Acordei com batidas insistentes na porta e o caderno sobre o meu peito.
-Acorda!!! A gente tá super atrasado! E eu não posso chegar atrasada na minha primeira semana!!
Levantei num pulo e o caderno voou. Espera, aquela era a Isabella dentro da minha casa? E pior, me apressando? Abri a porta e dei de cara com aqueles olhos brilhantes e lábios vermelhos vibrantes, dei um passo para trás, ela deu um pra frente mantendo a mesma distância entre nossos rostos. Ela parecia não notar que o ar entre nós tinha ficado mais denso e eu estava tendo uma dificuldade imensa de respirar, e então ela se afastou, de repente, me deixando atordoado e levemente irritado, admiti.
-Anda Felipe, o que você tá esperando? A gente tá atrasado poxa!
-Merda, não acredito! Eu nunca me atraso- respondi irritado
- Pra tudo tem uma primeira vez né- disse ela sorrindo enquanto observava o meu quarto, seus olhos iam desde a minha janela fechada até o meu guarda roupa bagunçado e finalmente parando sobre o meu caderno que havia caído aberto sobre a cama.
Notei a curiosidade nos olhos dela quando estes recaíram sobre o caderno, suas mãos se ergueram e u notei a sua intenção. Larguei a camisa que estava vestindo e cheguei ao caderno antes dela, fechei e enfiei numa gaveta:
- Não mexe nas minhas coisas, aliás, o que você está fazendo aqui?- perguntei enquanto tentava colocar a camisa e ia em direção ao banheiro.
-A gente tá atrasado, e eu vim te acordar oras. Eu fiquei te esperando lá fora um tempão e finalmente alguém abriu a porta, mas não era você, infelizmente. Seu pai me disse pra entrar e te acordar porque alguém tinha que fazer isso eventualmente, e ele não estava a fim de ver sua cara feia e mal humorada, então eu me voluntariei por que eu não posso chegar atrasada logo na minha primeira semana, mas pelo jeito a gente vai chegar atrasado mesmo e eu vou levar uma bronca, pior, vou ser demitida e então já era, era uma vez recomeço, era uma vez nova vida, era uma vez tudo!- concluiu ela sentando na cama e me parecendo genuinamente triste. Meu coração sofreu um aperto.
- Hei, relaxa, vai dar tempo, não é a primeira vez que eu perco a hora- respondi ainda com a boca cheia de pasta de dente, enxaguei a boca e sequei o rosto- Vem, vamos logo, ainda tenho que tirar a moto da garagem. Peguei na mão dela e a puxei pra fora do quarto, meus dedos se aqueceram instantaneamente e um calor gostoso invadiu meu corpo quando a toquei, mas eu não estava acostumado àquilo, me assustei quando quando aquela sensação foi subindo pelo meu braço em direção ao meu peito, então eu soltei a mão dela, a larguei de repente e de forma abrupta.
Ao sentir o seu calor eu me dei conta do quanto eu era frio, do quanto as minhas mãos eram geladas e isso me assustou, eu não havia percebido o quanto eu havia mudado desde aquele dia, desde que eu havia sentido o último toque "dela". Mas as mãos de Isabella haviam me acordado, e isso me assustou.
-Hei, eu não mordo sabia- retrucou Isabella, quando a soltei de forma abrupta.
-Pode pegar a jaqueta e fechar a porta pra mim enquanto eu busco a moto? - perguntei e saí porta afora para evitar olhar nos olhos dela. Peguei a moto e fui em direção a ela na rua. Isabella me estendeu a jaqueta e o capacete, ainda com uma tristeza nos olhos, notei;
-Você esqueceu do seu capacete- ela lembrou. Eu o coloquei na cabeça, vesti a jaqueta e subi na moto não sem antes notar que ela usava só uma blusa, sem casaco, sem jaqueta.
-Cadê sua jaqueta?-perguntei.
-Precisa? Mas não tá frio, olha o solzão que tá saindo.
-Espera até subir na moto pra você ver- tirei minha jaqueta e dei à ela.
- Não precisa- ela retrucou.
- Vai por mim, precisa sim- respondi com um meio sorriso.
Ela pensou por um segundo mas pegou a jaqueta e a vestiu, subiu na moto e passou seus braços ao meu redor.
Seu calor me atingiu como uma onda, eu vi a sua chegada, sabia o que estava por vir, mas quando chegou eu senti o choque, me atingiu em cheio, e por mais que eu estivesse preparado, esperando por aquela sensação, aquilo me surpreendeu. Quando suas mãos se fecharam em torno da minha cintura e meu corpo estremeceu eu torci para que ela não tivesse percebido a forma que eu reagia a sua aproximação.
Porque eu não queria aquilo, eu não desejava outra pessoa, meu coração estava de luto há muito tempo e eu tinha aceitado essa situação, eu tinha abraçado a minha tristeza e acreditado piamente que ninguém, jamais, iria ser capaz de aquecer meu coração gelado e dar cor à minha vida desde que "ela" havia me deixado.
Por isso tentei focar no caminho à minha frente, escolhi focar no vento no meu rosto e esquecer seus braços ao meu redor, preferi sentir o frio nos meu braços à sensação dela encostada nas minhas costas.
A viagem que pareceu uma eternidade enfim acabou, chegamos à biblioteca faltando apenas quinze minutos para abri-la, corremos para a entrada e murmurei umas desculpas aos Sr. Antonio e não esperei pra ver se ele realmente tinha desculpado. Olhei pra trás e vi Isabella abrindo um enorme sorriso ao chefe, seus lábio vermelhos se abriram e fez uma curva linda, duas covinhas se formaram no seu rosto. Percebi que estava encarando quando o sorriso se desfez e ela veio em minha direção toda saltitante;
- O Sr. Antonio não está bravo comigo- sussurrou ela quando passou por mim- mas está com você!
Caramba! Era só o que me faltava, tudo o que eu precisava agora era um chefe bravo que provavelmente ia ficar pegando no meu pé o dia todo e lábios vermelhos pra me distrair.
-Mexa-se Felipe! Ou além de chegar atrasado vai ficar aí parado o dia todo?!- bradou ele enquanto se dirigia a sua sala.
Fui em direção ao balcão e procurei Isabella para dar as instruções mas percebi que não precisava, ela já estava colocando os livros no carrinho e ajeitando as mesas e devolvendo o que podia nas prateleiras, pelo menos eu não iria precisar ficar gritando ordens à ela o dia todo e principalmente, iria conseguir manter uma certa distância.
O dia correu rápido, empréstimos foram feitos e devoluções foram realizadas e eu manti a distância, o sentimento era irracional, eu sabia, mas preferi não pensar no assunto.
Fechei a biblioteca e me deparei com Isabella me esperando no estacionamento, ao lado da moto, estendi a jaqueta e ela a vestiu sem questionar, subimos na moto, liguei, andamos cinquenta metros e a moto engasgou.
-O que foi isso? O que aconteceu?-perguntou ela.
-A gasolina acabou, devia abastecer hoje cedo, mas esqueci...o atraso, você sabe.
-E o que a gente faz?
-A gente anda...- respondi desanimado.
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Sobrevivente
RomanceO que fazer quando o grande amor da sua vida te deixa? Como superar a dor e esquecer aquela pessoa que esteve com você uma vida inteira se vai sem explicações. O protagonista dessa história vai ter que aprender da forma mais difícil a superar essa d...