8. O fim do amor de Júlia

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Júlia estava deitada na cama do namorado enquanto o esperava trazer os petiscos, eles iriam assistir a um filme antes de irem para a festa de Judh, uma garota da escola.

O noticiário estava passando na TV. Um grupo de jovens se reuniu ao redor de uma árvore para que não fosse demolida e estavam lá há seis horas. Júlia sorriu, Ailuj faria esse tipo de coisa.

— Um bando de desocupados — Renan falou colocando os pratos na cama.

— O quê? — ela perguntou sem entender.

— "Vamos proteger a mãe natureza" — imitou-os, debochadamente. — Ah, por favor! É só uma árvore.

— Só uma árvore? É uma vida como a sua.

Renan riu.

Júlia não.

— Falando assim você até parece aqueles hippies vagabundos que não tomam banho.

Júlia iria respondê-lo, iria defender as coisas que Ailuj acreditava, mas decidiu se calar. Estava magoada.

"hippies vagabundos?" é assim que ele iria me ver se eu fizesse o que tenho vontade de fazer?

— Os hippies vagabundos lutam pelo o que acreditam — ela disse depois de quase meia hora, enquanto assistiam ao filme.

— Você ficou mesmo brava por isso?

— Sim — respondeu sem olhá-lo.

— Por quê? Você não tem nada a ver com eles.

— Você não me conhece!

Não conhecia mesmo.

— Então me deixa conhecer, poxa! — falou pausando o filme.

— Não!

Você me odiaria se eu te permitisse me conhecer, você me chamaria de hippie vagabunda e diria que meus sonhos e planos são ridículos. Você zombaria das coisas que eu acredito. Você nem mesmo gostaria mais de mim porque a pessoa que você ama não sou eu.

A pessoa que você ama não sou eu.

— Por quê? Você não confia em mim? Sou seu namorado e sinto que não te conheço.

— Está bem — ela falou levantando. — Eu sou uma garota, vivendo a vida de outra garota, fazendo coisas que odeio, mas que de algum jeito a vida me faz fazer sempre, me faz agir de um jeito frio que não é o meu jeito. Me faz ser quem sou, mas essa não sou eu, entende?

Foi a primeira vez que ela falou disso pra alguém, foi a primeira vez que ela conseguiu dizer como se sentia de verdade.

— Ah, claro. E eu sou a indiana Jones! Dá pra parar de fazer piada com isso? Eu realmente sinto que não te conheço como deveria e isso me magoa.

E ele simplesmente achou que fosse uma piada...

— Você está magoado? — perguntou ofendida. — Sinto muito por isso, Indiana Jones!

Pegou sua bolsa e saiu, batendo a porta com força.

Ela pareceu alguém fria ao fazer isso, ignorando todo o receio e mágoa do namorado por sentir que não a conhecia bem.

Mas na verdade, ela era a maior magoada ali.

Renan estava triste porque, quanto mais tempo ele passava com Júlia, menos a conhecia.

E ele não tinha culpa disso, ela tampouco.

Na verdade, ele estava tão dentro da vida dela, conhecia ela tão bem, que conseguiu enxergar toda a profundidade dela, vendo que não conhecia mesmo nada. Ele entendeu que ela era bem mais que aquela Júlia, o problema é que ele não conseguia conhecê-la.

E eu vos digo o porquê disso:

Renan estava nos planos de Júlia, ele realmente foi planejado para ser o amor da vida dela.

Mas, infelizmente, ele não estava nos planos de Ailuj.

Na verdade Renan nem mesmo gostava do tipo de pessoa que ela era.

Ele diz que as coisas que acredito são bobas, mas nós somos o que acreditamos. Logo, eu sou boba pra ele também.

Sabem o maior problema disso tudo?

Ailuj amava Renan, ela era apaixonada por quem era apaixonado por Júlia, uma versão ireal dela. A versão grossa, insegura, pessimista, cética e introvertida dela.

É uma sensação louca. Amar alguém que ama a pessoa que pensa que você é.

Júlia desligou o celular para não ter de escutar a voz dele caso ele ligasse, pegou um ônibus de volta para casa e tentou não chorar quando chegou.

Mas era fato, era assustador e Júlia estava com medo do que estava por vir:

Ailuj estava se libertando.

Aleatoriamente, JúliaOnde histórias criam vida. Descubra agora