Capítulo 4. Alérgico a escola

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   - Quando eu tinha a sua idade... - meu pai disse na hora do café da manhã no dia seguinte. - Eu também tinha medo da escola. Pior, eu nunca fui um super-herói antes de ir para a escola, por isso era muito ruim.

   Meu pai não é um super-herói, mas já leu praticamente tudo que foi escrito sobre super-heróis e, assim, sabe sobre nós do começo ao fim, o que explica muito sobre ele.

   - Matenha a cabeça erguida - meu pai disse - e seja um cavalheiro.
   - Mas estou me sentindo mal - eu disse.
   Meu pai colocou a mão na minha testa.
   - Não está com febre.
   - Tem certeza? - Olhei para as mãos dele. Elas são grandes como luvas de beisebol. Era de se estranhar que ele conseguisse sentir qualquer coisa com elas.

   - Onde sente dor? - ele perguntou.
   - No corpo inteiro - respondi. Era verdade; não estava inventando. Eu devia ter crescido pelo menos cinco centímetros por me esticar por tanto tempo na árvore. E crescer dói, é o que todos dizem.
   Eu gemi.

   - Hummm - ele disse.
   Gemi mais um pouco.
   - Você não está doente - meu pai disse.
   - Mas vou ficar. Vou ficar muito, muito doente. Sou alérgico a escola, gravemente alérgico.

   Meu pai olhou para mim.
   - Alvin - ele disse de modo firme, colocando uma das suas mãos de luvas de beisebol no meu ombro.
   - Sim, papai.
   - Você vai ficar bem, filho - ele disse. Adoro quando ele me chama de filho.

   Eu me senti um pouco melhor. Talvez meu pai estivesse certo, talvez eu ficasse bem. Um palavra de consolo do meu pai muda tudo. Além disso, se eu perdesse o ônibus, meu pai poderia me dizer mais algumas palavras, mas não tão legais. Ele ficaria bravo. Então, sai correndo de casa e alcancei Calvin bem na hora em que o ônibus apareceu na nossa rua.

   - Tchau, Alvin! - Anibelly exclamou. - Tchau, Calvin!
   - Tchau, Anibelly! - acenamos e subimos.
   O ônibus rodou e rodou.
   Foi tudo bem.

   Segurei meu KDP e me sentei ao lado de Calvin na parte de trás do ônibus, onde todos os alunos do quinto ano se sentam. As crianças não paravam de gritar. Eu não parava de gritar. Todo mundo pulava.

   "Você vai ficar bem, filho", a voz do meu pai ecoava na minha cabeça.
   Eu sorri para o Calvin. E Calvin retribuiu sorrindo.
   Eu estava bem.
   E então chegamos à escola.
   Meus pés pousaram como dois blocos de cimento quando desci do ônibus. Pum. Pum.
   Meu estômago revirou como uma máquina de lavar roupas quando entrei.

   Encontrei a porta na qual estava escrito "Terceiro ano, Srta. Pestalozzi".
   Senti um nó na garganta.
   - Seja bem-vindo - disse uma moça. - Sou a Srta. P.
   Eu parei de repente. O cabelo dela era brilhante e a pele, branca. Ela tinha cheiro de roupa limpa que acabou de sair da secadora. Sorriu para mim.

   Mas eu não sorri. Mal olhei para ela. Apertei meu KDP.
E senti tontura.
   Olhei ao redor. A sala era clara e organizada. As paredes eram brancas, mas havia ali um quadro de Henry David Thoreau e outro quadro de uma casinha. Era uma cópia da casinha que Henry havia construído no Walden Pond, com as próprias mãos.

   - Henry David Thoreau é meu herói - Esha disse à sua amiga Flea. - Sabe, ele escrevia um diário bem legal. Minha irmã disse que vamos ler parte dele no terceiro ano.
   Todos passaram por mim. Eli empurrou Scooter e Scooter devolveu o empurrão.

   - Você! - Scooter gritou, empurrando Eli, que caiu para trás, em cima de Jules, que estava curvado para que Sam pulasse sela. E então Hobson e Nhia engatinharam pela sala como dois caranguejos brigando. Eles eram ótimos!

   Tudo girou ao meu redor. Eu estava no meio, mas não participava de nada.
   Até aquele momento, o terceiro ano não era muito diferente do segundo, que não era muito diferente do jardim de infância.
   Eu estava pensando em correr e me esconder quando...
   - Quer sentar do meu lado? - Era a Pulga. Ela tinha sido minha colega de mesa no segundo ano. É uma menina.

   Eu quis dizer não, de jeito nenhum. Ninguém quer ter uma menina como colega de mesa, a não ser outra menina, talvez. O que assusta numa menina é que ela não é um menino. A maioria das meninas não é boa em traquinagens. Não sabem dar socos. Mas sabem machucar, e dói. Pulam corda com rapidez. São chatas. Abri minha boca para dizer tudo isso, mas...

   Minha língua travou.
   Não saiu nada.
   - Vamos - Pulga disse, empurrando a cadeira ao lado dela. - Você pode se sentar comigo e com a Esha.
   Todo mundo estava escolhendo sua cadeira e sentando. Logo seria tarde demais para eu me sentar com os meninos.

   Abri a boca, tentando escutar minha voz. Tentei, tentei e tentei. Mas nada saiu.
   Por fim, me sentei.
   Eu não estava bem.
   Eu era muito alérgico a escola, mas ainda mais a meninas.

Alvin Ho Onde histórias criam vida. Descubra agora