiências desse tipo. Parecia ter um imã pra atrair gente falsa. Indivíduos acima de qualquer suspeita e que agiam como amigos pra ferrar com tudo em seguida.

Senti braços fortes em minha cintura e beijos quentes desde meu ombro até o lóbulo da minha orelha. Receber um bom dia caloroso assim melhorava o astral de qualquer uma.

- Bom dia meu amor. Senti sua falta na cama. – disse e continuou a sessão de beijos e leves mordidinhas.

- Acordei com dor na cabeça. Resolvi tomar um chá pra melhorar. Falei meio cabisbaixa. Miguel sabia que não era só dor na cabeça que eu estava sentindo.

- olha pra mim meu bem. – disse me virando de frente para ele. – Eu sei que esta situação é difícil pra você, mas terá que fazer uma escolha. Ou você agradece por ter se livrado de um encosto em sua vida, ou continua se martirizando pela suposta "amiga" que já foi tarde.

- Prefiro a primeira opção. Você tem toda razão. Ela que me fez o mal e não vou sofrer por quem não merece.

- Assim é que se fala. Mudando de assunto... Pensei em uma coisa ontem enquanto você dormia. O que você acha de irmos visitar seus pais hoje e só voltarmos amanhã. Semana que vem viajaremos pra casa dos meus pais, acho que é justo seus pais receberem uma visita também.

- Amor você é incrível. Adorei a ideia. Vamos sim. – o abracei mais forte que pude para mostrar o quanto ele me fazia feliz.

Tomamos café e eu arrumei uma pequena mala pra nós. Falei pra Miguel que vamos ficar no meu quarto. Meus pais não precisam saber o que fazemos lá e, pra ser bem sincera eles não ligam pra essas coisas. Minha mãe costuma dizer que o importante é que eu esteja feliz. Amo muito meus pais e a compreensão deles sempre foi meu alicerce.

- Amor! Não vamos ter problemas com seu pai por dormirmos no mesmo quarto?

- Claro que não. Meus pais sabem que você dorme comigo aqui em casa. O que eles não sabem é dos detalhes.

- Não sei em que isso me ajuda. Seu pai agora vai achar que transo com a filha dele e não fui homem suficiente pra casar com ela antes disso.

- Deixa de ser bobo Miguel. Meu pai não vai pensar nada disso. Se você for ficar mais tranquilo falo pra eles que apenas dormimos, que não aconteceu, nem acontece, nada, além disso.

- Por mim tudo bem. Prefiro que eles saibam a verdade.

Percorremos o restante do caminho conversando e ouvindo musica. Chegamos à casa dos meus pais por volta das nove da manhã. Mamãe e papai fizeram questão de nos receber ainda no jardim, estavam surpresos com uma visita inesperada e ficaram super felizes em nos ver. Miguel tirou a mala do carro e avisei a meus pais que ficaríamos no meu quarto. Os olhos da minha mãe brilharam com cumplicidade. Meu pai arregalou os olhos mais depois me deu um sorriso tímido. Miguel respirou fundo ao ver que a reação deles foi a melhor possível.

Nosso final de semana foi incrível. Exceto pela conversa que tive com meus pais sobre a Edna. Eles compreenderam o que aconteceu e resolvemos que ela não faria mais parte de nossas vidas. Conversei com meus pais também sobre minha relação com Miguel. Minha mãe até chorou e meu pai ficou comovido com a paciência de Miguel. Por fim papai o abraçou e disse que já o tinha como um filho por ele demonstrar tanto amor por mim.

Após o almoço papai nos levou pra um passeio na lancha de um amigo dele. Passamos por praias lindas. Mamãe tirou fotos de tudo principalmente de nós. Levamos uma cesta de piquenique e atracamos em uma prainha pouco movimentada de águas calmas. Meu pai falou que era a praia dos namorados. Fizemos um lanche maravilhoso, nos banhamos no mar calmo e acolhedor e, ao entardecer voltamos para casa.

No domingo foi nossa vez de levar meus pais pra passear. Os levamos a um aquário que acabara de ser inaugurado e depois pra almoçar em um restaurante à beira mar. Pra finalizar fizemos um passeio de charrete pela orla. Nunca vi meus pais tão felizes e se divertindo tanto. Deve ser verdade o que dizem, que "a felicidade dos filhos se reflete nos pais", pois meus pais não conseguiam ser felizes me vendo sempre triste.

Viemos embora à tardinha e deixamos meus pais com a promessa de não demorarmos tanto pra voltar. Já era noite quando chegamos, jantamos um bolo de carne feito por minha mãe que estava simplesmente delicioso. Após me ajudar com a cozinha Miguel resolveu ir dormir em casa por causa do material da escola que precisava organizar. Combinamos que eu iria pra o trabalho de carro a partir de agora, já que não tinha mais companhia, e que a noite ele viria do trabalho direto para cá. Quando ele saiu não pude evitar o vazio que se instalou em meu peito. Queria Miguel ao meu lado o tempo todo.

Sai para o trabalho um pouco mais tarde. Não queria correr o risco de ver Edna no ponto de ônibus e não precisava mais sair tão cedo porque com o carro seria mais rápido. Cheguei na empresa dez minutos antes do habitual. Todos me olharam com ar de pena por onde passava. Até que meu chefe o Dr. Plinio veio ao meu encontro e me perguntou como eu estava. Falei pra ele que estava muito bem e que não estava entendendo nada. Ele me olhou confuso e começou a falar, foi aí que compreendi tudo.

- A Edna pediu demissão hoje cedo. Falou que a mãe dela está com câncer e que precisa cuidar da mãe. Disse ainda que você estava arrasada e que passou o fim de semana a ajudando na casa dos pais. Pensei até em lhe dá uma folga já que passou o fim de semana trabalhando.

- Então foi essa a mentira que ela contou? Dr. Plinio não foi nada disso que aconteceu. A mãe da Edna tem mais saúde do que nós dois juntos. A verdade é que ela... – Contei pra ele toda a história e ele ficou um tanto chateado com isso.

- Obrigada por me contar a verdade Antônia. Não gosto de ser enganado e menos ainda com uma mentira tão sórdida.

- Desculpa Dr. Plinio por contar uma coisa assim. Eu só não queria que o senhor e o pessoal fizessem papel de palhaços como eu fiz.

Deixei meu chefe absorvendo tudo e fui pra minha sala. Mentiria se dissesse que não estava aliviada. Sai de casa disposta a pedir demissão. Não suportaria olhar pra cara dela todos os dias. Apesar de amar meu emprego e de ter batalhado bastante pra chegar aonde cheguei, eu sairia pra manter minha paz de espirito. Iniciei meu trabalho com o mesmo fulgor de todos os dias. Sempre dei meu melhor na minha profissão. Amo o que faço. Fazer a contabilidade de uma empresa e vê-la prosperar é o que me realiza. Lido com vários tipos de investimentos e cada vez que um deles cresce e alcança altos patamares eu também subo profissionalmente. Sinto-me poderosa quando consigo alavancar uma empresa que vivia de migalhas e lucros limitados. Além disso, ganho muito bem pra fazer o que faço. Tenho uma vida confortável e posso ajudar meus pais com conforto e lazer que eles merecem.

Meus pais lutaram muito pra me vê onde estou agora. Meu pai trabalhou por trinta e cinco anos no serviço público. Era auxiliar de tributação da prefeitura da cidade onde morávamos. Minha mãe é costureira aposentada. Hoje em dia faz apenas pequenos trabalhos. Os dois deram tudo de si pra que eu estudasse nos melhores colégios e tivesse a formação que tenho hoje. Devo tudo a eles. Quando se aposentaram os incentivei a mudar pra praia. Eles ficariam mais perto de mim e ainda morariam em um pequeno paraíso. Dediquei meus dois primeiros anos de trabalho à compra da casa deles e espero poder dar-lhes sempre o melhor.

No inicio, os dias sem minha ex melhor amiga foram estranhos. Depois fui esquecendo aos poucos o que ela representou e dando lugar ao desprezo que hoje sinto por ela. Trabalhamos até a quinta feira, pois a sexta seria feriado. Sai do trabalho animada por passar o feriado com Miguel, porém, também senti um frio na barriga por pensar na reação dos pais dele ao meu respeito. Sempre tive uns estalos estranhos de pensamento quando algo iria acontecer. Não sei explicar se é sexto sentido, ou o que quer que seja, só sei que no momento estou tendo um desses pressentimentos. Devo confessar que não é coisa boa.

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